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Erro médico mata mais que câncer no Brasil

Um novo estudo sugere que as falhas médicas matam mais de 2 pessoas a cada 3 minutos no Brasil

Por Da redação
Atualizado em 4 jun 2024, 20h13 - Publicado em 26 out 2016, 15h45

A cada três minutos, cerca de dois brasileiros morrem em um hospital por consequência de um erro que poderia ser evitado. A conclusão é de um estudo apresentado nesta quarta-feira no Seminário Internacional “Indicadores de qualidade e segurança do paciente na prestação de serviços na saúde”, realizado em São Paulo.

Essas falhas, chamadas de “eventos adversos”, representam problemas como que vão desde erro de dosagem ou de aplicação de medicamentos até uso incorreto de equipamentos e infecção hospitalar. A pesquisa, realizada pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (Iess), estima que, em 2015, essas falhas acarretaram em 434.000 óbitos, o equivalente a 1.000 mortes por dia.

Isso significa que esses “incidentes” –  erros, negligência ou baixa qualidade do serviço – podem ser uma das principais causas de morte dos brasileiros. De acordo com esse cenário, essas mortes seriam a primeira ou segunda causa de óbitos no país, à frente de doenças cardiovasculares e câncer que em 2013 mataram 339.672 e 196.954 pessoas respectivamente.

Além da morte, os eventos adversos também podem gerar sequelas com comprometimento do exercício das atividades da vida do paciente.

“Não existe sistema de saúde que seja infalível. Mesmo os mais avançados também sofrem com eventos adversos. O que acontece no Brasil está inserido em um contexto global de falhas da assistência à saúde nos diversos processos hospitalares. A diferença é que, no caso brasileiro, apesar dos esforços, há pouca transparência sobre essas informações e, sem termos clareza sobre o tamanho do problema, fica muito difícil começar a enfrenta-lo”, afirma Renato Couto, professor da UFMG e um dos autores do estudo.

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Problema de saúde pública

No mundo, segundo o estudo, ocorrem anualmente 421 milhões de internações hospitalares anuais e 42,7 milhões de eventos adversos, um problema de saúde pública reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Nos Estados Unidos, país com população de quase 325 milhões de pessoas, são registrados cerca de 400 mil óbitos por ano provocados por eventos adversos, sendo a terceira principal causa de mortes no país, depois de doenças cardiovasculares e câncer.

O estudo

O estudo apresenta um conjunto de cenários para projetar a incidência de mortes provocadas pelos eventos adversos nos hospitais brasileiros. No mais conservador, a projeção é de cerca de 104.000 casos por ano, se toda a rede hospitalar brasileira fosse parametrizada por padrões de excelência, como certificações internacionais no nível mais elevado. Entretanto, como a maioria dos hospitais brasileiros públicos e particulares não cumpre esses requisitos, a base mais realista do estudo é a que aponta até 434.000 mortes em 2015.

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Além das vidas perdidas, o estudo projeta que, em 2015, os eventos adversos consumiram entre 5,19 e 15,57 bilhões de reais de recursos da saúde privada brasileira. Não foi possível estimar as perdas para o Sistema Único de Saúde (SUS) porque os valores pagos aos hospitais se originam das Autorizações de Internações Hospitalares (AIHs) e são fixados nas contratualizações, existindo outras fontes de receita não operacionais, com enorme variação em todo o Brasil.

“Hoje, quando alguém escolhe um determinado hospital para se internar, é uma decisão que se baseia na sua percepção de qualidade, na recomendação de um médico ou na opinião de conhecidos. Mas ninguém tem condições de garantir que aquele prestador realmente é qualificado, simplesmente porque se desconhece seus indicadores de qualidade. Não há como saber quantas infecções hospitalares foram registradas no último ano, qual é a média de óbitos por diagnóstico, qual é a média de reinternações e por aí afora. Será que o paciente não quer saber essas informações antes de decidir quem vai cuidar da sua vida?”, indagaLuiz Augusto Carneiro, superintendente executivo do Iess.

Segundo Carneiro, o objetivo do estudo é justamente abrir um debate sobre a qualidade dos serviços prestados na saúde, a partir da mensuração de desempenho dos prestadores e, assim, prover o paciente do máximo possível de informações para escolher a quem ele vai destinar seus cuidados.

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Causas brasileiras

Segundo o estudo, no Brasil, a estrutura física, os equipamentos disponíveis para a assistência, a qualidade e o controle de processos assistenciais, o correto dimensionamento do quadro assistencial, as características e dimensão do hospital e o atendimento à legislação sanitária brasileira de grande parte da rede hospitalar não atende aos requisitos mínimos necessários para a segurança assistencial.

Além disso, o modelo de compra de serviços hospitalares pela saúde suplementar remunera o procedimento e os insumos e não o resultado assistencial. O atual modelo prevalente no país, de “conta aberta” (do inglês fee for service) não contempla estímulos econômicos que privilegiam a eficiência. “Nosso padrão de remuneração premia o desperdício e a ineficiência. Quanto mais insumos são consumidos numa internação hospitalar, maior é a remuneração do prestador”, observa Carneiro.

O trabalho concluiu que a construção de um sistema de saúde mais rigoroso no Brasil envolve um importante conjunto de ações, passando por uma nova forma de prestação de serviços, centrado no paciente, qualificação da rede assistencial e dos profissionais, alterações de modelos de pagamento dos serviços e mudanças legislativas. Mas, sobretudo, deve haver a implementação de mecanismos de transparência que empoderem o cliente (usuários, operadoras, beneficiários e contratantes de planos de saúde) para uma escolha mais consciente dos serviços, considerando qualidade, custos e desempenhos assistenciais.

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