Autismo: conheça cinco avanços na compreensão e diagnóstico do transtorno
Transtorno do Espectro Autista tem sido alvo de estudos que ampliam o conhecimento e qualidade de vida de quem vive com TEA

Antes pouco conhecido e estigmatizado, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) hoje é acolhido e compreendido por pais, educadores, profissionais de saúde e em ambientes sociais. Os sintomas dessa condição que afeta o neurodesenvolvimento, com interferências na comunicação, interação e comportamento, não são desconhecidos e isso tem relação com os avanços nos últimos anos para o diagnóstico e terapias para oferecer autonomia para crianças e qualidade de vida para adolescentes e adultos que enfrentaram desafios até serem diagnosticados.
O autismo não é uma doença. Dentro do espectro, podem se manifestar alterações na linguagem verbal e não verbal, ações repetitivas, hiperfoco em objetos ou temas, tudo isso ligado a alterações de funções do neurodesenvolvimento. Não há uma definição de causa para o TEA, mas os estudos apontam que a interação entre fatores, como componentes genéticos, ambientais e psicossociais, pode ter relação com os casos.
É fato que há um aumento nos registros e os dados mais atualizados indicam um diagnóstico em cada 36 crianças no mundo. No Brasil, um estudo inédito publicado em dezembro do ano passado mapeou a frequência de casos no país e constatou um episódio em cada 30 crianças. Embora mais frequente, o TEA ainda é desafiador para famílias, que encontram gargalos no acesso de terapias, inclusive com negativas de planos de saúde, além do medo constante de não encontrar receptividade em escolas e locais públicos.
Mas há progressos. Nesta terça-feira, 2, quando é celebrado o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, VEJA traz um compilado das últimas novidades apresentadas pela ciência para o transtorno.
Imagens cerebrais para o diagnóstico
Um conjunto de estudos tem mostrado que é possível ir além da avaliação clínica e utilizar exames de imagem para ajudar no diagnóstico do autismo. Cientistas da Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, identificaram alterações cerebrais associadas ao transtorno por meio de ressonância magnética com precisão de até 95%.
Também usando ressonância magnética, pesquisadores japoneses conseguiram medir a conectividade de feixes de fibras nervosas, chamados de tratos de substância branca, a diferentes regiões do cérebro. O estudo, publicado no periódico NeuroImage, detectou diferenças significativas na conectividade cerebral, inclusive em estruturas que se relacionam ao comportamento, fornecendo um possível meio de diagnósticos mais objetivos.
Mais observação do comportamento do que habilidades sociais
A inteligência artificial, tão em moda nos tempos atuais, foi utilizada para compilar os principais comportamentos e padrões observados em pessoas que vivem no espectro autista. Assim, pesquisadores canadenses treinaram uma ferramenta para prever o resultado em mais de 4.000 relatórios clínicos que continham dados observados e históricos dos pacientes, filtrando o que era relevante para o diagnóstico.
O resultado foi que comportamentos repetitivos e interesses específicos, o hiperfoco, eram mais determinantes do que dificuldades para interação social e falta de habilidades de comunicação para fechar o diagnóstico. Ainda falta ampliar esse trabalho e incluir outras populações, pois pode ser um dado importante para pesquisadores e profissionais que atuam com saúde mental e transtornos.
O papel da microbiota intestinal
Pessoas que vivem com o transtorno costumam apresentar sintomas gastrointestinais e estudos investigam não só formas de atenuar o desconforto, mas de entender a relação entre a microbiota intestinal e o TEA em função das evidências sobre a interação dentro do eixo intestino-cérebro.
Um trabalho publicado no ano passado na revista Nature citou descobertas sobre a possibilidade de que o microbioma intestinal seja “um fator contribuinte plausível para o desenvolvimento do TEA” não só pelos sintomas, mas por alterações existentes nessas colônias de bactérias.
“Nossos resultados indicam que o microbioma intestinal tem uma forte associação com TEA e não deve ser desconsiderado como um alvo potencial para intervenções terapêuticas”, diz a publicação.
Atenção à seletividade alimentar
Pessoas que vivem no espectro autista podem apresentar seletividade alimentar, algo que dificulta a construção de uma dieta saudável e pode levar à deficiência de nutrientes.
Uma pesquisa recém-publicada no periódico Nutrients mostrou os impactos da alimentação restrita para deficiência de vitaminas D (25%), A (24,8%), cálcio (10,8%) e ferro (9,6%). A conclusão é que crianças com TEA têm alto risco de deficiência de micronutrientes.
“Pessoas com seletividade alimentar podem evitar não apenas alimentos específicos, mas também categorias inteiras de alimentos que consideram repulsivos. Por exemplo, evitar vegetais verdes, frutos do mar ou alimentos com texturas específicas”, explica a médica nutróloga Marcella Garcez, professora e diretora da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran). “Essa aversão a certos alimentos pode limitar drasticamente a variedade na dieta, levando a uma ingestão nutricional inadequada e falta de nutrientes essenciais.”
Tratamento com canabidiol
O uso de canabidiol tem demonstrado resultados animadores para o tratamento de pessoas diagnosticadas com autismo, de acordo com um estudo conduzido pelo Hospital Universitário de Brasília (UnB). Durante sete meses, 30 pacientes de 5 a 18 anos foram tratados com um fitoterápico chamado Nabix 10000, à base de canabidiol (CBD) e tetraidrocanabinol (THC), e apresentaram melhoras nos sintomas.
Os resultados mostraram que 70% dos participantes tiveram redução em comportamentos de agressividade e irritabilidade, 67% demonstraram avanços na comunicação e interação social e 63% tiveram progressos em disfunções sensoriais, caso da aceitação de alimentos e do toque físico.
O estudo brasileiro deve ser expandido para inclusão de grupos de controle e mais participantes para confirmar os achados. E, assim como outras pesquisas em desenvolvimento, vai buscar caminhos para que a população que vive no espectro seja cada vez mais beneficiada pelas descobertas da ciência.