
Em nova cutucada nos parlamentares, Bolsonaro criticou um projeto, aprovado pelo Congresso, que cria regras para os indicados às agências reguladoras. Em suas próprias palavras, o projeto dá “superpoderes” ao Legislativo e o transforma em uma “rainha da Inglaterra”, ao limitar seu poder de indicar pessoas de sua confiança para as agências.
Trata-se, entretanto, de um dos projetos mais relevantes dos últimos anos. Na versão enviada pelo Senado, o projeto estabelecia uma comissão que listaria nomes para a escolha final do presidente. Ao vetar esse ponto, Bolsonaro sinalizou que quer total controle sobre as indicações, alegando, erroneamente, que não haveria critérios claros de seleção. Em realidade, nesse caso, o Senado agiu de forma exemplar. No fim do ano passado, os deputados retiraram travas do projeto original que impediam indicações de políticos e parentes, manobra que valeria inclusive para os gestores das estatais. Os senadores evitaram esse estrago e retornaram os critérios técnicos estabelecidos pelo projeto original.
Com essa nova crítica, Bolsonaro, mais uma vez, comporta-se como os governantes do PT. Logo no seu primeiro mandato, Lula disse que as agências reguladoras eram uma “terceirização” das atribuições do governo. Dilma mandou como quis, à revelia de técnicos das agências. Todos eles demonstram não entender que esta é justamente a ideia de ter agências independentes: isolar o processo regulatório dos desvarios dos populistas no poder. Com isso, os empresários têm um cenário mais estável para investir em setores regulados.
No caso de Bolsonaro não querer mesmo virar rainha, aqui vão dois conselhos para ele. Primeiro, o presidente precisa se informar. Há vários projetos bons tramitando no Legislativo que podem ajudar a aumentar a produtividade do setor público e destravar investimentos em saneamento, energia, mineração e outros setores. E, é claro, há a reforma da Previdência, que exige esforço hercúleo de articulação. Nesses casos, Bolsonaro deveria ouvir mais os técnicos do que os agitadores das mídias sociais.
Precisa também propor e apoiar boas peças legislativas. Por exemplo, o projeto de reforma tributária proposto pelo economista Bernard Appy, que foi abraçado pelo Congresso, é considerado tecnicamente superior ao proposto pelo secretário Marcos Cintra, do Ministério da Economia. Se o governo não se esforçar em pautar textos de qualidade, permanecerá como mero observador de tramitações encampadas pelos parlamentares.
Até o momento, Bolsonaro parece querer envolver-se mais em projetos secundários e polêmicos, como aquele para flexibilizar o porte de armas. No seu cálculo político, é uma forma de mostrar que segue suas promessas de campanha. Mas o tempo urge: a janela de reformas rapidamente se fechará quando entrar o novo calendário eleitoral. Se quer mesmo colocar o Brasil acima de tudo, inclusive do seu nicho de apoiadores, Bolsonaro deve inteirar-se da pauta em tramitação e investir seu capital político em projetos que realmente importam.
Publicado em VEJA de 3 de julho de 2019, edição nº 2641

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