Médica admite que criação do TrateCov partiu de sua secretaria
A plataforma recomendava o uso da cloroquina, sem eficácia comprovada; a secretária Mayra Pinheiro foi a primeira mulher a ser ouvida pela comissão

A secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, prestou depoimento à CPI da Pandemia nesta terça-feira, 25. Conhecida como ‘capitã cloroquina’, a médica foi questionada sobre a aquisição e distribuição do medicamento pela pasta, além de dar explicações sobre uma plataforma desenvolvida pelo ministério, o TrateCov, recomendando o uso do remédio, sem eficácia comprovada, no combate à Covid-19.
O depoimento
Mayra Pinheiro afirmou em seu depoimento que o Ministério da Saúde “nunca indicou tratamentos para a Covid-19”. A secretária argumentou que a pasta criou um documento com sugestão de “doses seguras” para o uso de medicamentos como a cloroquina para os médicos que quisessem receitar o remédio – de acordo com seu “livre arbítrio” e com o consentimento do paciente.
Perguntada se houve ordem do governo para a defesa de fármacos sem comprovação contra a Covid-19, como a cloroquina, ou se o apoio partiu de sua iniciativa pessoal, a médica respondeu que “nunca recebeu ordem” e que o uso dos fármacos “não é uma iniciativa pessoal” sua.
A médica admitiu que o desenvolvimento da plataforma TrateCov, que receitava cloroquina a pacientes com Covid-19, partiu de sua secretaria. Segundo ela, a plataforma nunca foi colocada no ar, tendo sido apresentado um protótipo.
Em resposta a Renan Calheiros (MDB-AL), a secretária disse que a falta de oxigênio em Manaus em janeiro não foi prevista porque os desfecho de agravamento da Covid-19 “são imprevisíveis”. Mayra afirmou ainda que não é competência do Ministério da Saúde o fornecimento de oxigênio, após ser questionada sobre o porquê da pasta não ter previsto falta de oxigênio na capital amazonense. Ainda sobre a crise manauara, a médica salientou que teve conhecimento do desabastecimento de oxigênio em 8 de janeiro. Disse que esteve na cidade até o dia 5 do mesmo mês, mas não foi informada pela secretaria estadual de Saúde sobre a falta do insumo.
Habeas corpus
Mayra conseguiu junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) o direito de permanecer em silêncio se fosse questionada sobre fatos ocorridos entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021, período que coincide com a crise de falta de oxigênio nas UTIs de Manaus.
Ao solicitar ao ministro Ricardo Lewandowski o habeas corpus preventivo, a defesa de Mayra destacou que ela — assim como o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde — responde a ação de improbidade administrativa apresentada pelo Ministério Público Federal no Amazonas. O processo apura as ações e omissões dos governos federal e estadual no colapso do sistema de saúde na capital daquele estado no período entre o final de 2020 e o início deste ano.
Mayra já havia solicitado anteriormente ao STF o direito de permanecer em silêncio na CPI, mas, em sua primeira decisão, o ministro Lewandowski rejeitou a possibilidade de habeas corpus preventivo.
A convocação da secretária para depor na CPI partiu de cinco senadores: Alessandro Vieira (Cidadania-SE), Humberto Costa (PT-PE), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Rogério Carvalho (PT-SE) e o relator, Renan Calheiros (MDB-AL). Eles alegam que Mayra se notabilizou como defensora de um “tratamento precoce” com medicações sem nenhuma comprovação efetiva contra o coronavírus.
Em depoimento à CPI, o ex-ministro Eduardo Pazuello afirmou que a ideia do TrateCov partiu de Mayra Pinheiro, mas o programa nunca chegou a ser lançado oficialmente, pois fora “roubado” e “hackeado” enquanto ainda estava em fase de desenvolvimento. A explicação do ex-ministro não convenceu os senadores Eduardo Braga (MDB-AM), Rogério Carvalho (PT-SE) e Omar Aziz (PSD-AM), presidente da comissão. Eles lembraram que sistema chegou a ser lançado e divulgado em meios de comunicação do governo federal.
Outros depoimentos
Mayra foi a nona testemunha a ser ouvida na CPI, que apura ações e possíveis omissões do governo federal no enfrentamento da crise sanitária, bem como eventual desvio de verbas federais enviadas a estados e municípios. Também já foram ouvidos os ex-ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, o atual titular da pasta, Marcelo Queiroga, o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, o ex-chefe da Secom Fabio Wajngarten, Carlos Murillo, representante da farmacêutica Pfizer, o ex-chanceler Ernesto Araújo e o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
(Com Agência Senado)