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Mandetta: “Os governantes estão desistindo de salvar vidas”

O ex-ministro da Saúde relembra os principais atritos com o presidente e lamenta que suas previsões mais sombrias estejam se confirmando

Por Roberta Paduan Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h59 - Publicado em 10 jul 2020, 06h00

Na últimas semanas, Luiz Henrique Mandetta vem dando os arremates finais em um livro em que contará sua experiência no Ministério da Saúde (a obra deve ser lançada no segundo semestre). Na entrevista a seguir, Mandetta relembra os principais atritos com o presidente e lamenta que suas previsões mais sombrias estejam se confirmando.

Por que acha que o presidente não mudou o discurso negacionista? Comigo ele tinha uma situação de recusa, não queria ouvir, não queria saber. Fechou-se no mantra de “preciso cuidar da economia”. Tinha de ter entendido a gravidade do caso.

No governo, o senhor fez previsões de que chegaríamos em julho a 60 000 mortes, como acabou acontecendo. Tudo foi dito ao presidente, mas ele começou a se assessorar de pessoas externas, que falavam exatamente o que ele queria ouvir. Teve um ex-deputado que falou que seriam 1 000 óbitos.

Essa é uma referência ao Osmar Terra? É, o Osmar era quem mais capitaneava essa tese. Lembro de dizer que quem fizesse previsão dessa doença com base em outras epidemias iria quebrar a cara. E quebrou.

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O que poderia ter sido feito de diferente? No início, tínhamos de fazer aquele “segura todo mundo” para aumentar a capacidade do sistema de atendimento. Se tivéssemos atravessado abril e parte de maio segurando bem o Brasil inteiro, todo mundo falando a mesma língua, seria diferente. Mas o que a gente viu foi o governo federal se retirar do assunto, largando governadores e prefeitos a reboque do vírus. Ficamos à deriva.

As flexibilizações das quarentenas estão ocorrendo na hora certa? Os governantes estão desistindo de salvar vidas. Não estou vendo flexibilização com critério. E tem gente falando em liberar comércio e liberar academia nessa situação. Isso só vai aumentar a fila da desassistência. As cenas de bares lotados no Rio são lamentáveis.

Ninguém está fazendo direito essa liberação? São Paulo está fazendo uma coisa muito técnica. Abrem um pouco e param, medem para ver se a epidemia está voltando. São Paulo não está tendo mortes por desassistência e está gradativamente dando seus passos, o que é louvável.

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O que espera para o segundo semestre? Depois de setembro teremos brotes epidêmicos, que são pequenos surtos em determinadas localidades, sem alcance tão largo como esse primeiro. Vamos assim até o dia em que tivermos uma vacina.

Está otimista com a possibilidade de uma vacina no curto prazo? Acredito que no primeiro semestre do ano que vem teremos uma vacina em escala global. No começo, para os públicos-alvo, mais vulneráveis às formas mais graves da doença, até o momento em que a gente tenha condições de vacinar todo mundo.

O senhor foi demitido do governo com a popularidade em alta e já apareceu bem posicionado em uma pesquisa para a eleição presidencial de 2022. Vai se candidatar? Minha geração é marcada por desafios, mas precisamos trabalhar um conceito anterior à escolha de um candidato. Hoje, o PT vive do Bolsonaro, enquanto o Bolsonaro vive do PT. Parece até jogo combinado, e aí eles fazem seus cercadinhos de votos, vão para o segundo turno e nos deixam, nós que somos pessoas mais do diálogo, presos numa situação em que somos obrigados a votar no menos pior. Temos nomes que podem chegar com boas condições para concorrer à Presidência em 2022. O Sergio Moro, por exemplo, é um deles. Mas ainda não é hora de discutir esses nomes.

Publicado em VEJA de 15 de julho de 2020, edição nº 2695

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