STF proíbe atuação contra liberdade de expressão em universidades
Ministros da corte mantiveram decisão liminar de Cármen Lúcia, que suspendeu o ingresso da Polícia Federal e de outras forças de segurança nas universidades
Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram, nesta quarta-feira (31), que autoridades não podem determinar a entrada de agentes policiais em universidades, públicas ou privadas, em ações que contrariem a liberdade de expressão no ambiente acadêmico.
O caso envolve uma série de decisões tomadas por juízes eleitorais, que autorizaram, às vésperas do segundo turno das eleições, invasões policiais às instituições de ensino sob o argumento de investigar propagandas eleitorais ilegais — foram registradas 17 intervenções em nove estados na semana que antecedeu a votação.
A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral da República com o objetivo de evitar ofensas a preceitos fundamentais previstos na Constituição, como o direito à liberdade de manifestação do pensamento, de expressão da atividade intelectual, do pluralismo de ideias e a autonomia didático-científica e administrativa das universidades.
Reunidos em plenário, os ministros mantiveram a liminar da ministra Cármen Lúcia, que suspendeu no sábado o ingresso da Polícia Federal e de outras forças de segurança nas universidades. Eles defenderam a liberdade de cátedra, de reunião e de expressão e também falaram da tramitação do projeto Escola sem Partido, cuja discussão foi adiada para a próxima semana.
“Decisões que proibiram palestras, aulas que iriam ocorrer, ferem a liberdade de reunião ferem a liberdade de manifestação, de expressão, com censura prévia, ferem a liberdade de cátedra”, avaliou Alexandre de Moraes. “Se um professor, o expositor quer falar sobre o fascismo, o comunismo, o nazismo, ele tem o direito de falar. E os alunos, as pessoas têm direito de escutar e realizar um juízo crítico e eventualmente repudiar aquilo que está sendo dito. Não é a autoridade pública que vai fazer um filtro paternalista e antidemocrático”, completou Moraes.
Para o ministro Luís Roberto Barroso, os atos do poder público confundiram liberdade de expressão com propaganda eleitoral. “Nós não consideramos razoável ou legítimo cenas de policiais irrompendo em salas de aula para impedir a realização de palestras ou retirada de faixas que remetem à manifestação de alunos”, disse Barroso. Para o ministro, a universidade não é “monopólio de nenhuma linha de pensamento, seja de um lado ou de outro”.
Para o ministro Gilmar Mendes, é “inadmissível que justamente num ambiente em que deveria imperar o livre debate de ideias se proponha um policiamento político ideológico da rotina acadêmica”. Ele ainda criticou a iniciativa da deputada estadual eleita em Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL), que estimulou denúncias anônimas contra professores através de seu número de celular. O Ministério Público de Santa Catarina quer que ela seja condenada a pagar cerca de R$ 70 mil de indenização por danos morais coletivos.
“Devemos dar resposta, não só em relação a eventuais atos estatais, como vimos, mas também atos decorrentes de eventuais iniciativas privadas, hoje perpetradas no âmbito da internet, e que causam pânico, terror, causam medo às pessoas”, comentou Gilmar Mendes, ao comentar o caso de Santa Catarina. A ministra Cármen Lúcia determinou a notificação da deputada eleita.
O ministro Edson Fachin, por sua vez, ressaltou que a Constituição garante a autonomia das universidades. “O que debater, quando debater, são decisões que não estão sujeitas ao controle estatal prévio. Mais do que isso, a Constituição, ao garantir a autonomia e o pluralismo na universidade, abomina qualquer intervenção que afaste o funcionamento do livre ambiente do intercâmbio de ideias”, afirmou Fachin.
No último sábado, véspera do segundo turno, Cármen Lúcia impediu qualquer determinação para a busca e apreensão de documentos, a interrupção de aulas, debates e manifestações em universidades e a coleta irregular de depoimentos de professores ou alunos. De acordo com sua decisão os atos questionados apresentam “subjetivismo” e demonstram erro de interpretação de lei.
A norma que regulamenta a propaganda eleitoral e proíbe alguns comportamentos no período eleitoral, segundo Cármen Lúcia, têm o objetivos de impedir o abuso do poder econômico e político e de preservar a igualdade entre os candidatos no processo. Ela destacou que o processo eleitoral, no Estado democrático, fundamenta-se nos princípios da liberdade de manifestação do pensamento, da liberdade de informação, de ensino e aprendizagem, e de escolhas políticas, além da autonomia universitária.
(com Estadão Conteúdo)