A bronca de Lewandowski com o Centrão
Magistrado demonstra há tempos incômodo com supostas ameaças de parlamentares contra o STF
Autor do voto decisivo no julgamento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou o orçamento secreto inconstitucional, o ministro Ricardo Lewandowski foi acusado por expoentes do Centrão de ter agido em nome do presidente eleito Lula para barrar o principal vetor de poder do Congresso Nacional e desidratar a influência do presidente da Câmara Arthur Lira (Progressistas-AL) junto ao governo de turno. Interlocutores do magistrado, porém, dizem que não é de hoje a bronca de Lewandowski com parte do Centrão.
Relator de processos criminais que tratam de supostos desvios relacionados às emendas de relator, pilar do orçamento secreto, o magistrado conhece como poucos dentro do tribunal os mecanismos de pagamento e negociação de repasses parlamentares a seus redutos eleitorais e demonstrou nos últimos tempos contrariedade com a postura de deputados que ameaçaram retaliar o Supremo caso o orçamento secreto fosse derrubado pela Justiça. O líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), por exemplo, chegou a afirmar que o Congresso poderia inviabilizar a aprovação do orçamento do Judiciário para 2023 caso a Corte se arvorasse sobre a legalidade das chamadas emendas RP9.
No domingo, 18, diante da demora dos parlamentares em aprovar o arcabouço fiscal do futuro governo Lula, o decano do Supremo Gilmar Mendes deu uma primeira estocada no Congresso e autorizou que o governo retirasse das amarras do teto fiscal de gastos despesas com o pagamento do programa Bolsa Família. “Não é de hoje que eles estão extrapolando as atribuições do Judiciário e invadindo prerrogativas exclusivas do Congresso. Na Câmara externamos, reclamamos e marcamos posição, mas o Senado, por exemplo, pode fazer o impeachment de ministros do Supremo. Está na Constituição”, disse a VEJA, com evidente dose de provocação, o líder do governo na Câmara Ricardo Barros (Progressistas-PR).
Segundo um interlocutor do STF, uma avaliação corriqueira entre os magistrados é a de que o orçamento secreto havia se transformado em um instrumento para aglutinar um conjunto de parlamentares supostamente com pouco compromisso com as instituições e com parcos princípios republicanos de gestão dos recursos públicos. Foi por ter esse quadro em mente que a presidente do tribunal Rosa Weber teria feito questão de manter sob sua relatoria os recursos que questionavam a constitucionalidade do orçamento secreto e os levar à deliberação do Plenário ainda este ano para derrubar a legitimidade das emendas RP9. “O tipo de arrogância mostrado pelo Centrão, exageradamente empoderado, conduziu ao desfecho contra o orçamento secreto”, disse o mesmo interlocutor do Supremo.