Ozempic ou Mounjaro? O que diz o primeiro estudo que compara os dois remédios
Pesquisa recém-divulgada confrontou as duas medicações de última geração: tirzepatida e semaglutida
A luta para controlar a obesidade é de pesos-pesados. No ringue dos avanços mais notáveis na área nos últimos anos, estão as duas farmacêuticas com o maior valor de mercado hoje. De um lado, a americana Eli Lilly, com seu medicamento tirzepatida, conhecido comercialmente como Mounjaro. Do outro, a dinamarquesa Novo Nordisk, dona da semaglutida, princípio ativo do Wegovy e de seu primo mais famoso, o Ozempic, que é destinado ao diabetes. Torcida, ou melhor, demanda para esses fármacos não falta: hoje o excesso de gordura corporal afeta mais de 1 bilhão de pessoas no mundo. Mas quem será que leva a melhor na batalha pela perda de peso? Foi a isso que uma pesquisa recém-divulgada buscou responder, confrontando as duas medicações de última geração.
No duelo, a tirzepatida levantou o cinturão de emagrecimento. Enquanto ela promoveu uma redução, em média, de 20% do peso corporal, a rival chegou a quase 14% — ambos números expressivos, diga-se. O estudo controlado, financiado pela Eli Lilly, recrutou 751 pessoas com obesidade residentes nos Estados Unidos e em Porto Rico. Elas foram divididas aleatoriamente para receber os tratamentos e acompanhadas ao longo de um ano e meio. Os participantes do braço do Mounjaro perderam por volta de 22 quilos; os do Wegovy enxugaram 15 quilos no período. Feitas as contas, os autores do comparativo constataram que a diminuição de peso relativa foi 47% maior com a tirzepatida, que, no Brasil, ainda não recebeu aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para tratar a obesidade em si, tampouco está disponível nas drogarias para a indicação para a qual ganhou aval, o diabetes tipo 2 — a expectativa é de que ela chegue em 2025.
Os dois remédios, administrados com uma caneta de aplicação semanal, foram saudados pelos especialistas como um divisor de águas no tratamento da obesidade, superando outros princípios ativos existentes no mercado. A semaglutida, pioneira, imita um hormônio naturalmente produzido pelo intestino, o GLP-1, mas que dura muito mais tempo que a versão original, potencializando a saciedade e o controle da glicose no sangue. Já a tirzepatida emula tanto o GLP-1 quanto outro hormônio presente nessa orquestra, o GIP. Ambas foram testadas e validadas numa série de testes clínicos nos quesitos segurança e eficácia. No entanto, o preço das terapias é alto, considerando a renda do brasileiro, e elas não são fornecidas pelo SUS. E, apesar dos achados empolgantes dos estudos, tais injeções não representam uma cura definitiva para a obesidade: trata-se de uma doença crônica que depende de um tratamento constante. “Esse é o desafio na vida real, inclusive para essas medicações: manter a adesão no longo prazo”, afirma o endocrinologista Carlos Eduardo Barra Couri, da USP de Ribeirão Preto.
Enquanto a Eli Lilly celebra o pódio no duelo, a Novo Nordisk pondera, em nota, que aguarda o conjunto completo dos dados assim que o trabalho for revisado por pares ou publicado — um rito de rigor científico. “Os estudos com as novas medicações são importantes porque nos ajudam a ter mais previsibilidade da resposta ao tratamento”, diz o médico Paulo Miranda, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Isso permite personalizar e aprimorar a indicação com base nas particularidades de cada uma das drogas e dos próprios pacientes. “Não há ganhador ou perdedor. Na verdade, são duas opções que vieram enriquecer o arsenal terapêutico, somando-se às necessárias mudanças no estilo de vida”, afirma Couri.
Até porque a história não se encerra por aqui. Há investigações em curso mensurando não só o potencial e as limitações dos medicamentos no contexto do excesso de peso como também experimentos testando até que ponto eles são proveitosos para o controle de problemas cardíacos, doenças renais, gordura no fígado e até Alzheimer. Fora isso, as farmacêuticas que ostentam Wegovy e Mounjaro no portfólio dispõem de novas moléculas sob escrutínio com poder de fogo ainda maior diante da obesidade, prometendo perdas de peso similares às da cirurgia bariátrica. No fim dessa disputa, o maior vencedor à vista é o paciente.
Publicado em VEJA de 13 de dezembro de 2024, edição nº 2923