Bolsonarista responsável por bomba em aeroporto é solto e ganha rede de acolhimento
George Washington cumpre pena em regime domiciliar dois anos após ser mentor de um atentado em Brasília. Homem ganhou emprego e moradia na capital

Dois anos e cinco meses após ser o mentor de um ataque a bomba no aeroporto de Brasília como protesto às eleições de 2022, o bolsonarista George Washington de Sousa já está praticamente livre de todas as imputações que lhe foram dadas.
Gerente de um posto de combustível, ele foi condenado em 2023 a nove anos e oito meses de prisão pelos crimes de explosão e porte ilegal de arma. No entanto, uma sequência de decisões judiciais e uma surpreendente rede de acolhimento na capital federal permitem que George Washington praticamente leve uma vida como qualquer cidadão comum.
Ele foi preso na noite do dia 24 de dezembro de 2022, após confessar ter confeccionado uma bomba que foi acoplada a um caminhão-tanque com 60 mil litros de querosene nas imediações do aeroporto. O detonador do artefato chegou a ser acionado, mas a bomba não explodiu. Segundo os investigadores, se o plano tivesse dado certo, a chance de haver vítimas fatais era altíssima.
Ao ser interrogado pelos policiais, o homem disse estar “preparado para a guerra” e pronto “para matar ou morrer”. George Washington se declarou apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro e afirmou ter como objetivo “aguardar o acionamento das Forças Armadas para pegar em armas e derrubar o comunismo”.
No carro e no apartamento de George Washington foi encontrado um arsenal de guerra. Além de bombas similares às encontradas no caminhão, havia fuzis, escopetas, pistolas, facas e munições de diversos calibres. Morador de Xinguara, no Pará, ele foi a Brasília em novembro de 2022 e era frequentador do acampamento em frente ao Quartel-General do Exército. Em abril de 2024, o caso foi encaminhado por prevenção ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, relator do processo que investiga uma tentativa de golpe no país.
Viagem, trabalho e moradia
Preso inicialmente em regime fechado, George Washington se empenhou em obter uma progressão célere de regime. Fez cursos de direção defensiva, logística de transporte e auxiliar de oficina mecânica, além de ter se dedicado à leitura de Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Com isso, abateu quase dois meses da pena.
Em maio de 2024, ele conseguiu migrar para o regime semiaberto e obteve o direito de trabalhar fora da cadeia. No mês seguinte, ele também conseguiu o benefício das saídas temporárias. Por ter passado todo esse período sem receber visitas na cadeia, já que dizia não conhecer ninguém na capital federal, ele teve de dar um endereço fixo para garantir os saidões.
Curiosamente, uma mulher de 74 anos que alegou não conhecer George Washington se dispôs a abrigá-lo em sua casa, localizada na cidade de Candangolândia, a 20 quilômetros do centro de Brasília.
O convite causou estranhamento aos juízes e procuradores que acompanham o caso, e uma equipe psicossocial conversou com ela. Por telefone, a aposentada contou que eles apenas se conheciam por redes sociais e por amigos em comum – um desses amigos pediu o acolhimento ao presidiário.
Ao relatar o diálogo, a Justiça afirmou que a aposentada, “embora não conheça pessoalmente o sentenciado, aceita recebê-lo em sua casa, embora não saiba informar nada acerca de sua vida, tais como: estado civil, escolaridade, onde nasceu, com o que trabalha, se faz ou não uso de bebidas alcoólicas ou de drogas, se tem filhos, ou seja, não tem informações acerca do sentenciado”.
“Cumpre-nos informar que em análise processual, esta equipe observou que o delito se refere à explosão e posse de explosivos. Diante do exposto, a Sra confirmou o interesse e disponibilidade em receber o sentenciado no endereço mencionado”, afirma o relatório técnico ao qual VEJA teve acesso.
Em outubro de 2024, George Washington também ganhou uma proposta de emprego. A dona de um laboratório médico lhe ofereceu a função de auxiliar administrativo – entre as atribuições, estaria a de organizar e transportar amostras para exames.
Ao justificar a oferta, a empresária disse que o objetivo era ajudar o retorno de George Washington ao convívio social e ressaltou que a empresa estaria engajada na ressocialização de presos. Com oito funcionários, o homem que planejou o ataque a bomba seria o primeiro contratado nesta condição.
Já em dezembro de 2024, um decreto editado pelo presidente Lula, destinado a indultar e reduzir as penas, alcançou George Washington. Ele não conseguiu obter o perdão total, mas teve mais de um ano da pena reduzida. Com a margem, a defesa alegou que havia uma superlotação no presídio e que o detento já se enquadrava nas condições de obter a concessão antecipada do regime aberto.
O pedido foi concedido pela Justiça. Como não há no Distrito Federal estabelecimentos específicos para este regime, a prisão domiciliar foi autorizada a George Washington em fevereiro deste ano. Ele segue morando na casa da aposentada que até então não o conhecia e lhe foi dispensado o uso da tornozeleira eletrônica.
Na próxima segunda-feira, 2, George Washington fará a sua primeira viagem desde o fatídico episódio da bomba. A Justiça acatou um pedido para que ele passe duas semanas em Belém, no Pará, para tratar de assuntos profissionais.