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Estudo desvenda mecanismo biológico por trás de problema que afeta pacientes de UTI

Pesquisadores brasileiros e suecos observaram que acúmulo de zinco nos músculos estimula a expressão de proteínas que degradam o tecido

Por Julia Moióli | Agência FAPESP
10 jan 2025, 08h00

Pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e do Karolinska Institutet (KI), da Suécia, relataram pela primeira vez um novo mecanismo associado com a atrofia muscular de pacientes de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). Eles identificaram que alterações em genes relacionados ao metabolismo do zinco fazem com que o metal se acumule dentro do músculo esquelético, aumentando a expressão de proteínas ativadas de zinco que contribuem para a degradação do tecido.

Os resultados, publicados recentemente na revista científica Free Radical Biology and Medicine, abrem caminho para o desenvolvimento de novas terapias capazes de minimizar o problema que pode afetar até 70% de todas as pessoas internadas na UTI por mais de uma semana.

Nos últimos 65 anos, as taxas de sobrevivência em UTIs melhoraram significativamente, graças a avanços em tecnologia médica e à adoção de práticas baseadas em evidências. Esses tratamentos, no entanto, estão associados a complicações como a miopatia do doente crítico, caracterizada por atrofia muscular grave e perda da função dos músculos dos membros e do tronco (incluindo o diafragma, o principal músculo inspiratório). A condição, que afeta cerca de 30% dos pacientes que precisam de ventilação mecânica por longos períodos, tem consequências negativas na qualidade de vida do paciente, eleva os custos com assistência médica e aumenta a mortalidade causada por complicações secundárias, como pneumonia.

“A miopatia do doente crítico é uma complicação comum em UTIs modernas e isso se tornou aparente durante a recente pandemia de COVID-19, especialmente em pacientes idosos”, afirma Lars Larsson, diretor do grupo de pesquisa em biologia muscular básica e clínica do KI e orientador do estudo.

Em um trabalho anterior, o mesmo grupo de pesquisadores já havia observado que a perda de miosina – proteína fundamental para a função muscular, que sofre queda em pacientes que ficam imobilizados, fazendo com que o músculo perca massa, poder de contração e geração de força – estava acompanhada da ativação de um transportador de zinco chamado ZIP14 nos músculos das pernas.

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Neste estudo, apoiado pela FAPESP, os cientistas analisaram mais a fundo como os níveis de zinco e a atividade de metaloproteinases (MMPs) – enzimas que podem estar diretamente envolvidas na quebra de proteínas contráteis, como a miosina – sofriam alterações em pacientes de UTI. Eles também levaram em conta como a idade pode afetar esses processos, já que pacientes idosos apresentam maior suscetibilidade à atrofia muscular.

Para isso, acompanharam sete pacientes em estado crítico submetidos à ventilação mecânica e realizaram biópsias musculares em diversos momentos ao longo de 12 dias. Os resultados foram comparados a um modelo experimental que utilizou ratos expostos a condições semelhantes de UTI.

“Observamos um acúmulo anormal de zinco dentro do tecido muscular tanto dos pacientes quanto dos animais submetidos a um longo período de ventilação mecânica e imobilização, e esse aumento do metal gerou a ativação de certas MMPs”, explica Fernando Ribeiro, pesquisador do ICB-USP e primeiro autor do trabalho.

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“Duas delas, em particular, apresentaram atividade aumentada: a MMP-8 e a MMP-9. Enquanto a primeira ainda não tem, até então, função muscular descrita na literatura científica, já se sabia que a segunda contribuía para a degradação de miosina – porém, não no contexto de UTI, como demonstramos, mas no de insuficiência cardíaca.”

“Isso é de especial interesse, pois uma perda preferencial de miosina é a marca registrada da miopatia do doente crítico”, completa Larsson. “Assim, os resultados desse estudo apontam para um novo mecanismo subjacente à miosina em pacientes de UTI com miopatia do doente crítico.”

Importância e aplicação futura

“É comum que os pacientes com miopatia do doente crítico enfrentem complicações funcionais pós-internação decorrentes da fraqueza muscular e da falta de massa muscular, que comprometem atividades do dia a dia, como caminhar ou carregar sacolas de supermercado, demandando reabilitação física”, diz Ribeiro. “Entender os mecanismos por trás do problema é fundamental para o desenvolvimento de tratamentos capazes não só de retirá-los da dependência de máquinas como também para garantir uma melhor recuperação.”

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De acordo com o pesquisador, o objetivo agora é conduzir mais estudos utilizando ferramentas farmacológicas ou genéticas para buscar modular a expressão ou a atividade desses marcadores moleculares específicos e, assim, atenuar ou até mesmo prevenir a degradação de miosina nos músculos esqueléticos.

O estudo também contou com financiamento do Conselho Sueco de Pesquisa Médica, da European Society of Intensive Care Medicine (ESICM), dos Institutos Canadenses de Pesquisa em Saúde, do KI, da Prefeitura de Estocolmo e do Viron Molecular Medicine Institute, localizado nos Estados Unidos.

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