TCU estuda confiscar leitos de militares e punir governantes na pandemia
Ministros querem o mínimo de 50% dos leitos de hospitais militares para o SUS e avaliam responsabilizar autoridades que acabaram com hospitais de campanha
O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu cobrar dos comandos do Exército, Marinha e Aeronáutica e dos Ministérios da Saúde e da Defesa um inventário de todos os leitos disponíveis em hospitais militares por considerar que há espaço para que unidades de saúde geridas pelas Forças Armadas sejam obrigadas a reservar no mínimo metade deles para pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) durante o enfrentamento da Covid-19. As autoridades terão dez dias para informar a taxa de ocupação dos leitos nos últimos 24 meses para que seja possível avaliar um ano em situação normal, sem a pressão sanitária exercida pelo coronavírus, e um ano sob o desgaste provocado pela pandemia.
Em uma ofensiva contra o que consideram má gestão de prefeitos e governadores, os ministros da Corte de Contas decidiram também abrir um processo de fiscalização para que se apure quem deu ordens para que fossem desmontados hospitais de campanha e que critérios nortearam as autoridades a considerarem, no ano passado, que essas estruturas não eram mais necessárias. Com as mortes diárias ultrapassando a casa das 2.000 e sucessivos recordes de óbitos sendo anunciados no país, o ministro Vital do Rego, do TCU, defende que haja uma espécie de confisco dos leitos militares para o atendimento à população civil. O decano do tribunal Walton Alencar, por sua vez, quer ouvir prefeitos e governadores para apurar de quem é a culpa pela inexistência de hospitais de campanha no momento em que o país se tornou o epicentro global de casos do novo coronavírus.
No último dia 17, o ministro Benjamin Zymler já havia determinado que os leitos em hospitais militares fossem informados, mas o ministro Jorge Oliveira, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a Corte de Contas, foi procurado pelo Ministério da Defesa em busca de mais prazo. Oliveira é o principal interlocutor do tribunal junto ao bolsonarismo e aos demais integrantes do colegiado fez uma defesa enfática da importância de os leitos militares não serem confiscados para o uso de civis.
“Assim como os profissionais de saúde, médicos e enfermeiros e todos aqueles que trabalham nos hospitais, os militares também são a força de trabalho do Estado brasileiro que estará nas piores adversidades. Não se trata de um privilégio, mas sim de entender que eles que vão garantir e estarão atuando nos piores cenários tenham um pronto atendimento. Não há como classificar o militar como sendo melhor ou pior do que ninguém. Ele apenas desenvolve uma atividade diferenciada. É uma das poucas profissões que se exige o sacrifício da própria vida”, disse Oliveira. Para ele, haveria “comprometimento de segurança” se o público comum pudesse ser atendido em hospitais militares que não disponibilizam franco acesso a pacientes civis. Nos debates sobe a importância de ceder os leitos, ele afirmou ainda que militares e seus familiares contribuem para o fundo de saúde para poderem ser atendidos nas instalações vinculadas às Forças Armadas.
“Estamos vendo milhares de pessoas morrendo asfixiadas sem atenção imediata porque os leitos estão absolutamente cheios em todo o país e as Forças Armadas deixam uma reserva estratégica? Onde tem reserva técnica, onde tem uma cama, onde tem um respirador, onde tem material para acudir um cidadão, que ele possa ser acudido”, rebateu o ministro Vital do Rêgo, que defende a obrigatoriedade de pelo menos 50% dos leitos serem destinados ao SUS.
No caso dos hospitais de campanha, Walton Alencar afirmou que todos os governadores que desmobilizaram as estruturas de atendimento à população deveriam prestar contas, desde já, ao tribunal. “Não se justifica a desmobilização dos leitos que houve sem uma razão profunda de interesse público, que não há. Por que a culpa recai apenas sobre o governo federal? O que aconteceu? Só o governo federal pecou?”, questionou.