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Brasileiros mapeiam alterações no DNA que tornam melanoma mais grave

Grupo de pesquisadores do Brasil e da França desvendou as marcas que exposição solar deixa no genoma das pessoas com o tipo mais agressivo de câncer de pele

Por André Julião, da Agência Fapesp
Atualizado em 4 jun 2024, 11h42 - Publicado em 14 out 2022, 12h58

Um grupo de pesquisadores do Brasil e da França conseguiu desvendar as marcas que a exposição solar deixa no genoma das pessoas acometidas pelo melanoma cutâneo. O trabalho, publicado na revista Nature Communications, traz ainda uma nova compreensão do que acontece em outros melanomas que não são causados pelos efeitos dos raios ultravioleta.

“Vimos que algumas dessas alterações são marcadores de sobrevivência dos pacientes. Conseguimos predizer se uma pessoa tem mais ou menos chances de sobreviver graças a essas marcas presentes no DNA”, conta Anna Luiza Silva Almeida Vicente, primeira autora do estudo conduzido durante seu doutorado no Hospital de Amor (antigamente chamado Hospital do Câncer de Barretos).

Vicente realizou parte das análises durante estágio de pesquisa na Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC, na sigla em inglês), na França, com apoio de bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

O estudo, que teve a participação de pesquisadores da instituição francesa, revelou as características moleculares que podem indicar maior agressividade e guiar o tratamento.

Um dos melanomas analisados foi o cutâneo, que tem um subtipo ligado à exposição aos raios solares e outro que não tem relação com a radiação ultravioleta. Esses tumores acometem sobretudo indivíduos brancos, afetando principalmente partes da pele expostas ao sol.

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Uma proporção menor das amostras era de melanoma acral, que não tem relação com exposição aos raios ultravioleta, é mais comum em indivíduos negros e ocorre em partes do corpo como a palma da mão e a sola do pé. Esse tipo de melanoma ainda é bastante negligenciado nas pesquisas, normalmente focadas em populações da Europa e dos Estados Unidos.

“Existem vários subtipos de melanoma e todos podem ser agressivos, mas em alguns isso é mais comum. Há caracterizações histológicas, ou seja, que podem ser feitas no microscópio, e outras genéticas, algumas conhecidas e usadas para guiar o tratamento. Estamos abrindo um novo caminho nessa área, o da epigenética, levando em consideração a presença de exposição ao sol, que aponta alterações não na sequência do DNA [como são as mutações genéticas], mas na forma como ele se expressa e codifica proteínas importantes para o funcionamento normal do organismo”, explica Vinicius de Lima Vazquez, diretor-executivo do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital de Amor e um dos coordenadores do estudo.

Informações moleculares

A epigenética é um campo que estuda como fatores ambientais afetam as funções do organismo sem que ocorram alterações na sequência do DNA (mutações). No estudo, os pesquisadores utilizaram diferentes técnicas para analisar a alteração epigenética conhecida como metilação do DNA (uma modificação bioquímica que consiste na adição de um grupo metil à molécula por meio da ação de enzimas).

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A metilação do DNA é um processo necessário para o funcionamento do organismo, mas quando desregulado por fatores externos – como a exposição excessiva aos raios ultravioleta, no caso do melanoma – pode causar disfunções nas células e levar ao câncer.

Os pesquisadores analisaram um total de 112 amostras de melanoma cutâneo e 21 de melanoma acral. No primeiro caso, foram utilizadas amostras coletadas no próprio Hospital de Amor e de um banco de dados internacional, preponderantemente oriundas dos Estados Unidos e da Europa. Os melanomas acrais foram todos de pacientes da instituição de Barretos.

A análise do conjunto de moléculas de DNA metiladas mostrou que os melanomas cutâneos não relacionados à exposição solar são muito mais similares aos melanomas acrais – aqueles que também não sofrem influência dos raios ultravioleta e são mais presentes em pessoas negras – do que aos melanomas cutâneos ligados ao excesso de radiação ultravioleta.

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Os resultados são corroborados pelas taxas de sobrevivência: melanomas acrais e cutâneos não ligados à exposição solar têm menor sobrevida do que os cutâneos relacionados à exposição aos raios ultravioleta.

“Vimos que esses dois tumores não ligados à exposição solar podem ser classificados por histologia como sendo de subtipos diferentes, mas, do ponto de vista da metilação, são molecularmente muito similares, inclusive com uma sobrevida menor. Esse é um aspecto importante trazido pelo trabalho e que pode ter impacto clínico futuramente”, diz Vicente, que atualmente realiza pós-doutorado na Universidade da Califórnia San Francisco, nos Estados Unidos.

Outro resultado que chamou a atenção dos pesquisadores foi que a mutação nos genes BRAF, NRAS e NF1, comum nos melanomas cutâneos, não foi observada na maioria dos melanomas acrais.

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Além disso, 28,6% dos pacientes com melanoma acral eram negros. Enquanto nas amostras de melanoma cutâneo do Hospital de Amor, apenas 5,6% tinham o fenótipo pigmentado de pele.

Segundo Vazquez, alguns tratamentos para outros tipos de câncer estão avançando no sentido de associar informações moleculares com o prognóstico e de identificar os pacientes mais responsivos às terapias disponíveis. Esse é um dos objetivos nos estudos sobre tumores de pele.

“Os melanomas ainda carecem de informações desse tipo que possam ser utilizadas no dia a dia. Estudos como esse trazem novas linhas de investigação para serem exploradas e pavimentam o caminho para que os pacientes sejam tratados de forma cada vez mais personalizada”, encerra o pesquisador.

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