Bruno Reis, um dos campeões nacionais de votos: “Aqui não tem outsider”
Segundo o prefeito de Salvador, eleitor premiou políticos com boas gestões
O prefeito de Salvador, Bruno Reis (União Brasil), saiu da eleição do último domingo, 6, como um dos campeões nacionais das urnas, ao ser reeleito com 79% dos votos válidos, impondo uma dura derrota ao PT, que governa o estado há cinco mandatos, e se firmando como uma das novas lideranças da centro-direita no país. Sua relação com a política começou cedo. Formado em direito, foi assessor do então deputado federal ACM Neto, que se tornou seu padrinho político. Em seguida, conseguiu uma vaga de deputado estadual em 2010, mandato que renovou em 2014. Dois anos depois, foi vice-prefeito na chapa vitoriosa do aliado. No pleito seguinte, em 2020, chegou à prefeitura com 64% da preferência do eleitor. Com o mandato renovado e aprovação de quase 80% da população, Reis se cacifa para voos maiores no futuro. “É natural que eu passe a sonhar novos sonhos, de um dia ser senador, ser governador”, afirma, tomando o cuidado de ressaltar que ACM Neto está à frente na fila pela disputa do estado em 2026.
Em entrevista a VEJA, o prefeito fala sobre a relação com o carlismo, corrente política liderada por décadas pelo ex-senador Antonio Carlos Magalhães na Bahia, critica a gestão estadual de Jerônimo Rodrigues (PT) na segurança e apoia a candidatura do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), ao Palácio do Planalto. Ele diz que a oposição precisa construir uma alternativa a Lula e avalia que se manter longe do petismo e do bolsonarismo o ajudou na performance eleitoral, na sua trajetória política e na aprovação de sua gestão. “A Bahia foi o único estado, talvez, em que não surgiu um outsider na política. Aqui as pessoas votam e reconhecem quem trabalha, quem tem história”, declara.
Partidos como União Brasil, PSD, PP, Republicanos e PL saíram fortalecidos das urnas em todo o Brasil em 2024. A que o senhor atribui o bom desempenho dos partidos à direita nas eleições? No nosso caso, deixamos claro para o eleitor que não éramos nem de direita, nem de esquerda. A ideologia e as questões partidárias não vão matar a fome de ninguém, não vão resolver os problemas das pessoas e da cidade. O que resolve é o trabalho. Aqui, todos os grupos políticos já tiveram oportunidade de governar a cidade, e o eleitor faz uma comparação de quem entrega mais. Desassociada de qualquer interferência de líderes, a população escolheu o prefeito que estava mais preparado, que tinha o melhor currículo e mais capacidade de entrega. Foi justamente isso que me permitiu ter uma votação histórica, transcendendo os percentuais que nosso grupo alcançava. A decisão em Salvador foi fora do campo da política, mas dentro da razão, do que era melhor para o presente e o futuro da cidade.
Mas o senhor está se referindo a Salvador. Pensando na Bahia e na região Nordeste como um todo, não acha que houve influência da ideologia ou de lideranças nacionais? A Bahia foi o único estado, talvez, em que não surgiu um outsider na política. Aqui as pessoas votam e reconhecem quem trabalha, quem tem história. A eleição municipal é uma eleição isolada, diferente da estadual, que acaba tendo influência nacional. A população sabe qual é o papel do prefeito, que é cuidar dela no dia a dia, garantindo o funcionamento da cidade. Justamente por isso que vimos nos grandes municípios do Brasil a escolha ser dissociada das questões de alinhamento partidário. Aqui sepultamos esse discurso de que o prefeito tem que ser do mesmo partido do governador e do presidente. É um discurso ultrapassado, que não tem mais aderência para as pessoas. A grande demonstração foi o resultado da minha eleição.
“A Bahia é campeã da violência e do desemprego, tem a pior educação do Brasil, e metade da população vive abaixo da linha da pobreza. É óbvio que as pessoas querem mudar essa realidade”
Embora a Bahia seja um reduto do PT, o partido foi derrotado em Salvador nos últimos anos. O que explica isso? A eficiência administrativa. Nas nossas gestões, a cidade teve a oportunidade de experimentar uma nova forma de governar, em que destinamos os recursos para as áreas mais pobres e mais carentes da cidade. Esses investimentos promoveram avanços expressivos que melhoraram efetivamente a vida das pessoas em todas as áreas. Não há cidade no país que tenha se transformado tanto nos últimos anos quanto Salvador. Havia uma boa disputa sobre quem faz mais entre prefeitura e governo do estado, um forçando o outro a trabalhar.
E essa disputa continua? Espero que somente nos próximos dois anos. Que, a partir de 2027, a prefeitura possa trabalhar alinhada com o governo estadual.
O carlismo foi um grupo político influente por décadas, até ser derrotado pelo PT em 2006. O senhor se considera parte dessa corrente? Eu me formei nessa escola, comecei ainda muito jovem. Uma escola que formou grandes gestores. Não tem homem público que tenha servido tanto ao seu estado como Antonio Carlos Magalhães. Mas não tenho dúvidas que hoje temos uma outra visão. Temos a exata noção da realidade atual e fazemos uma política moderna, com base na eficiência, investindo os recursos nas áreas mais pobres. O maior programa social de qualquer governo é crescimento econômico, desenvolvimento, geração de emprego e renda. E, a partir dessa premissa, nós desenvolvemos a cidade que governamos com outros pensamentos e perspectivas.
O carlismo tem força para disputar novamente o governo contra o PT? Eu falaria em renovação da política, novos quadros públicos, diria que depois de vinte anos existe uma fadiga de material, um cansaço. A Bahia tem problemas estruturais. É a campeã nacional da violência e do desemprego. É o estado que tem a pior educação do Brasil e onde, infelizmente, mais da metade da população vive abaixo da linha da pobreza. É óbvio que as pessoas querem mudar essa realidade. Em uma eleição estadual, por mais que tenha a influência nacional, o peso da máquina pública, uma hora o desejo de experimentar outra forma de governar vai ser majoritário. Isso está bem próximo de ocorrer, e nós vamos vencer as eleições de 2026.
Pretende disputar o comando do estado daqui a dois anos ou vai apoiar ACM Neto? Sou candidato a fazer de Salvador a melhor cidade do Brasil. Tenho apenas 47 anos de idade. Tudo tem o seu tempo, é o tempo de Deus. Sei que, depois que fizer um grande trabalho como prefeito, me credenciarei a voos maiores na política. Meu candidato a governador é ACM Neto. Essa decisão depende dele e, sendo concorrente, terá todo o meu apoio. Ele foi candidato na eleição passada, não venceu por muito pouco, continua trabalhando e tem tudo para ser o próximo governador.
Mas o senhor tem a intenção de ser candidato a governador no futuro? Tenho sim. Depois que eu concluir o meu mandato, é natural que a gente passe a sonhar novos sonhos, de um dia ser senador, ser governador. Mas tenho consciência, muita humildade e o pé no chão, ainda mais depois dessa expressiva votação, que aumenta a expectativa das pessoas. Quero realizar um grande segundo mandato, fazer melhor do que foi o primeiro. Esse é meu foco agora.
A Bahia, e por extensão Salvador, convive com o crescente problema da violência e da presença do crime organizado. O que acha que pode ser feito? O maior problema é a briga das facções pelo controle de áreas para o tráfico de drogas e de armas. Todo mundo sabe que não é o prefeito quem comanda a polícia. A prefeitura não tem força de segurança e nem expertise para esse enfrentamento. Temos adotado uma série de ações com a guarda municipal, implantação de rondas, câmeras de monitoramento em diversas áreas da cidade. No Centro Histórico, praticamente assumimos a questão da segurança. A gente se coloca inteiramente à disposição do governo do estado para trabalhar de mãos dadas. Infelizmente, eles perdem essa guerra contra o crime organizado. Diante da incapacidade do governo estadual, estamos tendo que assumir cada vez mais responsabilidades fora das nossas atribuições.
Qual será a prioridade no novo mandato? Minha bandeira é a educação. Eu sei da importância da educação na vida das pessoas, da capacidade de mudar o presente e o futuro da nossa cidade. Fizemos investimentos expressivos e meu compromisso para os próximos quatro anos é ampliar ainda mais. Minha meta é levar Salvador para as primeiras posições do Ideb no Brasil. Vamos continuar construindo grandes escolas de alto padrão para que as crianças se sintam até melhor ali do que em suas casas.
Na sua avaliação, qual é o principal problema da cidade hoje? O transporte público, que está quebrado. Já estava em crise por conta da pandemia, colapsou. Nós, prefeitos, estamos tendo que pagar a diferença da tarifa fazendo subsídio. Precisamos adquirir mais ônibus. Com isso, teremos condições de ofertar mais linhas, fazendo com que o passageiro espere menos tempo no ponto e que os ônibus possam circular mais vazios nos horários de pico. Também teremos outros modais de transporte, como o teleférico que a prefeitura vai implantar no subúrbio. E espero que o governo do estado tenha condições de tirar o VLT do papel. Com esse sistema funcionando de forma integrada, vamos ter um transporte público mais eficiente.
O senhor teve o apoio do PL na eleição, mas evitou uma associação direta com Bolsonaro. Teve medo da rejeição? Eu já tive o apoio do PL em 2020, mantive os apoios que tive na minha primeira eleição. O presidente do partido aqui, João Roma, é um grande parceiro. Eu disse claramente que queria o apoio do povo da minha cidade, que eu não estava em busca do apoio de autoridades, de poderosos. Enquanto meus adversários estavam brigando para ver quem era o candidato de A ou B, eu queria ser o candidato da população. E consegui ser. Enquanto muitos estão brigando nas redes sociais, estão discutindo ideologias, eu estou trabalhando.
A fusão do DEM com o PSL, que deu origem ao União Brasil, teve um período de muitas turbulências. Isso foi superado? O partido comemorou três anos no dia 6, com grandes vitórias no primeiro turno e com disputas importantes no segundo, das quais esperamos sair vitoriosos. Não existe qualquer outro problema interno. As questões do passado foram todas superadas. O partido está extremamente unido em torno do presidente Antonio Rueda. Saímos das urnas maiores do que entramos. E temos certeza que estaremos ainda muito mais fortes para 2026.
“O desafio de quem for candidato em 2026, para enfrentar o grupo que hoje comanda o país, é construir uma ampla aliança e apresentar uma alternativa de poder aos brasileiros”
O União Brasil tem ministérios no governo Lula, mas ensaia uma candidatura ao Planalto em 2026, com Ronaldo Caiado. Acha que o partido deve ter candidato próprio? Eu defendo a pré-candidatura do melhor governador do Brasil, Ronaldo Caiado. Ele tem um case de sucesso no enfrentamento da questão da segurança, que é o maior problema do Brasil hoje. O modelo de Goiás pode ser replicado para todo o país. É, sem sombra de dúvidas, um quadro extremamente qualificado. É o nome do nosso partido, vamos trabalhar esse nome e, sendo candidato, ele terá todo o nosso apoio. Não sendo, a gente vai decidir que posição tomar, mas no momento certo.
Caiado já disse que quer o apoio de Bolsonaro. Nomes de outros partidos também querem esse apoio, como os governadores Tarcísio de Freitas, Ratinho Jr., Romeu Zema. O senhor acha que há espaço para a direita fora do bolsonarismo na disputa nacional de 2026? Não tenho dúvidas. Ainda mais o ex-presidente não sendo candidato. O nome que representar e que aglutinar todas essas outras forças será extremamente competitivo, com chances reais de vitória. O desafio de quem for candidato em 2026, para enfrentar o grupo que hoje comanda o país, é unir todos esses nomes, construir uma ampla aliança e apresentar uma alternativa de poder para os brasileiros em 2026.
Publicado em VEJA de 11 de outubro de 2024, edição nº 2914