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A reforma de fancaria

Sob o pretexto de melhorar a prática política, deputados tentam aprovar mudanças cujo objetivo é um só: facilitar a própria reeleição

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Robson Bonin Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 19 ago 2017, 06h00 - Publicado em 19 ago 2017, 06h00

A promessa era de moralização. Os parlamentares aprovariam uma reforma política destinada a promover uma faxina partidária, reduzir o custo das campanhas e aproximar os representantes dos representados. Como de costume, a motivação propalada era nobre: acabar com as brechas que fomentam a troca de favores, o fisiologismo e a corrupção. Como de costume, a realidade mostrou-se outra: os parlamentares estão prestes a aprovar uma proposta que, ao fim e ao cabo, atenderá a dois propósitos: facilitar-lhes a reeleição e garantir-lhes os recursos necessários para bancar as próprias campanhas — recursos que, até segunda ordem, sairão dos esvaziados cofres públicos.

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(Arte/VEJA)

Nesta semana, a Câmara deve votar a primeira parte da reforma política, que trata do sistema de escolha de deputados e vereadores e do modelo de financiamento do processo eleitoral. A prioridade dos deputados é definir uma nova fonte de verbas. Pelas regras atuais, os candidatos podem ser financiados por pessoas físicas e pelo fundo partidário, de 819 milhões de reais neste ano. Os parlamentares afirmam que apenas essas fontes são insuficientes e defendem a criação de um fundo de 3,6 bilhões de reais, cujos recursos sairiam do Orçamento da União. A péssima repercussão da proposta forçou os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB), a tentar costurar alternativas para substituí-la.

Maia defende a volta do financiamento privado, como se não fosse a fonte dos maiores escândalos nacionais. Ele quer limites bem definidos, supondo que isso possa evitar uma nova derrama de dinheiro (e as inevitáveis exigências de contrapartida) das empresas para os partidos. Maia tem o apoio do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes. “Se as campanhas continuarem caras, certamente vai entrar dinheiro de outros lugares. Para as próximas eleições, muito provavelmente teremos fundo público, doação de pessoas físicas e caixa dois”, disse Mendes a VEJA.

Eunício, no entanto, resiste ao financiamento privado. Em público, alega que as campanhas podem ser custeadas com as emendas parlamentares e o fundo partidário, sem a necessidade de retirar mais 3,6 bilhões de reais dos cofres públicos. No privado, argumenta que, com a Lava-­Jato nas ruas, nenhuma grande empresa vai se dispor a doar dinheiro aos políticos. A volta do financiamento empresarial, portanto, seria inócua.

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Já a definição sobre o modelo de escolha de deputados e vereadores preocupa bem menos os parlamentares. A substituição do sistema proporcional, hoje em vigor, pelo modelo do chamado “distritão” é uma das ideias em pauta. Deputados que defendem o modelo, muitos deles investigados na Lava-Jato, levam em conta o fato de que ele facilita a reeleição de quem já tem mandato.

No distritão, elegem-se os deputados e vereadores mais votados individualmente (veja o quadro). Leva vantagem, portanto, quem é mais conhecido. Os defensores da proposta alegam que ela evita o “efeito Tiririca”, que ocorre quando um “puxador de votos” acaba por assegurar a eleição de colegas de partido com votação ínfima. Essa vantagem do modelo, porém, é largamente superada por suas desvantagens. Ao favorecer a eleição de nomes conhecidos, categoria que inclui de velhos políticos e políticos com mandato a celebridades instantâneas, o sistema impede a renovação do Parlamento, estimula a perpetuação de oligarquias e dificulta a representação das minorias. Para os partidos, há uma dificuldade adicional: eles terão de pedir aos eleitores que não depositem todos os votos no nome mais aclamado da sigla, sob pena de deixarem de fora correligionários que não figuram entre os mais votados.

Numa conversa com Rodrigo Maia, Eunício Oliveira disse que só pautará o distritão se a Câmara aprovar outras medidas destinadas a moralizar o sistema político, como a cláusula de barreira. Tal qual Maia, Eunício é investigado pela Lava-Jato. Mesmo assim, não quer aparecer como padrinho do distritão, cuja função última e principal não é meramente favorecer reeleições, mas evitar a perda do foro privilegiado — ao menos no caso de políticos enroscados no petrolão.

Na sexta-feira passada, por exemplo, o juiz Sergio Moro determinou a prisão temporária de Cândido Vaccarezza, ex-líder dos governos Lula e Dilma na Câmara, acusado de embolsar propina desviada da Petrobras. Descontadas raras exceções, a Lava-Jato só puniu até agora políticos que, como Vaccarezza, ficaram sem mandato. O que, a esta altura, parece um péssimo negócio.

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