Nos bastidores, PT e esquerda se preparam para Lula fora de 2018
Juristas ligados à legenda avaliam ser difícil que ex-presidente esteja nas urnas e partidos de esquerda já pensam em candidaturas que possam ocupar vácuo
Oficialmente o PT diz que a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é “irreversível” e “irrevogável”. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), afirmou que, mesmo que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) ratifique a condenação do juiz Sergio Moro a nove anos e seis meses meses de prisão, Lula pode recorrer às instâncias superiores. O petista foi considerado culpado de receber propinas da empreiteira OAS e de lavar dinheiro através de um apartamento tríplex no Guarujá, litoral de São Paulo.
Na realidade dos bastidores, no entanto, a percepção de que a Justiça dificilmente permitirá que Lula concorra pela sexta vez à Presidência é cada vez maior. Algumas semanas atrás, um colaborador próximo do ex-presidente chegou a sugerir que, diante da indefinição do cenário, Lula dedique o restante de 2017 para elaborar um bom programa de governo e deixe para o ano que vem a definição sobre o candidato.
O “conselheiro” ponderou outros fatores além do cerco fechado pela Lava Jato, como as incertezas sobre a reforma política e a judicialização da campanha. Mas, segundo pessoas próximas, a reação de Lula foi “extremamente negativa”. O ex-presidente tem aproveitado todas as suas últimas aparições públicas, como o discurso em Curitiba após o último depoimento a Moro e o lançamento da plataforma O Brasil Que o Povo Quer, para que filiados opinem sobre o programa de governo, para ressaltar sua intenção de concorrer ao Planalto.
Na semana passada, em conversa com deputados estaduais do PT, o advogado Pedro Serrano, referência jurídica da esquerda, disse que, embora considere Lula inocente, acredita que o Judiciário sofre forte influência política e, portanto, a probabilidade maior é de que a condenação seja mantida. Ele também lembrou, no entanto, a possibilidade de recursos.
‘Degelo’
A incerteza em relação ao futuro político de Lula faz com que os partidos de centro-esquerda, inclusive tradicionais aliados do PT como PCdoB e PDT, já adotem estratégias para a eleição de 2018 com cenários sem a participação do petista. Se Lula for condenado em segunda instância e não puder concorrer, os antigos aliados do PT não parecem dispostos a se unir. A ideia, nesse caso, será investir na disputa “pulverizada”, com muitos candidatos do mesmo espectro político.
Parceiro histórico do PT, o PCdoB, por exemplo, já se prepara para fechar outras composições eleitorais. O receio do partido é esperar Lula indefinidamente – já que a estratégia do PT consiste em levar a candidatura do ex-presidente até o último recurso jurídico – e depois ficar “a ver navios”.
“Nós já começamos a fazer consultas sobre nomes”, afirmou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que foi ministro do Esporte nos governos comandados por Lula e Dilma Rousseff. “Sem Lula na cédula não tem por que o PC do B apoiar o PT. Na esquerda, vai ser todo mundo igual”, disse o deputado.
Os comunistas abriram negociações com o pré-candidato do PDT, o ex-governador do Ceará Ciro Gomes, que nesta semana também conversará com a direção do PSB. Nada, porém, está fechado. Nos bastidores, tanto integrantes da oposição como aliados do presidente Michel Temer (PMDB) dizem que muitos lances para 2018 estão congelados, à espera da definição sobre Lula, que lidera as pesquisas de intenção de voto.
“Mas nós começamos o degelo”, disse Silva, que não exclui a possibilidade de o PCdoB lançar candidato próprio à sucessão de Temer. “O desgaste com a política é tão grande que os partidos serão chamados a se posicionar. A tendência é de que a eleição de 2018 seja pulverizada, como a de 1989”. Naquele ano, 22 candidatos disputaram o Planalto e o eleito foi Fernando Collor, que disputou o pleito pelo nanico PRN e venceu Lula no segundo turno.
Nordeste
O PDT, outro aliado histórico do PT, faz os cálculos para 2018 contando que Lula será barrado pela Justiça. “É mais do que legítimo o PT manter a candidatura de Lula, mas penso que ele não será candidato”, disse o presidente da sigla, Carlos Lupi. O partido aposta na candidatura de Ciro independentemente de Lula ser candidato.
No entanto, segundo Lupi, caso o petista fique fora da disputa, Ciro pode crescer nos redutos petistas. “É pouco provável que o PT venha a nos apoiar, por isso não muda muito para o PDT, mas, sem Lula, Ciro passa a ter um potencial de crescimento grande no Nordeste”, disse. Com base na avaliação de que o petista será impedido, o PDT tenta entabular conversas com PC do B, PSB e com o próprio PT a fim de ampliar o leque de alianças em torno de Ciro.
Aliados do PT no passado, o socialistas, que tiveram Eduardo Campos e Marina Silva como candidatos em 2014, se preparam para tentar novamente outros voos. “Precisamos pesar, porém, se a candidatura própria vai nos ajudar em relação aos palanques estaduais. A hora é de aguardar um cenário de menos incertezas. Não podemos excluir ninguém antes de falar com as forças políticas”, disse Carlos Siqueira, presidente do PSB.
O socialista disse já ter conversado com o governador de São Paulo Geraldo Alckmin, que deseja concorrer ao Planalto pelo PSDB. O atual vice-governador paulista, Márcio França, é da legenda e, segundo Siqueira, será candidato ao Bandeirantes em 2018.
Ciro também está na mira do PSB, tanto que um encontro com ele foi marcado para esta semana. “Além disso, a direção do PT pediu reunião conosco e ainda vamos falar com a Marina Silva (Rede)”, afirmou Siqueira, que também vê semelhanças entre o próximo pleito e o de 28 anos atrás.
Boulos e Marina
Principal adversário do PT no campo mais à esquerda, o PSOL desde o primeiro momento trabalha para ter candidatura própria, sem perspectivas de alianças, mas avalia que, caso Lula não seja candidato, tem chances de ampliar as alianças atraindo partidos e grupos que hoje circulam na órbita petista. O nome do PSOL hoje para 2018 é o do deputado Chico Alencar (RJ), que ainda não definiu se aceita a empreitada.
Sem o petista na disputa, o partido espera filiar o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, e lançá-lo candidato ao Planalto. Boulos, que já admitiu em entrevistas a possibilidade de disputar eleições, faz mistério sobre o futuro. Aliados especulam que, com Lula, Boulos se candidataria a deputado federal.
Para a direção da legenda, a eventual ausência do petista pode acelerar uma reorganização da esquerda, com a deserção de setores do PT, ainda para 2018. “Mas é claro que quanto mais tarde acontecer esta definição mais difícil fica”, disse o presidente da Fundação Lauro Campos, Juliano Medeiros.
A Rede, da ex-ministra Marina Silva diz que a possível ausência de Lula em 2018 não interfere nos planos do partido. No entanto, aliados de Marina admitem que ela pode herdar votos do petista. “Não estamos traçando duas estratégias”, disse o coordenador nacional Bazileu Margarido. Para ele, porém, caso Lula seja barrado, o cenário muda. “Se Lula não for candidato, todo mundo vai se mexer”, avaliou Bazileu.
(Com Estadão Conteúdo)