Relâmpago: Assine Digital Completo por 1,99

Um alerta sobre a necessidade de buscar novos tratamentos para verminoses

Especialistas explicam que enfermidades tiveram poucos avanços quando se trata de ultrapassar os estudos in vitro para os ensaios pré-clínicos e clínicos

Por André Julião, da Agência Fapesp
Atualizado em 4 jun 2024, 11h31 - Publicado em 1 jul 2022, 11h54

Avanços na biologia e na química medicinal, juntamente com maiores investimentos em pesquisa, fizeram com que algumas das principais doenças tropicais negligenciadas ganhassem candidatos promissores a novos tratamentos nos últimos anos. No entanto, as verminoses, que dentre essas enfermidades afetam mais pessoas no mundo em números absolutos, tiveram poucos avanços quando se trata de passar dos estudos in vitro para os ensaios pré-clínicos e clínicos.

Essa é uma das conclusões de um estudo publicado na revista Drug Discovery Today por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Guarulhos.

“Mais de um bilhão de pessoas no mundo são afetadas por verminoses, mas essas são as moléstias menos assistidas, mesmo entre as chamadas doenças negligenciadas. Apenas a esquistossomose tem 250 milhões de pessoas infectadas e conta com apenas um medicamento, enquanto as outras recebem mais recursos para buscar opções de tratamento”, conta Josué de Moraes, pesquisador apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) que coordena o Núcleo de Pesquisa em Doenças Negligenciadas (NPDN) da Universidade Guarulhos, um dos autores do artigo.

Em 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou um plano de ação para erradicar ou controlar, até 2030, 20 doenças que afetam uma em cada cinco pessoas no mundo e matam cerca de 500 mil por ano, a imensa maioria pobre.

Entre as metas está o desenvolvimento de novos medicamentos, uma vez que essas moléstias são caracterizadas pela falta de tratamentos eficazes e vacinas.

No estudo, os pesquisadores relatam que, apesar da histórica falta de inovação em fármacos para essas doenças, parcerias entre entidades públicas, privadas e iniciativas sem fins lucrativos têm financiado e acelerado a descoberta de possíveis novos medicamentos, usando estratégias modernas de química medicinal.

Continua após a publicidade

“As estratégias para desenvolvimento de fármacos passaram por profundas modificações nos últimos anos. No passado, fazia-se uma triagem aleatória, testando compostos em agentes infecciosos por tentativa e erro. Com o avanço da química medicinal e de ferramentas experimentais e computacionais, hoje é possível fazer uma triagem mais racional antes de realizar os ensaios na bancada”, explica outro autor do estudo, Adriano Andricopulo, professor do Instituto de Física de São Carlos (IFSC-USP) e pesquisador do Centro de Inovação em Biodiversidade e Fármacos (CIBFar). O CIBFar é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) apoiados pela Fapesp.

Doenças silenciosas

Os pesquisadores observam que grandes avanços têm sido alcançados em possíveis novos tratamentos para leishmaniose, doença de Chagas e tripanossomíase humana africana (HAT), também conhecida como doença do sono. No entanto, o mesmo não ocorre com verminoses como a esquistossomose.

Atualmente, vários compostos estão em testes clínicos para a leishmaniose. Os estudos sobre a doença de Chagas, em contraste, enfrentam dificuldades para progredir da fase de descoberta de potenciais drogas para o estágio pré-clínico.

A complexa biologia do parasita causador da doença, o Trypanosoma cruzi, e sua interação com diferentes tecidos humanos continuam sendo grandes desafios para os cientistas.

Continua após a publicidade

“A maior parte das doenças parasitárias é crônica, silenciosa. No caso de Chagas, quando o indivíduo recebe o diagnóstico é porque normalmente já está com insuficiência cardíaca, com o parasita instalado no tecido do coração. O desafio é fazer um medicamento chegar ao T. cruzi sem prejudicar o paciente”, explica Moraes.

Os autores acrescentam, porém, que estudos recentes revelaram novos alvos moleculares e vias de sinalização do parasita que podem contribuir para a descoberta de novos tratamentos.

No caso da HAT, causada pelo Trypanosoma brucei, a aprovação em 2021 para o uso do medicamento fexinidazol representa um grande avanço, por ser o primeiro tratamento por via oral para a doença.

Por sua vez, as doenças causadas por vermes, como os do gênero Schistosoma, estão ainda um passo atrás e nem sequer possuem compostos em fases avançadas de descoberta.

Continua após a publicidade

O reposicionamento de fármacos é considerado promissor para as verminoses, como é o caso da miltefosina, conhecida desde os anos 1980 para o tratamento de câncer e atualmente usada contra a leishmaniose.

Recentemente, o grupo liderado por Moraes descreveu como um anti-inflamatório reduziu em mais de 80% a carga parasitária em camundongos infectados com o Schistosoma mansoni.

Além disso, pesquisas sobre aspectos básicos da biologia do verme progrediram e revelaram novos alvos moleculares. São promissores, ainda, os estudos com um composto que age tanto contra os parasitas adultos quanto jovens.

Ainda assim, os autores consideram esses esforços insuficientes, dada a alta prevalência das verminoses no mundo. Por isso, programas multidisciplinares e colaborativos de descoberta de fármacos devem ser reforçados para essas doenças.

Continua após a publicidade

“Uma das dificuldades de estudar as verminoses é cultivar os parasitas em laboratório. Enquanto tripanossomas e plasmódios [como o causador da malária] podem ser mantidos com mais facilidade, para os vermes é necessário ter roedores e caramujos, representando os hospedeiros definitivo e intermediário. Consequentemente, os estudos avançam muito mais para outros parasitas”, diz Moraes.

Por conta de dificuldades como essa, o pesquisador ressalta que erradicar essas moléstias demanda, além do desenvolvimento de medicamentos, outras medidas de saúde pública, como diagnóstico, controle dos vetores de transmissão e saneamento básico universal. “As medidas devem ser múltiplas, não se consegue acabar com essas doenças apenas com o uso de medicamentos”, afirma.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

ECONOMIZE ATÉ 88% OFF

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 1,99/mês

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 9)
A partir de 35,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
Pagamento único anual de R$23,88, equivalente a R$ 1,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.