Gleisi Hoffmann e Marina Silva desafiam o pragmatismo de Lula
Deputada e ministra insistem em bandeiras de campanha que o presidente não parece disposto a empunhar

Principal líder do maior partido de esquerda do país, Lula sempre foi pragmático e conciliador de interesses diversos no exercício da Presidência. Esse perfil, que caracterizou seus governos anteriores, continua sendo a tônica em seu terceiro mandato, até porque ele venceu a última disputa eleitoral apoiado por uma frente ampla e depende dos votos dos parlamentares do Centrão para aprovar projetos da agenda econômica.
Elogiado pelos políticos em geral, esse pragmatismo está na origem de boa parte das tensões de Lula com aliados históricos, que insistem em defender bandeiras que são caras à esquerda, mas que não contam com o entusiasmo do presidente. Em pouco mais de oito meses da nova gestão, tornaram-se frequentes, por exemplo, os embates sobre pontos da política econômica entre a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, cujas decisões são chanceladas pelo chefe.
Nos últimos dias, Haddad defendeu a manutenção da meta de zerar o déficit em 2024, igualando o total de receitas e de despesas, sem contar o pagamento de juros da dívida. Como a meta é de difícil execução e dependerá de um aumento de arrecadação de 168 bilhões de reais, Gleisi e outros ministros petistas passaram a pressionar Haddad a suavizá-la desde já, sob a alegação de que o governo poderá ser obrigado a cortar verbas e prejudicar projetos a fim de alcançar o objetivo traçado. Apesar de saber do tamanho do desafio, Haddad — com o aval de Lula — não recuou, até porque isso representaria a primeira desmoralização do recém-aprovado arcabouço fiscal.
No Planalto, costuma-se dizer que Gleisi joga para a plateia petista e não tem tanta influência sobre Lula como pensa ter. A deputada não é a única a desafiar o presidente. Em linha com a promessa de campanha de dar prioridade à defesa do meio ambiente, a ministra Marina Silva, referência internacional na área, e o Ibama são contrários à exploração de petróleo na Foz do Amazonas, enquanto a Petrobras e o Ministério de Minas e Energia são favoráveis ao projeto.
A decisão final, como ocorre em todos os casos, será de Lula — e o presidente dá sinais de que comprará mais uma vez briga com a ministra. Numa entrevista recente, ele disse que continua sonhando com a exploração de petróleo na chamada margem equatorial, que renderia dividendos financeiros à população. Com Jair Bolsonaro enrolado na Justiça e a iminente adesão do Centrão ao governo, as contestações ao pragmatismo de Lula devem ficar cada vez mais restritas a alguns de seus companheiros de esquerda.