Caso Marielle: STF vai decidir se Google tem de quebrar sigilo de usuários
Assassino confesso da vereadora, delator Ronnie Lessa usou a plataforma para buscar endereços de cursos e do ex-marido da vereadora
O Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para julgar a partir do próximo dia 19 se, em investigações penais, o Google é obrigado a entregar às autoridades os nomes de todas as pessoas que pesquisaram na plataforma termos específicos. Com cerca de 6 bilhões de buscas feitas diariamente, a empresa alega que uma espécie de quebra de sigilo em massa é inconstitucional.
O caso não passaria de uma discussão teórica, embora importante, sobre a proteção de dados de usuários de internet não fosse o fato de que a ordem que o Google recebeu era uma das principais apostas de investigadores para se chegar ao mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), ocorrido em março de 2018.
O policial reformado Ronnie Lessa foi preso um ano depois do crime, em março de 2019, e, em um acordo de delação premiada, deu detalhes da execução da parlamentar e apontou o conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro Domingos Brazão e o deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil) como mandantes do homicídio. Marielle e o motorista dela, Anderson Gomes, foram mortos após 14 tiros serem disparos contra o carro em que estavam. Ambos presos, os irmãos Brazão alegam inocência.
O Google passou a ser peça-chave de uma das linhas de investigação do assassinato que chocou o país porque o Ministério Público do Rio de Janeiro pediu uma quebra global de sigilos telemáticos de todas as pessoas que pesquisaram na plataforma, entre os dias 10 e 14 de março de 2018, as expressões “Mariele (sic) Franco”, “Vereadora Mariele”, “Agenda Vereadora Mariele”, “Casa das Pretas”, “Rua dos Inválidos, 122” e “Rua dos Inválidos”. Em uma emboscada, a vereadora foi morta depois de deixar a Casa das Pretas, localizada na Rua dos Inválidos, no bairro da Lapa, no Rio.
O que Ronnie Lessa pesquisou sobre Marielle?
Investigadores fecharam o cerco contra Ronnie Lessa depois que a Polícia Civil do Rio descobriu que o ex-PM utilizou a plataforma para levantar informações sobre a vereadora e a rotina dela. Pouco menos de duas semanas antes do crime, por exemplo, Lessa usou o Google para tentar encontrar o endereço do curso de inglês de Marielle. Oito dias antes do homicídio, nova busca, desta vez sobre os campi da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde a vereadora frequentava.
Na sequência, novo acesso para tentar encontrar o curso de inglês e, dois dias antes do assassinato, pesquisas sobre o endereço do ex-marido da vítima. Na manhã deste último dia, Marielle Franco havia estado no endereço pesquisado, o que reforçou entre os policiais a convicção de que a vereadora já estava sendo seguida por seu futuro assassino.
No recurso a ser analisado pelo STF, o Google afirma, entre outras alegações, que a quebra de sigilo telemático de um número indeterminado de pessoas é genérica, o que abriria espaço para que houvesse o levantamento de sigilo contra qualquer pessoa que tenha pesquisado determinado tema, além de expor usuários da plataforma que não têm nenhuma relação com o crime.