Decisão de Toffoli agrava situação de Witzel na Alerj por impeachment
Paralisação dos trabalhos de comissão que analisa afastamento de governador do Rio deixou deputados ainda mais irritados
A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, que paralisou o processo de impeachment na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), agravou a situação política do governador Wilson Witzel (PSC), alvo de denúncias de corrupção na área da Saúde. Parlamentares ouvidos por VEJA afirmaram que recorrerão na próxima segunda-feira, quando termina o recesso Judiciário, contra a dissolução da comissão especial responsável pelo rito de afastamento ou não de Witzel. A estratégia é fazer com que o caso retorne às mãos do ministro Luiz Fux, relator original do pedido de Witzel para suspender a tentativa de destituí-lo do cargo. No entanto, deputados revelaram que só vão esperar cinco dias para Fux analisar a ação. Segundo eles, se o magistrado não se manifestar até o fim da semana que vem, uma nova comissão será criada imediatamente para não perder mais tempo.
O clima na Alerj é de revolta com a paralisação dos trabalhos. Nesta quinta-feira, 30, terminaria o prazo para Wilson Witzel apresentar sua defesa. Em seguida, a Alerj teria mais cinco sessões para concluir o relatório final antes de ir à votação no plenário. Dos 70 deputados, 69 apoiaram a abertura do impeachment. Uma comissão, então, foi criada com 25 representantes de todos os partidos políticos. O governador, porém, argumentou no STF que o critério de proporcionalidade da representação de cada legenda não obedeceu a lei federal que trata do assunto. Mesmo com a vitória parcial de Witzel no Supremo, parlamentares acreditam que a relação com o governador se agrava.
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Clique e Assine“Todo o nosso trabalho está nulo temporariamente. O sentimento é de indignação. Recorremos da decisão do Toffoli porque poderiam dizer que algo, realmente, estava errado no processo. Por isso, recorremos. Só que, se o Fux demorar muito, vamos criar logo a nova comissão”, ressaltou o deputado Rodrigo Bacellar (Solidariedade), então relator da comissão especial interrompida pelo presidente do STF. “É um direito do Witzel procurar o Judiciário. Mas acho difícil alguma coisa mudar”, disse o presidente da Alerj, André Ceciliano (PT). Nos bastidores, a tendência até o momento é de que o impeachment seja aprovado.
Autor do requerimento do pedido de afastamento de Witzel, o deputado Luiz Paulo (PSDB) criticou Toffoli: “Ele atrapalhou o andamento. Faltavam apenas três sessões para acabar o prazo da defesa do governador e o presidente do STF decidiu alterar uma regra que não é relevante. A comissão de 25 deputados é ampla e atende ao artigo 19 da lei federal 1.079/50 (Lei do Impeachment)”, afirmou. “O tempo fala contra o governador. A cada dia que passa aparecem mais fatos novos (de corrupção). Se ele acredita que vai se fortalecer, é exatamente ao contrário”, completou o tucano.
Para salvar o mandato, Witzel escalou o ex-deputado federal André Moura, ex- líder do governo Michel Temer no Congresso e amigo do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB), em prisão domiciliar na Operação Lava Jato. Moura havia sido demitido, em 28 de maio, pelo governador por pressão do advogado Lucas Tristão, então homem forte no Palácio Guanabara e ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, Energia e Relações Internacionais. À época, Moura tinha bom trânsito na Alerj. A exoneração acirrou os ânimos. No auge da crise, André Ceciliano acusou Tristão de fazer escutas telefônicas ilegais e produzir dossiês contra parlamentares. Acuado com a ameaça de impeachment, Witzel também acabou demitindo Tristão.
“É um gesto tardio”, avaliou o deputado Léo Vieira (PSC), ex-vice-líder de Wilson Witzel na Alerj, sobre o retorno de André Moura. “Dos 69 parlamentares que votaram contrários ao governador, 12, no máximo, podem mudar de lado, o que não será suficiente. A Alerj está tranquila e bem posicionada. Ele ganhou tempo, mas nada muda”, disse Vieira. Outro membro da comissão, Márcio Canella (MDB), fez coro: “Pode até atrasar o processo de impeachment. A situação do Witzel na Alerj fica pior”.
Witzel deu carta-branca a André Moura. Antes de voltar à cena, o novo chefe da Casa Civil mandou demitir Cleiton Rodrigues, secretário de Governo e braço-direito de Witzel, e o coordenador de Comunicação Social, o jornalista Mário Marques. As duas pastas, agora, são comandadas por Moura. “O que ele (André Moura) conhece do Rio? O que ele sabe sobre as origens dos 70 deputados? Se o governador até agora não conseguiu resolver o problema com a Alerj, um secretário conseguirá? Falta credibilidade ao Witzel para conquistar votos a seu favor. A única saída dele é brigar na Justiça”, destacou o deputado Luiz Paulo.
Numa corrida contra o tempo, Witzel tem distribuídos cargos no governo em troca de apoio na Assembleia. “Espero que a decisão do ministro Toffoli seja reformada pela Corte e que os trabalhos da comissão do impeachment possam retomar. Witzel ganha mais prazo para apresentar a defesa e tentar negociar apoio político com deputados. Espero que deputado nenhum negocie sua convicção por cargos ou favores no governo. Espero que todos votem na comissão com base nos fatos e evidências que serão verificados ao longo dos trabalhos”, disse Alexandre Freitas (NOVO), que também integrava a comissão de impeachment.
“Respirar, negociar e governar”
Após o imbróglio Jurídico, a Alerj terá de apresentar um relatório final sobre as denúncias contra Witzel. Só então o documento volta a ser apreciado no plenário, precisando de pelo menos 36 votos a favor para ser aprovado. Caso os deputados confirmem o impeachment após todo esse rito, o governador, inicialmente, ficará afastado por 180 dias. Neste período, será criado uma Comissão Processante, com cinco deputados, cinco desembargadores sorteados e mais o presidente do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), Cláudio de Mello Tavares. Será este grupo que determinará ou não a cassação definitiva de Witzel.
“A decisão do Tofolli é favorável à Alerj porque cria uma segurança jurídica. Com a criação de uma nova comissão de acordo com a proporcionalidade dos partidos, não haverá mais questionamentos. Foi o que aconteceu no processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. A nossa estratégia, claro, é ganhar mais tempo para o governador se defender. Agora, o Witzel poderá respirar, negociar e governar. No Rio, a gente precisa de governabilidade”, declarou Manoel Peixinho, advogado de Witzel.
Witzel assumiu em janeiro de 2019. Ex-juiz federal, ele foi eleito no ano anterior graças ao apoio do clã Bolsonaro. Em menos de dois anos de mandato, houve uma enxurrada de denúncias. Witzel foi alvo da Operação Placebo, ação do Ministério Público Federal e da Polícia federal que vinculou o governador a fraudes na construção de hospitais de campanha para tratamento de pacientes com novo coronavírus. Witzel e a primeira-dama Helena são investigados pela Procuradoria-Geral da república (PGR). A atual gestão também é o centro de duas outras operações: Mercadores do Caos e Favorito, que levou às prisões do empresário Mário Peixoto, principal fornecedor de mão-de-obra terceirizada do governo, e a do ex-secretário de Saúde Edmar Santos, entre outros suspeitos de desviarem dinheiro público em meio à pandemia de Covid-19.