Covid-19: Por que ainda não é o momento de uma 3ª dose da vacina
Dados sobre aumento da proteção dos imunizantes após uma dose extra levantaram a discussão, mas no Brasil ainda é preciso avançar na 2ª dose
Na última semana, a discussão sobre a aplicação de uma terceira dose de vacinas contra a Covid-19 esquentou, impulsionada por estudos que mostram aumento da proteção, em especial contra a variante Delta, identificada pela primeira vez na Índia. No entanto, especialistas afirmam que ainda não é hora de colocar em prática essa estratégia, principalmente no Brasil, onde a taxa de pessoas totalmente imunizadas ainda é considerada baixa.
As vacinas contra Covid-19 em uso em todo o mundo mostraram eficácia na prevenção da doença, em especial contra casos graves e óbitos, em testes clínicos. No entanto, o aparecimento de novas variantes mais transmissíveis, como a Alfa, identificada originalmente no Reino Unido; a Gamma, identificada em Manaus; a Beta, originária da África do Sul e mais recentemente, a Delta, da Índia, levantou a preocupação sobre a queda da eficácia. Desde então, as empresas produtoras de vacinas começaram a avaliar novas estratégias, como doses de reforço e formulações diferentes, para tentar aumentar a proteção.
O que dizem os estudos
Resultados preliminares destes estudos vieram a público recentemente, com resultados animadores. No fim de junho, a Universidade de Oxford anunciou que uma terceira dose da vacina desenvolvida em parceria com a AstraZeneca, administrada pelo menos seis meses após a segunda dose, aumenta ainda mais a resposta imune ao novo coronavírus. A dose de reforço resultou em maior atividade neutralizante contra as variantes Alfa, Beta e Delta (B.1.617.2).
Recentemente, a Pfizer e a BioNTech afirmaram que uma dose extra de sua vacina contra a Covid-19, administrada seis meses após a segunda injeção, amplia fortemente a proteção. Tanto que as empresas pretendem pedir aprovação da nova estratégia nos Estados Unidos e na Europa.
Autoridades de saúde israelenses anunciaram no último domingo, 11, que o país irá oferecer uma dose de reforço da vacina da Pfizer-BioNTech para pessoas com o sistema imunológico debilitado, segundo informações da Reuters. A oferta para toda a população ainda está em avaliação. O Reino Unido também avalia a possibilidade de aplicar uma terceira dose das vacinas da Pfizer-BioNTech e de Oxford-AstraZeneca em seus cidadãos que já completaram o esquema vacinal com duas doses.
A mudança ocorre após um estudo feito em Israel constatar que a eficácia geral da vacina Pfizer-BioNTech cai de 91% para 64% contra a variante Delta. O país, assim como os Estados Unidos, o Reino Unido e países da Europa enfrentam um aumento exponencial no número de novos casos associados à disseminação dessa nova cepa. No entanto, a proteção contra casos graves, incluindo hospitalizações, permanece alta: 93%.
Baixa cobertura vacinal
Para o infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, faz sentido esses países, que já têm alta cobertura vacinal iniciarem essa discussão. No entanto, no Brasil, onde apenas 14,9% da população está totalmente vacinada com duas doses das vacinas de Oxford-AstraZeneca, CoronaVac ou Pfizer-BioNTech, ou uma injeção da vacina da Janssen, até esta terça-feira, 13, não cabe essa discussão.
“Nós estamos muito longe de pensar em terceira dose para alguém nesse momento. Mas certamente essa é uma discussão quente para 2022”, afirma o Kfouri. Mesmo com a chegada de novas variantes que podem ser menos suscetíveis às vacinas, é mais importante para o controle da pandemia aumentar a quantidade de pessoas vacinadas, para chegar à tão falada – e sonhada – imunidade de rebanho – do que aumentar a proteção de forma individual, em um pequeno grupo de pessoas.
“A proteção não é individual. Os países que controlaram a pandemia não fizeram isso porque usaram vacinas melhores ou ou porque aplicaram mais doses e sim porque atingiram altas coberturas de vacinação. Basta ver o caso de Serrana. O que controla a doença e aumenta a efetividade da campanha de vacinação é não ter registro de casos e isso se dá com uma vacinação mais ostensiva Por isso, o que precisamos agora é, no menor tempo possível, alcançar uma maior cobertura vacinal”, explica o especialista.
Autoridades de saúde são contra
Vale lembrar que as novas variantes surgem justamente porque o vírus continua circulando em pessoas suscetíveis e o único jeito de acabar com a circulação é aumentar o número de pessoas imunizadas, por meio da vacinação. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que o regime de vacinação estabelecido atualmente é suficiente. “Pode ser que você precise de reforços depois de um ou dois anos. Mas neste ponto, seis meses após a dose primária, não parece haver qualquer indicação ”, disse Soumya Swaminathan, cientista-chefe da OMS, em coletiva de imprensa.
A entidade também reforça que, neste momento, é mais importante expandir a vacinação para locais onde as taxas ainda são muito baixas ou inexistentes do que aplicar uma dose extra em pessoas totalmente vacinadas. O diretor-geral da OMS, Tedros Gebreyesus, relembrou que o mundo todo só estará seguro quando todos os países tiverem controlado a pandemia. Usando a metáfora de uma floresta em chamas, ele reiterou que o mundo precisa acabar com o “inferno pandêmico” de forma unida, porque apagar apenas uma parte dele reduzirá as chamas em uma área, mas enquanto estiver queimando em outra parte, “as faíscas irão eventualmente viajar e crescer novamente em uma fornalha que ruge”.
Até mesmo as agências de saúde dos países citados acima, afirmam que uma terceira dose ainda não é necessária. A Agência Europeia de Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) compartilha da mesma opinião que a OMS. Em uma rara declaração conjunta, a FDA, agência que regula medicamentos nos Estados Unidos, e os Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) dos EUA, disseram que os americanos que completaram o esquema de imunização não precisam de uma injeção de reforço neste momento.
Especialistas também alertam para a possibilidade de aumento da incidência de eventos adversos com uma dose de reforço em um período tão curto. “Estamos muito interessados em saber se uma terceira dose pode ou não estar associada a qualquer risco maior de reações adversas, particularmente alguns dos mais graves – embora muito raros – efeitos colaterais”, disse Jay Butler, vice-diretor do CDC, durante coletiva de imprensa.
Confira o avanço da vacinação no Brasil: