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O alerta da febre amarela

Para frear o avanço da doença, governo decidiu fracionar vacina para atender mais pessoas — a medida é efetiva em situações de emergência, mas controversa

Por Thaís Botelho Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 17h41 - Publicado em 12 jan 2018, 06h00

O Brasil levou um susto nas últimas semanas: quatro mortes por infecção de febre amarela foram confirmadas na Grande São Paulo no início de 2018. Depois do surto de 2017 — 2 300 casos em diversos estados e 300 mortes pela doença num período de oito meses —, o vírus voltou aos holofotes. Ele é transmitido por mosquitos infectados dos gêneros Haemagogus e Sabethes, circulantes em regiões silvestres (ou seja, de mata — a forma urbana da doença está erradicada desde 1942). A Organização Mundial da Saúde recomenda, a fim de evitar epidemia, que pelo menos 90% da população de áreas consideradas de risco seja vacinada — aí incluídas regiões contíguas a terrenos silvícolas.

Na manhã da terça-feira 9, Ricardo Barros, ministro da Saúde, anunciou uma nova decisão para “garantir cobertura rápida e em curto período de tempo”: ampliar a vacinação fracionando o estoque de dose-­padrão. Uma única dose será utilizada em cinco pessoas. Ainda que a medida seja efetiva em situações de emergência, de acordo com especialistas, é controversa. Vai demandar a aplicação de uma dose de reforço, pois a vacina fracionada garante imunidade por apenas oito anos, segundo estudo realizado pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, da Fiocruz (RJ), o maior produtor de vacinas contra a doença no mundo. A dose integral vale por toda a vida.

Apelar emergencialmente para a divisão das doses foi recurso utilizado recentemente no Congo. “Há pouca transparência, e a verdade é que o país precisa de muito investimento para aumentar a produção de vacina e a capacitação de profissionais para o diagnóstico precoce da doença”, diz Artur Timerman, infectologista e presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses. Há, de fato, escassez de vacina. Neste ano, o Bio-M­anguinhos produzirá 48 milhões de unidades — muito pouco quando se sabe que apenas o Estado de São Paulo tem 45 milhões de habitantes. “Além de demandar tempo, o custo é alto”, diz Akira Homma, consultor científico sênior do Bio-Manguinhos. Um lote com 200 000 unidades leva cerca de sessenta dias para ser finalizado. Faltará vacina, afinal? “O Brasil já está abastecido para tratar das áreas de maior risco”, afirma Homma. “A vacina fracionada é destinada a cidades ainda não alcançadas pelo vírus. É exagerado achar que não teremos vacina suficiente.”

Em 2017, o Brasil recebeu da OMS um socorro de 3,5 milhões de doses de um estoque global de emergência de 6 milhões. Chegou ainda um lote de 1 milhão de unidades do Fundo Rotatório da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Para 2018, ainda não houve solicitação extraordinária. Estima-se que o número real de casos da doença deva ser pelo menos dez vezes maior que o reportado. A subnotificação se dá porque, em muitas situações, os sintomas inexistem ou começam demasiadamente brandos. A solução soa óbvia: imunização e diagnóstico cada vez mais precoces. Mas há dois obstáculos limitantes: a própria vacina, contraindicada a gestantes, transplantados, portadores de doenças imunossupressoras e alérgicos graves, e, insista-se, a escassez dela. A esperança ronda os corredores e os laboratórios da Fiocruz de Pernambuco. Ali, os pesquisadores desenvolveram uma nova vacina contra a doença, baseada no DNA do vírus, já testada em camundongos, e os resultados alcançaram 100% de proteção — e com a possibilidade de ela ser ofertada a grupos com maior risco de sofrer efeitos colaterais. Há uma explicação: pelo fato de a vacina não ter o vírus vivo, a probabilidade de ocorrer qualquer reação adversa é nula. O problema são os altos custos de teste e produção. Por isso, até o momento a vacina não foi avaliada em humanos.

A curto prazo, não há outros caminhos viáveis e mais velozes de controle. A febre amarela — assim como a dengue, a zika e a chikungunya, as chamadas arboviroses (transmitidas por mosquitos) — é filha da pobreza e da expansão urbana desenfreada, males do nosso tempo. É preocupante, mas não precisa ser apavorante. A campanha de saúde pública ancorada nas vacinas fracionadas deve atender 15 milhões de pessoas nos estados de São Paulo (de 3 a 24 de fevereiro), Rio de Janeiro e Bahia (nestes dois, de 19 de fevereiro a 9 de março). Outros 4,7 milhões de pessoas receberão a dose­-padrão. As duas modalidades de vacina serão aplicadas em 53 municípios de São Paulo. No Rio, serão quinze. Na Bahia, oito.

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As dúvidas mais frequentes

1) O macaco pode transmitir febre amarela? Não. A doença é causada por um vírus transmitido em regiões silvestres pelos mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes infectados. Não há casos de febre amarela urbana no Brasil desde 1942.

2) Quem precisa tomar a vacina? O Ministério da Saúde recomenda a vacinação em crianças a partir de 9 meses de idade (6 meses em áreas endêmicas) e pessoas que moram próximo a áreas de risco. Desde o início de 2017, o Brasil segue a recomendação da OMS de uma única dose. Ou seja, adultos vacinados não precisam repeti-la. Estudos científicos demonstram que apenas uma dose é suficiente para que o organismo continue com anticorpos o resto da vida.

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3) É uma doença fatal? Se houver diagnóstico precoce, não. De 40% a 50% dos casos podem evoluir para a forma grave da doença. Nestes, em 30% a 40% a doença pode ser fatal. Os principais sintomas: dores no corpo, febre e náuseas. Em casos graves, pode haver insuficiência renal e hepatite. Mas são sintomas comuns a outras doenças — portanto, busque sempre um médico.

4) Existe transmissão entre pessoas? Não. Nem de animal para animal, tampouco de animal para humanos. A única forma de transmissão é pela picada do mosquito infectado.

Publicado em VEJA de 17 de janeiro de 2018, edição nº 2565

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