Na guerra dos gastos, Haddad corta com uma mão e Lula libera com a outra
Ministro anuncia meta ambiciosa de redução de despesas com benefícios sociais, enquanto presidente avaliza medidas para turbinar distribuição de gás
Desde o início do terceiro mandato de Lula, há dúvida sobre o grau de compromisso do governo com o equilíbrio das contas públicas porque a gestão petista é ambígua em relação ao tema — e os dois principais responsáveis pela questão, o presidente da República e o ministro da Fazenda, nem sempre falam a mesma língua.
Entusiasta do mantra segundo o qual “gasto é vida”, Lula até avalizou a meta de déficit zero em 2024, mas sempre que pode lembra que não aceitará um ajuste fiscal que comprometa obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ou investimentos em programas sociais. Apoiada pelo PT, essa pressão já surtiu efeito e levou Fernando Haddad a abrandar as metas fiscais de 2025 e 2026.
Corta ou gasta?
Com o objetivo de cumprir a meta fiscal de 2025, o ministro da Fazenda anunciou um plano de revisão de gastos destinado a cortar 25,9 bilhões de reais em despesas no próximo ano. Uma das prioridades será passar um pente-fino num dos principais benefícios previdenciários, o BPC, que é pago a pessoas com mais de 65 anos ou com deficiência.
“No governo anterior, tivemos fraudes não só no Bolsa Família. Temos que averiguar, porque é grande a possibilidade de fraude no BPC, no seguro-defeso e no benefício para trabalhadores rurais. Estamos tratando de dinheiro público. Combater a fraude é importante não como estratégia de equilíbrio fiscal, mas para que o próprio país tenha eficiência em suas políticas sociais”, declarou a VEJA o ministro de Desenvolvimento Social, Wellington Dias.
Dias depois do anúncio de Haddad, feito com todos os cuidados para não soar como corte de gasto na área social, mas como combate a irregularidades e desperdícios, Lula anunciou mais uma bondade bancada pelos cofres públicos: um projeto destinado a turbinar o programa Auxílio Gás, cujo desembolso passará de 3,4 bilhões de reais este ano para 13,6 bilhões em 2026, quando o presidente terá o direito de disputar a reeleição.
Apesar de assinar o projeto junto com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, Haddad tentou frear a iniciativa, mas não conseguiu. “O Brasil tem um presidente da República, o Brasil tem quem decide, e o nome dele é Lula. O mercado dizer que o ministro da Fazenda é quem tem de decidir a política econômica do país, me desculpe, é errado”, diz Silveira em entrevista às Páginas Amarelas da nova edição de VEJA. A mão que corta, no fim das contas, obedece à que libera.