Embaixador critica substituição da presidência do Banco dos Brics
Graça Lima vê políticas revogacionistas como um desrespeito à diplomacia. Lula quer indicar Dilma Rousseff para o cargo
O embaixador aposentado José Alfredo Graça Lima dedicou a maior parte de seus mais de 50 anos de carreira à diplomacia comercial. Entre 2014 e 2016, no governo Dilma, ocupou a função de subsecretário geral para Ásia e Pacífico e entre as suas atribuições estava a coordenação das ações para a representação brasileira entre os países membros do Brics, bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Na semana passada, Lula confirmou sua intenção de indicar a ex-presidente Dilma para comandar o Novo Banco de Desenvolvimento, o chamado Bancos dos Brics. Em entrevista a VEJA, o embaixador classificou como equivocada a forma como o governo está conduzindo o assunto. Atualmente, a instituição financeira é comandada pelo diplomata Marcos Troyjo, que foi indicado durante o governo Bolsonaro e tem mandato até 2025:
Sobre a possível saída do presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), Marcos Troyjo, antes do fim de seu mandato, qual a sua avaliação? O Marcos foi eleito para exercer essa função até 2025. A saída dele é um caso inédito, como outros ineditismos que estão ocorrendo em designações para determinados postos. O Executivo como poder constituído tem essa prerrogativa de fazer nomeações, mas é preciso o mínimo cuidado para não gerar suscetibilidades. Essas mudanças revogacionistas são diferentes da maneira como se deve atuar para construção de políticas de sucesso.
Quais as características que o presidente do banco deve possuir? Eu não conheço a “job description” para o presidente do NBD, mas o que posso dizer é que ele é escolhido entre brasileiros que tenham um conhecimento específico do funcionamento de um banco de desenvolvimento. Não requer uma especialização. Trata-se de uma estação política e é politicamente que as coisas estão se decidindo.
Sob o ponto de vista diplomático, é prudente uma troca assim? É uma certa violência, pois se interrompe um mandato. Ele tem um mandato até 2025 e só pelo fato de ter sido indicado pelo governo anterior não denota a razão para ter que deixar a função. Ao meu juízo, não é correto.
Sobre a indicação da presidente Dilma… Eu era secretário para Ásia e Pacífico justamente na época da presidência da Dilma. Eu era subordinado ao Mauro Vieira, ministro na época. A presidente Dilma tratava de Brics nas reuniões de cúpula que ocorreram e eu estava presente. Trabalhei, especificamente, em Fortaleza, no Ceará, e depois na Rússia. Quanto a atuação dela não tenho o que falar. Na época, quem se ocupava dos assuntos do banco era o ministro da Fazenda, Guido Mantega, incluindo as tratativas para criação do NBD, em 2014, no encontro em Fortaleza. Lembro que se falava da necessidade de um nível técnico.
O senhor acha que ela reúne as qualidades necessárias? Eu não vou ser injusto, até por ela ter sido presidente e ter tratado de Brics em seu mandato. Ela era a presidente na época da reunião em Fortaleza. Então, não posso dizer que não esteja habilitada. A questão está na substituição de um ex-diplomata, secretário de Comércio do Paulo Guedes, por uma indicação política. Temos que atentar que depois de 2025 a presidência passa para outro país. Então se quiserem que a Dilma vá, é preciso que seja agora porque a presidência é rotativa e não será mais do Brasil depois disso.