Mais de 70% dos moradores de São Paulo estão suscetíveis à dengue, aponta estudo
Pesquisa com doadores de sangue também revela que 87% da população de Curitiba sem imunidade e destaca a necessidade de vacinação em capitais vulneráveis
Um estudo conduzido pelo Instituto Todos pela Saúde (ITpS) em parceria com hemocentros de sete capitais brasileiras revelou dados preocupantes sobre a imunidade da população contra a dengue. A pesquisa, realizada entre novembro de 2023 e junho de 2024, analisou amostras de cerca de 1.600 doadores de sangue para identificar a presença de anticorpos IgG, que indicam exposição passada ao vírus. Os resultados mostram que São Paulo e Curitiba se destacam como as cidades mais vulneráveis: 72% e 87,5% da população analisada, respectivamente, não possuem imunidade contra nenhum dos quatro sorotipos da dengue.
“O fato de ambas as cidades não terem um histórico de grandes epidemias frequentes é a explicação mais plausível. A imunidade, na ausência de um imunizante – a vacina contra a dengue ainda não foi administrada em massa –, é adquirida somente pelo contato com o vírus. Fatores como o clima, com temperaturas médias menores e baixa umidade, também podem afetar a biologia do vetor e, em consequência, o espalhamento do vírus nessas cidades”, explica Vanderson Sampaio, pesquisador do ITpS.
O levantamento usou dados de São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte, Recife, Fortaleza, Manaus e Rio de Janeiro.
Neste ano, o país bateu bateu os recordes de episódios e mortes pela doença da série histórica, com dados desde o ano 2000. Em todo o ano passado, foram 1.658.816 de casos de dengue. Antes disso, a maior crise da doença tinha ocorrido em 2015, quando foram feitas 1.688.688 notificações. Em relação às mortes, o ano passado mantinha o recorde, com 1.094 óbitos, seguido por 2022, que registrou 1.053.
De acordo com o painel de monitoramento de arboviroses do Ministério da Saúde, foram notificados, em 2024, 6.606.414 de casos prováveis da doença e 5.922 mortes. Há 1.067 mortes em investigação.
Contrastes regionais e a dinâmica das epidemias
Em contrapartida, cidades como Recife e Fortaleza apresentam uma maior proporção de anticorpos na população, resultado de epidemias anteriores. Nessas localidades, entre 35% e 40% dos indivíduos analisados possuem anticorpos contra o vírus, um platô que, segundo especialistas, pode dificultar novas transmissões. Apesar disso, a imunidade registrada nessas cidades não garante proteção contra todos os sorotipos, especialmente em cenários de introdução de linhagens virais novas.
“Mesmo com a epidemia recente em São Paulo, ainda há muita gente suscetível ao vírus. Isso mostra que vacinar essa população é muito importante para evitar novos surtos“, afirma Ester Sabino, imunologista e coordenadora do estudo. “Esse tipo de pesquisa permite identificar quantas pessoas foram expostas ao vírus, mesmo aquelas que não apresentaram sintomas. Isso é fundamental para planejar o enfrentamento de futuras emergências sanitárias”, ela completa.
Vacina contra a dengue
Apesar disso, o acesso à vacina contra a dengue no Brasil ainda é limitado, com doses disponíveis apenas para públicos-alvo específicos. Embora seja uma ferramenta crucial para a redução de novos casos, sua aplicação em larga escala enfrenta desafios logísticos e de produção. Por isso, medidas preventivas, como o controle do vetor e a eliminação de focos do mosquito, permanecem como as principais estratégias para conter a doença.
Além de orientar estratégias de vacinação, os dados sorológicos são essenciais para alocar recursos, como campanhas de controle do vetor e insumos médicos, nas regiões mais vulneráveis. Segundo os pesquisadores, esses estudos devem ser realizados de forma sistemática, a cada dois anos, para monitorar a evolução da imunidade populacional.
Mobilização nacional contra a dengue
Neste sábado, 14, o Ministério da Saúde promove o Dia D de Mobilização contra a Dengue, uma ação nacional para eliminar focos do mosquito Aedes aegypti, principal transmissor da dengue, zika e chikungunya. A campanha reúne estados, municípios e a sociedade civil para reforçar a importância de medidas simples e eficazes na prevenção da doença. “Sabemos que 75% dos focos do mosquito estão perto das nossas casas. É hora de prevenir”, afirmou a ministra da Saúde, Nísia Trindade, em comunicado.
Durante a mobilização, agentes de saúde visitarão residências em todo o país, orientando a população e ajudando a eliminar possíveis criadouros do mosquito. Além disso, mutirões de limpeza e ações educativas serão realizados em várias comunidades. A iniciativa integra o Plano de Ação 2024/2025 do Ministério, que ampliou os recursos para o controle de arboviroses em 50%, totalizando R$ 1,5 bilhão.