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Carta ao Leitor: A história se repete

A nova Guerra Fria é essencialmente econômica, e 2020 será lembrado como o marco do acirramento de humores entre chineses e americanos

Por Da Redação Atualizado em 7 ago 2020, 14h41 - Publicado em 7 ago 2020, 06h00

“Desde o Estetino, no Báltico, até Trieste, no Adriático, uma cortina de ferro desceu sobre o continente”, disse Winston Churchill em uma visita oficial aos Estados Unidos, em 5 de março de 1946. Ele carimbava, naquele instante e com uma de suas mais conhecidas máximas, pérola de um frasista genial, o fosso que eclodira ao fim da II Guerra, com o mundo rachado ao meio, dividido entre a influência da União Soviética, especialmente em relação aos países da Europa do Leste, e a dos Estados Unidos, na porção ocidental. A intransponível “cortina de ferro” foi o mais conhecido símbolo da chamada Guerra Fria, que brotou dos escombros e foi até a derrubada de seu mais infame fruto, o Muro de Berlim, erguido em 1961 pelas autoridades comunistas da Alemanha Oriental de modo a separá-la de Berlim Ocidental.

A queda da barreira de cimento e pedra, em novembro de 1989, e o desmantelamento soviético, em dezembro de 1991, marcaram o fim de um período de tensão geopolítica que fez o mundo tremer, alimentou desentendimentos e inflamou radicalismos. A Guerra Fria foi a trama que originou a Guerra da Coreia, a Guerra do Vietnã e a crise dos mísseis, naquele outubro de 1961, em que armamentos soviéticos foram instalados em Cuba, atalho para um iminente conflito nuclear, desativado de última hora em um acordo improvável entre Nikita Kruschev e John Kennedy. A disputa pelo cosmo e pela supremacia atômica fomentava a rivalidade. Não havia limites, nem mesmo para fora do planeta, com os programas espaciais: era Yuri Gagarin ou Neil Armstrong, Sputnik ou Apollo.

Como a história se repete como farsa, vive-se uma nova Guerra Fria, agora entre China e Estados Unidos. A versão revisitada é diferente da anterior. Os chineses não têm interesse em ditar a ideologia política dos governos debaixo de seu guarda-chuva, como faziam os soviéticos. Os Estados Unidos querem distância dos embates internacionais que não lhes interessam diretamente. São países politicamente muito distantes — um vive sob ditadura comunista, cuja pressão sobre Hong Kong é o espelho conturbado de sua postura autoritária, e o outro é uma democracia plena, com imprensa livre e direito a críticas impiedosas ao presidente Donald Trump. No tabuleiro econômico atual, já não se trata de impor ideias, mas, sim, de costurar alianças comerciais, atrair parceiros, inclusive, claro, o Brasil (os chineses são os maiores consumidores dos produtos brasileiros).

Existe uma conexão possível entre o passado e o presente no duelo tecnológico — o que antes eram naves espaciais e armas atualmente pode ser resumido ao domínio da internet, por meio do padrão 5G, que a China já oferece e em que os Estados Unidos demoraram a investir, e até a queda de braço em torno de aplicativos de redes sociais, como o TikTok. O que sustenta os dentes afiados da potência asiática é seu extraordinário crescimento econômico. Desde 2000, a participação da China no PIB mundial, que era de 4%, quadruplicou. Do outro lado, os Estados Unidos, superpotência mundial desde o fim da II Guerra e donos de uma indústria da inovação poderosa, representada por empresas como Google, Facebook, Apple, Amazon e Tesla. Como mostra a reportagem especial a partir da página 52, a nova Guerra Fria é essencialmente econômica. Nos livros de história que ainda serão escritos, 2020 ficará para sempre lembrado não apenas como o ano da pandemia, mas também como o marco do acirramento de humores entre chineses e americanos.

Publicado em VEJA de 12 de agosto de 2020, edição nº 2699

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