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Insulina em cápsula

Pesquisadores estão perto de uma conquista que se busca desde 1921: testam, com bons resultados, uma pílula que libertará os diabéticos das injeções

Por Thaís Botelho Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 16h34 - Publicado em 13 jul 2018, 06h00

Um trabalho desenvolvido por pesquisadores da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, pode estar prestes a revolucionar o estilo de vida dos 425 milhões de diabéticos no mundo: a insulina em cápsula. Para quem tem o tipo 1 da doença — autoimune, em que o pâncreas não produz insulina, o hormônio crucial para regular os níveis de açúcar no sangue —, a única opção é injetar a substância em sua forma sintética sob a pele até quatro vezes por dia. Para os cerca de 90% da população com o tipo 2 — em que o corpo não produz insulina suficiente ou não responde ao hormônio como deveria —, as injeções também podem ser necessárias (veja o quadro na página ao lado).

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(Arte/VEJA)

Estudiosos desenvolveram uma fórmula inovadora de transportar o hormônio por via oral. Até então, havia uma série de barreiras naturais no estômago e no intestino que impediam a insulina via oral de chegar à corrente sanguínea e, assim, transportar a glicose no sangue para as células. Por isso, a busca por esse sistema de administração do hormônio tem sido considerada o “santo graal” na pesquisa sobre diabetes desde 1921, quando os estudiosos canadenses Frederick Banting e Charles Best isolaram a substância em laboratório pela primeira vez. Nessa recente tentativa, os pesquisadores da Harvard inseriram o hormônio em um líquido feito de duas substâncias sabidamente seguras para humanos: a colina (molécula natural presente em vitaminas do complexo B) e o ácido gerânico (usado como aromatizante alimentar). O líquido — chave da nova abordagem — foi então colocado em uma cápsula cujo revestimento a impede de ser dissolvida por enzimas no sistema digestivo. O revestimento — de polímero — dissolve-se quando atinge o ambiente alcalino do intestino delgado, permitindo que só então o líquido que transporta a insulina seja liberado.

Ainda em fase de teste na Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas (Seas) John A. Paulson, da própria universidade, a fórmula mostrou-se promissora quando foi usada em ratos: baixas doses de insulina em cápsula promoveram a diminuição nos níveis de açúcar no sangue dos camundongos. “Essa cápsula revelou-se tão eficiente quanto um canivete suíço: dispõe de ferramentas capazes de contornar cada um dos problemas que dificultavam a utilização do hormônio por via oral”, disse a VEJA Samir Mitragotri, engenheiro químico e coautor do estudo. O trabalho foi publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences, uma das revistas científicas mais prestigiadas do mundo.

Outra novidade obtida pelo trabalho foi que, ao contrário das soluções de insulina para injeções, que devem ser refrigeradas e se man­têm apenas por algumas semanas, o líquido usado na pílula permaneceu estável por dois meses à temperatura ambiente, e pelo menos por quatro meses quando refrigerado. “Até agora, essa foi uma das mais promissoras pesquisas envolvendo insulina por via oral. Além de alcançar bons resultados quanto à eficácia da ação, mostrou-se mais durável para o armazenamento”, observa Fabio Trujilho, endocrinologista e presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.

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Outras equipes de pesquisa pelo mundo estão trabalhando em tentativas de encapsular o hormônio. Contudo, nenhuma formulação eliminou com sucesso todos os obstáculos clínicos. Até agora, não há produto de insulina oral comercialmente disponível. Em países emergentes como o Brasil, em decorrência do estilo de vida da população e do consumo de dietas altamente calóricas, há cada vez mais doentes. Hoje, já são 12,5 milhões os brasileiros com diabetes. O Brasil está em quarto lugar entre os dez países que apresentam maior número de diabéticos.

Apesar dos resultados promissores, a pílula de insulina precisa passar por ensaios clínicos em humanos, o que, de acordo com os autores do estudo, deve acontecer em até cinco anos. Enquanto ela não chega, americanos e europeus — e, em breve, brasileiros — já se beneficiam de outro tipo de insulina indolor: a inalável. Com o nome comercial de Afrezza, o medicamento é uma versão do hormônio em pó, para ser inalado com o auxílio de um aplicador similar a um apito. No entanto, sua ação tem início em apenas doze minutos e, justamente por ser muito rápida, ela não dispensa a aplicação diária da insulina injetável — vantagem apresentada pela pílula em estudo. No Brasil, o Afrezza se encontra em processo de avaliação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a entidade responsável por aprovar a circulação de remédios no país. O lançamento está previsto para ocorrer no primeiro semestre de 2019.

 

Publicado em VEJA de 18 de julho de 2018, edição nº 2591

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