‘The Economist’ aponta risco à Amazônia e pede reação mundial a Bolsonaro
Em reportagem de capa, revista britânica afirma que presidente brasileiro é ‘sem dúvida, o chefe de Estado mais perigoso em termos ambientais do mundo’
Em sua mais recente edição, a revista britânica The Economist produziu uma matéria de capa – sob o título “Velório para a Amazônia – a ameaça do desmatamento descontrolado” – e um editorial (texto com opinião da publicação) criticando as políticas adotadas pelo governo Jair Bolsonaro com relação à Amazônia – que sofre com o aumento acelerado do desmatamento desde 2015. “Desde que ele assumiu o cargo em janeiro, árvores vem desaparecendo a uma taxa de duas Manhattans por semana”, relata a publicação, que diz que Bolsonaro é “sem dúvida, o chefe de Estado mais perigoso em termos ambientais do mundo”.
“A maravilha natural da América do Sul pode estar perigosamente próxima do ponto de inflexão além do qual sua transformação gradual em algo mais próximo do estepe não pode ser impedida ou revertida (…). O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, está apressando o processo – segundo ele, em nome do desenvolvimento. O colapso ecológico que suas políticas podem precipitar seria sentido com mais intensidade nas fronteiras de seu país, que circundam 80% da bacia – mas também ia muito além delas. Ainda dá para evitar”, afirma a reportagem.
O texto aponta que a situação ambiental do bioma começou a piorar abruptamente durante o primeiro mandato do governo Dilma Roussef (2011 a 2014) – marcado pela flexibilização do Código Florestal aliada à redução de 72% da verba de proteção à Amazônia, que corresponde a 40% das florestas tropicais de todo o mundo. Fora isso, a The Economist afirma que a recessão e as crises políticas reduziram a habilidade do governo em reforçar as leis de proteção. “Agora, Bolsonaro, alegremente, utiliza uma motosserra contra elas [leis]”, completa a publicação.
Dando força à preocupação da revista britânica, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou nesta quinta-feira a taxa anual de desmatamento, que aumentou em 40% em relação ao levantamento do ano passado – Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, declarou que os números levantados pelo órgão “não refletem a realidade”, mas assumiu que há aumento do desflorestamento.
Além de criticar a situação do Brasil, a revista também sugere que – dada a importância mundial da floresta -, parceiros comerciais do país comecem a buscar acordos que incluam a proteção da Amazônia; como feito no acordo entre a União Europeia e o Mercosul, que possui termos sobre proteção florestal. “O desmatamento descontrolado pode acabar prejudicando os agricultores brasileiros se isso levar a boicotes estrangeiros de produtos agrícolas brasileiros. Os brasileiros comuns devem pressionar seu presidente para reverter o curso. Eles foram abençoados com um patrimônio planetário único, cujo valor é intrínseco e sustentador da vida, tanto quanto é comercial. Deixá-lo perecer seria uma catástrofe desnecessária”, conclui.
Recentemente, o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Yves Le Drian, esteve no Brasil, mas sua passagem foi marcada pelo cancelamento de reunião com Bolsonaro em cima da hora. A agenda de Le Drian também previa encontros com uma ONG para discutir proteção ao meio ambiente, o que provocou a reação do presidente: “O que que ele veio tratar com ONG aqui? Quando fala em ONG, já nasce um alerta na cabeça de quem tem o mínimo de juízo. Dá um sinal de alerta”, disse.
Segundo a revista, o presidente brasileiro acusa os estrangeiros de hipocrisia ao defender a preservação da Amazônia, alegando que os países ricos já destruíram suas florestas e que usam a retórica ambiental como pretexto para manter a pobreza do Brasil. “A Amazônia é nossa”, disse o presidente recentemente, lembra o texto.
A revista questiona e chama os argumentos de Bolsonaro de “falhos”. “Sim, o mundo rico arrasou suas florestas. O Brasil não deve copiar seus erros, mas aprender com eles como, por exemplo, a França, reflorestando enquanto ainda pode”, afirma. Para a publicação, “o desmatamento não é um preço necessário para o desenvolvimento”. “A produção brasileira de soja e carne bovina subiu entre 2004 e 2012, quando a derrubada de florestas diminuiu em 80%”, relata. E lembra que a agricultura brasileira pode ser a maior vítima do desmatamento, que pode provocar mudanças climáticas na região. “A seca de 2015 fez com que os agricultores de milho no Estado de Mato Grosso perdessem um terço de sua colheita”.
Por fim, a reportagem pede reação do mundo à política ambiental do brasileiro. “Por todas estas razões, o mundo deveria deixar claro ao senhor Bolsonaro que não tolerará seu vandalismo. Companhias de alimentos, pressionadas pelos consumidores, deveriam rejeitar a soja e a carne produzidas em terras amazônicas ilegalmente exploradas, como aconteceu em meados dos anos 2000. Os parceiros comerciais do Brasil devem fazer acordos atrelados ao seu bom comportamento” afirma e lembra que o acordo entre a União Europeia e o Mercosul, que ainda precisa ser ratificado, já inclui dispositivos para proteger a floresta tropical. “É esmagadoramente do interesse das partes aplicá-las”.