Entenda o que a PF concluiu contra Temer e o ‘quadrilhão do PMDB’
No relatório final de inquérito, investigadores apontam que grupo de ex-deputados e deputados do partido cometeu crime de organização criminosa
A Polícia Federal concluiu na segunda-feira o inquérito que investiga o chamado “quadrilhão” do PMDB da Câmara. Em relatório encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), os investigadores sustentam que deputados e ex-deputados do partido cometeram o crime de organização criminosa e, a partir dele, incorreram nos delitos de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, fraude em licitação e evasão de divisas, entre outros.
Segundo a PF, o “poder de decisão” no grupo, ou seja, de indicar cargos estratégicos na máquina federal e negociar propina, cabia ao presidente Michel Temer e ao ex-deputado federal e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, preso em Curitiba. Também são citados na conclusão da investigação os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) e os ex-ministros Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves.
A conclusão do inquérito deve ser um dos elementos para subsidiar nova denúncia contra Temer, a ser apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ainda nesta semana – ele entrega o cargo na segunda-feira a Raquel Dodge.
Veja abaixo a estrutura da organização criminosa que PF diz existir no PMDB da Câmara e o que há contra cada um dos investigados.
Michel Temer: segundo a PF, tinha “poder de decisão” no PMDB da Câmara e, em razão disso, recebeu 31,5 milhões de reais em propina dos esquemas de corrupção do grupo. Valor se divide entre os 500.000 reais entregues ao ex-assessor presidencial Rodrigo Rocha Loures por um executivo da JBS, os 10 milhões de reais que a Odebrecht teria pago ao PMDB a pedido de Temer em 2014, 20 milhões de reais referentes ao contrato PAC SMS da diretoria Internacional da Petrobras e 1 milhão de reais que teria sido entregue ao coronel aposentado da Polícia Militar João Baptista Lima Filho, amigo de longa data de Temer.
Eliseu Padilha: apontado pela PF como “longa manus” de Michel Temer na captação de propinas de empresas, teria recebido 4 milhões de reais da Odebrecht. O dinheiro seria parte dos 10 milhões de reais destinados pela empreiteira ao grupo político do presidente nas eleições de 2014. Os 6 milhões de reais restantes foram empregados na campanha de Paulo Skaf ao governo de São Paulo em 2014.
Moreira Franco: atuava na cobrança de propinas ao lado de Padilha, conforme a PF. Enquanto secretário da Aviação Civil do governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), Moreira Franco teria viabilizado repasses de 5 milhões de reais da OAS à campanha de Temer em 2014 e de 4 milhões da Odebrecht, referentes à concessão de aeroportos.
Geddel Vieira Lima: também classificado pela PF como “longa manus” de Temer no recebimento de recursos ilícitos de empreiteiras, teve R$ 51 milhões em dinheiro vivo apreendidos em um apartamento em Salvador. Réu em um processo decorrente da Operação Cui Bono?, que investiga corrupção na Caixa Econômica Federal, Geddel está preso em Brasília desde a semana passada.
Eduardo Cunha: conforme a PF, o ex-deputado federal era, ao lado de Temer, líder da organização criminosa do PMDB da Câmara. Cunha mantinha indicados em cargos estratégicos à arrecadação de propinas, a exemplo de vice-presidências da Caixa e secretarias do Ministério da Agricultura, e cobrava propina de empresários. Já condenado na Lava Jato a 15 anos e 4 meses de prisão, o ex-presidente da Câmara está preso em Curitiba desde setembro de 2016.
Lúcio Funaro: próximo a Cunha, o doleiro intermediava dinheiro sujo ao grupo do PMDB da Câmara. Preso em Brasília desde julho do ano passado, Funaro fechou um acordo de delação com a Procuradoria-Geral da República (PGR), na qual afirma que Temer recebeu propina e cobrou doações ilegais para campanhas de aliados. O operador também distribuía valores oriundos da corrupção na Caixa. Apenas Geddel Vieira Lima teria recebido cerca de 30 milhões de reais do esquema, segundo Funaro.
Fábio Cleto: atuava ao lado de Cunha e Funaro no esquema de corrupção na Caixa. Como vice-presidente de fundos de governo e loterias do banco estatal, Cleto participava das reuniões que decidiam quais empresas receberiam dinheiro do Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS). Ele fornecia as informações ao deputado e ao doleiro, que procuravam empresários e cobravam propina em troca da liberação dos investimentos.
Rodrigo Rocha Loures: indicado por Temer como interlocutor junto à JBS, o ex-assessor presidencial e ex-deputado federal foi flagrado pela PF recebendo uma mala com 500.000 reais em dinheiro vivo de um executivo da empresa. Rocha Loures foi preso na Operação Patmos e denunciado pela Procuradoria-Geral da República, ao lado de Temer, por corrupção passiva.
José Yunes: amigo de longa data de Temer, o advogado e ex-assessor presidencial recebeu em seu escritório, em São Paulo, parte dos 4 milhões de reais pagos a Eliseu Padilha pela Odebrecht. José Yunes diz ter sido “mula” do ministro, que, conforme a versão de Yunes, pediu para que um “documento” pudesse ser entregue no endereço e, depois, fosse retirado por outra pessoa. Quem deixou o pacote no escritório foi Lúcio Funaro.
Henrique Alves: o ex-presidente da Câmara e ex-ministro está preso desde junho na Operação Manus, que apura corrupção na construção da Arena das Dunas, em Natal. Ele é réu pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por supostamente ter dividido com Eduardo Cunha 11,5 milhões de reais em propina referentes à obra. Alves também está no banco dos réus ao lado de Cunha em uma ação penal por propinas no FI-FGTS.
Antônio Andrade: Lúcio Funaro afirma em sua delação premiada que Andrade, indicado por Temer ao Ministério da Agricultura do governo Dilma, pediu e recebeu 25 milhões de reais para favorecer as empresas do grupo JBS em 2014. O vice-governador mineiro também teria dividido com Temer e Cunha um repasse de 7 milhões de reais da empresa, operacionalizado por Funaro.
Tadeu Filippelli: ex-assessor presidencial e ex-vice-governador do Distrito Federal, foi preso na Operação Panatenaico, que investiga um suposto esquema de corrupção que desviou dinheiro da obra do estádio Mané Garrincha, em Brasília.
Sandro Mabel: PF cita suposto favorecimento do ex-deputado federal e ex-assessor presidencial em favor da empreiteira OAS em duas medidas provisórias no Congresso, além de suposto repasse de 10 milhões de reais de Funaro a Mabel, a pedido de Cunha.
Defesa
Em relação às conclusões que a PF enviou ao STF nesta segunda, a Secretaria de Imprensa da Presidência da República afirmou em nota que o “presidente Michel Temer não participou e nem participa de nenhuma quadrilha” ou de qualquer “estrutura com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagens indevidas em órgãos da administração pública”. “O presidente Temer lamenta que insinuações descabidas, com intuito de tentar denegrir a honra e a imagem pública, sejam vazadas à imprensa antes da devida apreciação pela Justiça.”
Também por meio de nota, “o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, informa que só irá se pronunciar quando e se houver acusação formal contra ele que mereça resposta”.
Moreira Franco também negou as acusações. “Jamais participei de qualquer grupo para a prática do ilícito. Repudio a suspeita. Responderei de forma conclusiva quando tiver acesso ao relatório do inquérito. Lamento que tenha que falar sobre o que ainda não conheço. Isto não é democrático.”
A defesa de Eduardo Cunha “nega de forma veemente todas as acusações e prestará os devidos esclarecimentos oportunamente.”