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A batalha por dinheiro, poder e fiéis da Igreja Universal em Angola

Religiosos da nação africana tomam 40% dos templos e abrem uma crise política que pode tirar a igreja de Edir Macedo do país

Por Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 3 jul 2020, 12h05 - Publicado em 3 jul 2020, 06h00

Edir Macedo construiu o império da Igreja Universal do Reino de Deus passando por cima de desafetos e sufocando revoltas internas no Brasil e no mundo. Quem bateu de frente com a sua liderança foi obrigado a deixar a instituição, como fizeram, só para citar dois exemplos, os pastores Valdemiro Santiago e RR Soares, hoje seus principais concorrentes no segmento neopentecostal. Um fenômeno inédito, no entanto, ocorre neste momento em Angola, um dos entrepostos mais estratégicos no projeto de expansão da Iurd na África, iniciado nos anos 1990, e que hoje abriga 306 das 1 300 filiais no continente. Em vez de sair e fundar a sua própria denominação, um grupo de obreiros, pastores e bispos locais resolveu se rebelar contra os brasileiros e tomar de assalto em torno de 40% dos templos — e, por consequência, parte dos seus cofres (a receita anual total é de 80 milhões de dólares) e fiéis (mais de 500 000). A religião parece um detalhe em meio a essa disputa por poder e dinheiro. Não há santos na história — até porque a linha teológica da Universal não os admite — e um grupo ataca o outro com acusações pesadas. O imbróglio cresceu de proporção e transformou-se em um problema político, judicial e diplomático.

INVESTIGADO - Honorilton Gonçalves: acusado de usar uma milícia contra rivais. (//Arquivo pessoal)

No fim de junho, aproveitando-se das igrejas vazias por causa da Covid-19, os pastores da chamada “comissão reformada” da Universal invadiram templos nas províncias de Huambo, Benguela, Cafunfo, Malanje e Luanda (onde está a capital) e decretaram, aos gritos de “justiça” e hasteando bandeiras de Angola nos púlpitos, que aquelas catedrais agora estavam “sob o nosso controle”. Liderados pelo bispo Valente Bezerra Luiz, o primeiro angolano a ser ordenado pastor da Iurd no país e com mais de 28 anos de trabalho pela igreja, eles traziam uma longa lista de acusações, que envolviam racismo (os brasileiros reservariam aos africanos os postos mais baixos da hierarquia), evasão de divisas (envio ilegal de dinheiro coletado nos cultos para o Brasil), lavagem de dinheiro (por meio de transações irregulares de imóveis), imposição de vasectomia (para que a paternidade não desvie a atenção do trabalho nos templos) e abuso de poder. Do outro lado, o bispo Honorilton Gonçalves, braço-direito na África de Edir Macedo, acusa os “rebeldes” de “xenofobia, desvios de condutas morais e atos criminosos”.

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Nos últimos dias, a batalha esquentou de vez. O grupo ligado ao brasileiro declarou que seus membros foram expulsos de suas residências e agredidos. Os reformados, por sua vez, alegaram que Honorilton contratou uma milícia armada para retomar as igrejas. A ação acabou sendo impedida pelas polícias locais, o que foi interpretado no país como mais um sinal de mudança de postura das autoridades com relação à Universal. Antes simpáticas a Edir Macedo, elas passaram a questionar os negócios do líder religioso. No dia 30 de junho, o governo angolano abriu uma investigação para apurar as denúncias de “uso de armas de fogo, ofensas corporais e ameaças de morte” por parte dos envolvidos na briga. As acusações dos rebelados podem alimentar outro inquérito que está sendo conduzido desde o fim do ano passado pela Procuradoria-Geral da República para apurar os desmandos da Iurd em solo angolano. No início deste ano, o diretor do Instituto Nacional para Assuntos Religiosos, Francisco Castro Maria, admitiu a possibilidade de cassar o registro da Universal se forem comprovadas as irregularidades.

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LÍDER - Valente Bezerra Luiz: 28 anos de serviços prestados antes de se rebelar. (//Reprodução)

Tendo Edir Macedo como um dos seus maiores aliados no universo do eleitorado evangélico, o governo Jair Bolsonaro foi pressionado a entrar no impasse. Na última semana, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, conversou com o chanceler angolano, Téte António, para tratar do tema. A VEJA, o embaixador brasileiro em Angola, Paulino Franco de Carvalho, disse que tem atuado “com firmeza” junto às autoridades locais para “coibir esses abusos cometidos contra cidadãos brasileiros”. “É um assunto que nos preocupa”, afirma ele. “As pessoas foram expulsas de suas residências e é inegável que atos de violência foram cometidos.” O bispo Macedo, aliás, decidiu se envolver pessoalmente na guerra e chegou a “amaldiçoar” todos os rebeldes, dizendo que eles e suas famílias “vão descer às sepulturas mais breve do que imaginam”. O grupo angolano, constituído de pastores que já enfrentaram epidemias, guerras civis e perseguição de muçulmanos em outros países africanos “em nome do Evangelho”, também não mostra a menor intenção de recuar. “A Iurd de Angola não é uma filial do Brasil, e estamos exercendo o nosso direito. Como não teve diálogo com a direção, viemos a implementar essas mudanças de forma coerciva”, disse Valente a VEJA. O inferno particular da Universal na África está longe de terminar.

Publicado em VEJA de 8 de julho de 2020, edição nº 2694

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