“Precisamos acelerar”, diz Igor Normando, novo prefeito de Belém, sobre COP30
Político do MDB lista desafios, mas diz que a cidade estará pronta para receber a 'COP da Amazônia' em 2025
Cerca de 200 países e mais de 66 000 delegados estiveram presentes na COP29, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, em Baku (Azerbaijão). Mas, quando terminou o evento (o encerramento será nesta sexta, 22), ficou claro que discussões complexas como metas e financiamentos devem continuar em pauta, a tempo de chegarem a Belém, que vai receber em novembro de 2025 a próxima edição. O “prefeito da COP” será Igor Normando (MDB), que, aos 37 anos, será o mais jovem político a comandar a capital do Pará. Primo do governador, Helder Barbalho (MDB), ele foi vereador e deputado estadual, mas ganhou projeção como secretário estadual de Cidadania, quando implantou o Usinas da Paz, projeto que se tornou referência na redução da criminalidade ao unir políticas sociais e de segurança pública. No novo cargo, terá que correr para viabilizar as obras do Parque da Cidade, palco das principais reuniões, e de pontos turísticos como Porto Futuro e Mercado Ver-o-Peso. Também precisa preparar Belém para receber ao menos 50 000 pessoas e resolver problemas como mobilidade, lixo e esgoto (a cidade tem um dos piores índices de saneamento do país). A VEJA ele diz que a maioria dos gestores não leva a sério as mudanças climáticas, mas que esse não pode ser o seu caso. “Nós, que somos amazônidas, temos a obrigação de dar o exemplo”, afirma.
Qual é o principal problema da cidade para receber a COP30? Temos dois grandes desafios. Um é colocar a manutenção da cidade em dia, ou seja, fazer os serviços públicos e básicos funcionarem. O outro é tocar em ritmo acelerado as obras da COP30. Há lentidão em algumas intervenções por parte da prefeitura, mas, assim que assumirmos, a nossa principal meta será fazer com que tudo seja entregue até novembro. Eu vou pessoalmente fazer a vistoria das obras toda semana para garantir que o ritmo seja acelerado.
Com gargalos como falta de hospedagem e problemas de mobilidade, a cidade tem mesmo estrutura para receber um evento desse porte? Os desafios de Belém são os mesmos de toda metrópole. Existe a previsão da chegada de ônibus que vão ser equipados com ar-condicionado, wi-fi, acessibilidade, padrão Euro 6. São veículos que emitem menos gases poluentes. O setor hoteleiro está em um ritmo acelerado de obras, inclusive hotéis renomados nacional e internacionalmente. A COP é um evento fantástico, uma oportunidade extraordinária de Belém se desenvolver, mas precisamos cuidar da nossa população também. Vamos dar atenção à manutenção urbana e entregar o melhor evento que a gente puder. O governador disse outro dia: “Vocês esperam ter uma COP igual à de Dubai (edição de 2023)? Esqueça. Essa é a COP da Amazônia”. Então, vamos ter uma COP com todos os desafios da Amazônia. E com seu calor humano também.
Outros problemas são o acúmulo de lixo nas ruas e o baixo índice de saneamento. Não é uma situação constrangedora para quem vai receber o maior evento ambiental do mundo? Não dá para acontecer a COP assim. Isso é uma coisa básica. Não podemos fazer um pacto com a mediocridade. Precisamos colocar para funcionar e discutir um grande projeto. Vamos ter no primeiro ano esse grande desafio de deixar a manutenção urbana em dia e, a partir de então, colocar em marcha o planejamento de desenvolvimento sustentável que esperamos implantar.
“Já convidamos o Trump para que ele venha ao nosso evento. Temos que agir de forma pragmática e republicana. A temática ambiental é mais importante que as questões ideológicas”
O presidente Lula e o governador têm dito que o objetivo da COP30 é apresentar a Amazônia para o mundo. O que iremos mostrar em 2025? Vamos mostrar a Amazônia com as suas potencialidades, como o nosso maior bem. Precisamos preservar o meio ambiente e discutir as mudanças climáticas não apenas no evento. Os gestores dos países, cidades e estados precisam compreender a sua obrigação e fazer a sua parte, para que não haja mais catástrofes como as das enchentes do Rio Grande do Sul e da Espanha, e tantas outras que podem ocorrer se não tivermos a capacidade de compreender a nossa responsabilidade na gestão. A maioria dos políticos não leva a sério a questão das mudanças climáticas. Nós, que somos amazônidas, temos a obrigação de dar o exemplo.
E como a cidade pode dar esse exemplo? Belém é o coração da Amazônia, mas somos uma das cidades com a menor arborização do Brasil. Temos que trocar os nossos transportes públicos por modelos com condições menos poluentes. Usar tecnologia para acabar, por exemplo, com o uso excessivo de papel. Temos que fazer ações sustentáveis que possam diminuir essa degradação. Inclusive, implementando a educação ambiental, fundamental para garantir isso. Precisamos preparar as próximas gerações para ter responsabilidade com o meio ambiente. É uma preocupação perene.
Um dos temas da COP deve ser a bioeconomia e o desenvolvimento sustentável. É possível conciliar economia e preservação ambiental? Sem dúvida. O governador recentemente negociou o crédito de carbono da floresta. Houve uma discussão grande sobre isso. É possível ter uma economia através da floresta em pé, através da sustentabilidade na produção. Nós somos um dos estados mais ricos do ponto de vista agroflorestal do Brasil. E é fundamental que a gente possa incentivar isso por meio de ações sustentáveis. A bioeconomia é uma realidade e é algo que vai ser discutido no Brasil e no mundo com a COP30. Então, temos que mostrar que é possível preservar o meio ambiente e, ao mesmo tempo, fazer o desenvolvimento econômico.
Qual legado o senhor imagina que a COP vai deixar para a cidade? Vai ser extraordinário. Belém ficará conhecida no Brasil e no mundo como a capital da Amazônia. Isso faz com que a população tenha esse sentimento de pertencimento à cidade. Vai atrair turistas, entrar no mapa do planeta. Fora as obras estruturantes, os serviços criados a partir da demanda da COP. Isso vai proporcionar uma nova matriz econômica na cidade, geração de emprego e renda, tudo isso vai ajudar a periferia e aqueles que querem empreender.
O senhor teme que a vitória de Donald Trump nos EUA, conhecido por ser um negacionista ambiental, possa esvaziar a COP30? Não acho que tenha alguma influência. O governador já até fez o convite para que ele venha. Esse é um evento que discute o clima do mundo. Independente de posições ideológicas, todos os chefes de Estado estão convidadíssimos a vir a Belém e fazer as discussões importantes. Temos que agir de forma pragmática e republicana com todos que compõem esse arco de debates. A temática é mais importante que questões ideológicas.
Lula prometeu zerar o desmatamento na Amazônia até 2030. O senhor acha que isso ainda é possível? Existe uma frase do Ariano Suassuna que acho fantástica, que uso na minha vida: ser pessimista é burrice e ser otimista é pior ainda. Prefiro ser um realista esperançoso. Então, temos que ver a realidade que o país enfrenta em relação ao desmatamento, mas tendo ações efetivas e a esperança de que é possível.
A Amazônia convive com crimes ambientais como desmatamento e garimpo, que hoje estão ligados a facções que atuam no tráfico de drogas. Como isso se reflete em Belém? Cada um tem que fazer a sua parte. O governo federal tem sua obrigação, o estadual a sua, a prefeitura tem que ter a sua. Belém tem mais de 40 000 pessoas vivendo em ilhas, precisamos fazer com que isso seja preservado e possamos garantir a segurança dentro do que é possível nas atribuições da prefeitura.
E como as cidades podem contribuir para combater esse problema? A Guarda Municipal tem que fazer parte de uma ampla estratégia de segurança pública. Nós vamos criar a Secretaria de Segurança e Defesa Social, fazer videomonitoramento, ter uma política só de enfrentamento da criminalidade. A secretaria das Usinas da Paz foi uma das experiências mais importantes da minha vida. É um dos maiores programas de inclusão social da América Latina. Violência se combate com o poder ostensivo da polícia, mas também com cidadania, com inclusão, com oportunidade. Onde a Usina da Paz é instalada, temos uma diminuição da criminalidade de até 70%. Então há um caminho. Precisamos acelerar essa construção de política pública não só de enfrentamento, mas também de inclusão.
Quando era ministro da Justiça, Flávio Dino esteve em Belém para conhecer o programa. Há a possibilidade de as Usinas da Paz se tornarem uma política pública nacional? Existe essa expectativa. Há uma conversa em andamento do governo do estado com o Ministério da Justiça para que o projeto seja replicado em um formato diferente, mas com a mesma concepção.
“Com a COP, Belém ficará conhecida no Brasil e no mundo como a capital da Amazônia. Vai atrair turistas, entrar no mapa do planeta. Isso vai criar uma nova matriz econômica”
O MDB foi o segundo partido que mais elegeu prefeitos neste ano. Como vê o futuro da legenda? O MDB tem renovado os seus quadros — eu sou um exemplo disso — e feito discussões internas importantes. O partido tem tudo para ser um grande protagonista nas discussões do Brasil. Essa renovação dos quadros, representada pelo próprio governador (Helder tem 45 anos), é importante para termos um grande papel nacional. Essa eleição municipal serviu justamente para mostrar que o eleitor quer isso. Houve um grande processo de renovação, se for observar a quantidade de prefeitos jovens que se elegeram. Nós temos um compromisso de fazer bem-feito para que a oportunidade que as pessoas nos deram seja algo que incentive as outras cidades a compreender a importância da renovação.
Após esse resultado, o senhor acha que o partido deve ter mais espaço no governo Lula? Eu não me arrisco a fazer esse diagnóstico. Mas tenho certeza que, na discussão do país, o MDB precisa se aprofundar cada vez mais. Agora tem toda a credencial para isso. O MDB sempre foi o equilíbrio do país. Temos que voltar a ocupar esse espaço.
O MDB tem diferenças internas. Há quem defenda se afastar de Lula e outros que pregam o apoio à reeleição do presidente, inclusive pleiteando a vaga de vice na chapa. Qual caminho o MDB deve tomar? O caminho que sempre tomou. O partido veio da luta pela democracia e precisa exercer isso internamente. Sempre acreditei no MDB como o maior partido do Brasil, que sabia conviver com as suas diferenças e encontrava a convergência para marchar em um único sentido. O partido vai ter maturidade de discutir o caminho no momento necessário.
Helder Barbalho pode ser candidato à Presidência em 2026? Precisamos discutir primeiro o projeto de país para depois discutir se tem candidatura própria. Helder é uma liderança não só regional, mas nacional. Com o presidente Baleia Rossi e lideranças do partido, vamos saber conduzir essa discussão. Eu estou muito concentrado na cidade.
Publicado em VEJA de 22 de novembro de 2024, edição nº 2920