Auxiliar de Dilma não esquece: Procurador anti-Moro no TCU sonhava com STF
Lucas Furtado é autor de uma representação que tenta esquadrinhar a vida financeira do ex-juiz da Lava-Jato e, no limite, bloquear os bens do presidenciável
Ao longo de mais de uma década, o atual subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) Lucas Furtado ocupou o degrau mais alto da hierarquia da Corte, indicado pelo ex-presidente Fernando Henrique (PSDB) e mantido pelos sucessores Lula e Dilma (PT). Em dez anos de governos petistas, Furtado se aproximou de próceres do partido, como a então todo-poderosa Erenice Guerra, ex-braço direito de Dilma e ex-chefe da Casa Civil, e, conforme publicou VEJA, em pelo menos uma ocasião a consultou previamente sobre os rumos e a “conveniência” de uma investigação. VEJA revela agora um novo e-mail que evidencia que Erenice sabia dos objetivos maiores do procurador – ser indicado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo PT – e até sondou sobre quando uma próxima vaga estaria disponível.
Uma troca de mensagens eletrônicas apreendida pela Polícia Federal nos computadores de Erenice mostra uma conversa entre a auxiliar de Dilma Rousseff e o então advogado da Petrobras junto ao TCU, Claudismar Zupiroli. O diálogo data de 8 de janeiro de 2007, meses antes de o Supremo analisar se aceitaria ou não a denúncia contra 40 políticos e empresários enredados no mensalão, na época o maior escândalo político envolvendo o PT. O ministro Sepúlveda Pertence, que mantém laços históricos com o partido, pretendia se aposentar antecipadamente e não participaria do julgamento dos mensaleiros. Era a vaga dele que estava em jogo quando Erenice e Zupiroli falam sobre Lucas Furtado.
No e-mail, o advogado Zupiroli sugere a Erenice Guerra a nomeação de Edson Fachin – que só se tornaria ministro do Supremo de fato mais de oito ano depois – e relata a ela que o jurista tinha apoios no meio jurídico para conquistar a indicação. “Continua vivo o movimento pela indicação do Fachin para o STF”, escreveu Zupiroli. “Acho que faria muito bem ao STF, aos brasileiros e honraria a sucessão do Pertence”. Uma semana depois, em 15 de janeiro de 2007, a auxiliar de Dilma abre o jogo sobre a importância de se lembrar de Lucas Furtado como um “supremável”. “Quanto ao STF, quando abre outra vaga? Você sabe que o Lucas é também eterno candidato. E temos dívidas com ele”, respondeu Erenice Guerra.
O cargo de procurador-geral do MP no TCU, ocupado por Lucas Furtado na época da conversa, é um natural trampolim para um candidato ser indicado ministro do tribunal ou mesmo para o STF. VEJA ouviu de um ministro da Corte de Contas e de um colega do atual subprocurador que ele nunca escondeu seu desejo de chegar a uma cadeira no Supremo – de fato uma aspiração legítima. O problema, insinuam servidores mais antigos do TCU, é que ele orientava o governo sobre como se livrar das amarras da Corte de Contas supostamente em busca de apoio político que o levasse a uma indicação à Suprema Corte.
Em outro e-mail de Zupiroli a Erenice, o advogado demonstra ter conhecimento da ‘dívida’ que o governo do PT tem com o subprocurador. “Pois é, tenho consciência da ‘dívida’. Mas, toda vez que vejo os sucessores dele no MP, fico em dúvida…”, escreveu Zupiroli.
Há dez dias, VEJA publicou reportagem sobre um e-mail, apreendido pela Polícia Federal durante investigações de tráfico de influência de Erenice na Casa Civil, em que Furtado a questiona sobre a conveniência ou não de pedir explicações ao governo em um parecer que pretendia apresentar. Tratava-se no caso de uma investigação sobre a legalidade do contingenciamento de recursos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Furtado enviou uma mensagem a Erenice no dia 2 de setembro de 2004 e pediu que a assessora, então consultora jurídica de Minas e Energia, avaliasse o teor da representação que pretendia submeter ao tribunal, fizesse as alterações que considerasse necessárias e até avaliasse se o órgão de controle devia mesmo atuar no caso.
A mensagem de Lucas Furtado inflamou o debate político, pois é dele o pedido para investigar o ex-juiz Sergio Moro, pré-candidato à Presidência da República, por suposto conflito de interesses no período em que trabalhou para a consultoria americana Alvarez & Marsal. Moro ainda não decolou nas pesquisas de intenção de votos, hoje lideradas com folga pelo ex-presidente Lula. Após a publicação da reportagem, o presidenciável do Podemos pediu que a Corregedoria do TCU e a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigassem a conduta do membro do MP de Contas.
Na noite desta terça-feira 23, o caso Moro no TCU ganhou um novo capítulo. É que o ministro Bruno Dantas, relator do procedimento que apura se o ex-juiz cometeu irregularidades e forneceu informações confidenciais da Lava-Jato à sua contratante na iniciativa privada, decidiu enviar o caso para a PGR, a quem caberá decidir se impõe o maior revés na campanha morista e pede o bloqueio de bens do pré-candidato. O acervo envolvendo Sergio Moro também deverá ser analisado pela Receita Federal, que apurará eventual sonegação fiscal.