Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Continua após publicidade

Das inconveniências de ficar velho

E o antigo caderninho de endereços também vai envelhecendo

Por Claudio de Moura Castro
Atualizado em 4 jun 2024, 15h02 - Publicado em 24 jan 2020, 06h00

Não se devem tomar estatinas, explicou-me longamente um amigo. Um mês depois, morreu do coração. Qual a sua glicemia? Câncer de próstata, é mesmo? Quem foi o colega de colégio que teve um AVC? Caiu no banheiro? Prótese no joelho bichado? Gostou da UTI do Einstein? Quantos stents? Assim vão as conversas de velho, em uma espiral infindável e incontida. Como profilaxia preventiva, um grupo de conhecidos fez um pacto solene: é proibido falar de doença!

Como fazem os aposentados para preencher o seu dia? A Lei de Parkinson responde: o que quer que precise ser feito vai consumir todo o tempo. Comprar um remédio pode ser empreitada para uma tarde inteira. Vestir-se, conferir a receita, ir à farmácia, checar as novidades e trocar ideias com o farmacêutico. Já em casa, ler a bula e ligar para o amigo, narrando os detalhes da expedição.

Essas questões não são, a rigor, o tema desta crônica, mas, sim, o esforço de manter minha atividade de pesquisador, escritor e conferencista. Meu sucesso na empreitada depende de uma rede de conhecimentos bem azeitada. Por exemplo, a ex-estagiária foi para o Banco Mundial e, de lá, convidou-me para a Clinton Initiative, na qual conheci um brasileiro que me levou para um evento em Londres. Uma consultoria, oferecida por um colega do BID, me aproximou de alguém que me convidou para vários eventos na América Central. Alguém ouviu minha conferência em Santiago e me chamou para falar na Universidad de La Frontera. É o networking, em plena pujança. Sucesso para quem tem um poderoso caderninho de endereços.

“A desgraça é que os amigos, colegas e conhecidos vão se aposentando ou morrendo”

A desgraça é que os amigos, colegas e conhecidos vão se aposentando ou morrendo. Está com Alzheimer o empresário que me levava para visitar seus programas sociais. A ex-estagiária que assumiu bons cargos foi criar cavalos na Bolívia. O amigo em uma posição crítica agora cuida da sua fazenda. Outro virou expert em vinhos e arqueólogo amador.

Continua após a publicidade

Uma a uma, o supremo adversário come as minhas pedras no xadrez da vida. Desfalca-se a network, com efeitos catastróficos. Serão as redes sociais uma poção mágica para sobreviver nessa área? Quem sabe?

As conferências remuneradas escasseiam e as de graça permanecem. Mas, sem aceitar essas últimas, cai a probabilidade das primeiras. Conselho: jamais volte, muitos anos depois, a uma instituição onde trabalhou. Fui à Organização Internacional do Trabalho com a memória dos cumprimentos simpáticos pelos corredores. Vi-me um completo forasteiro. Apenas reconheci o garçom e o jardineiro.

No passivo, diante das novas piruetas e façanhas econométricas, tenho de pedir socorro à nova geração. No ativo, os anos de experiência permitem entender o âmago das questões mais rapidamente e com menos leituras. Sinto que capto o ponto central de um tema, enquanto os jovens se perdem nas tecnicalidades. A inconveniência reside no enorme esforço para remendar a network e conseguir atividades interessantes. E, aqui, luto contra a natureza, pois preciso de toda a energia, na idade em que o ciclo de vida joga contra. Mas não perdi a guerra. Continuo escrevendo, falando e pesquisando.

Publicado em VEJA de 29 de janeiro de 2020, edição nº 2671

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

Apenas 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

a partir de 35,60/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.