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‘A Rouanet é moderna’, diz Margareth Menezes

Ministra da Cultura defende a lei de incentivos, critica gestões anteriores e diz que não faz mais à frente da pasta por culpa da burocracia em Brasília

Por Valmir Moratelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 12 dez 2025, 06h00 •
  • A celebração pelos 38 anos de carreira artística, em outubro, foi em meio a uns dias de férias do Ministério da Cultura, que Margareth Menezes, 63, comanda desde o início do governo Lula, em 2023. Considerada a principal voz do afropop brasileiro, ela aproveitou a pausa para fazer o que adora — estar em cima do palco, dando show, o que vem rareando diante da maratona em Brasília, onde ainda aprende a se virar nos labirintos da burocracia. “É muito mais penoso do que escolher o repertório de minhas apresentações”, diz a baiana. Ela conta que, ao assumir, encontrou projetos desarticulados e um cenário de abandono na pasta, que passou por oito mãos no governo de Jair Bolsonaro — uma delas, a da atriz Regina Duarte, a quem tece críticas a seu modo, sem muitos adjetivos. Na entrevista concedida a VEJA em seu gabinete, Margareth, que nesta temporada no poder já foi acusada de favorecer a si mesma e a aliados do PT com verbas para a cultura, o que nega, não esconde que, em um eventual novo governo Lula, gostaria de ficar exatamente onde está: na Esplanada dos Ministérios.

    Em diversos governos, apareceram casos de uso indevido da Rouanet. Essa lei precisa ser revista? Não. Nossa lei de incentivo à cultura tem 34 anos e é admirada internacionalmente. Permite que pessoas e empresas direcionem um percentual do imposto de renda a ações culturais, um mecanismo bastante moderno. E o número de projetos vem crescendo. A Universidade de Oxford apresentou um estudo mostrando que o audio­vi­sual emprega no país mais do que a indústria automobilística. É uma mina de ouro com ainda muito a explorar.

    Há um problema no controle eficiente dos gastos? A burocracia sempre atrapalhou. O novo marco faz parte de um recente decreto da Lei Rouanet que agiliza o processo. Agora, o projeto é enviado à Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, um conselho que conta com a sociedade civil para fazer análises criteriosas. Estamos falando de dinheiro público e privado. Precisa haver acompanhamento fiscal. Se passar por essa peneira, aí o autor do projeto recebe aval para ir atrás da captação de recursos.

    A regulação do streaming, pela qual a senhora vem trabalhando, foi recém-aprovada na Câmara e aguarda a apreciação do Senado. Qual a relevância do projeto? A regulação do streaming no país embute um ponto essencial à produção nacional: as empresas precisarão destinar uma cota de seus investimentos ao que é feito aqui, incentivando a indústria audiovisual brasileira, como já acontece com as TVs. Desde os primeiros tempos na Esplanada, apresentei o projeto. Foram muitas discussões. Se passar mesmo no Senado, a Presidência sanciona, e o Brasil se torna o primeiro na América Latina a ter uma legislação para o setor.

    “Não beneficiamos organizações ligadas à militância do PT, como já me acusaram. A escolha não é por partido. O que ocorre é que boa parcela do setor cultural tem uma tendência mais à esquerda”

    Segundo o CEO da Netflix, Spencer Newman, o “custo de fazer negócio no Brasil é alto” e os tributos reduzem de forma significativa as margens de lucro. Ele tem razão em reclamar? O Brasil está passando por uma reestruturação tributária na busca de um reequilíbrio. Mas posso garantir que o mercado brasileiro é atraente para essas empresas, um dos maiores do mundo.

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    A senhora chegou cheia de ideias à Esplanada. A burocracia vem sendo um freio? Estou em constante aprendizado. No começo, eu achava que era fazer e pronto. Não é bem assim. Às vezes é maçante. Há coisas que você pensa hoje e só começam a se cristalizar no ano seguinte. Fui me acostumando. Na minha carreira de artista era diferente. Aqui é outra dimensão.

    Conciliar a carreira artística com a política gera conflito de interesses? Sigo as regras da comissão de ética, que me impedem de receber qualquer verba federal. Na carreira, sempre cantei em shows privados, inaugurações. E continuo. Claro que tenho saudades e gostaria de fazer mais apresentações, mas minha prioridade agora é o ministério.

    No Carnaval deste ano, a senhora foi criticada por fazer shows para prefeituras que teriam sido pagos com recursos de seu próprio ministério. Isso procede? Não, é uma mentira. Não existe recurso nenhum do ministério nos meus contratos. Impossível. Como sempre, realizei os shows recebendo das prefeituras, sem verbas federais envolvidas. Tudo foi, inclusive, aprovado pela comissão de ética. Cantar no Carnaval é parte do meu trabalho. Tenho 38 anos de carreira.

    Na gestão anterior, houve uma sucessão de oito nomes à frente da pasta da Cultura. Que situação herdou? Tive um legado de problemas. Havia muita coisa abandonada, desarticulada, sem funcionar. A Fundação Palmares, dedicada à preservação da cultura negra, por exemplo, estava devastada, até com teto caindo. Diminuíram os funcionários no ministério e logo tive que encarar inúmeras pendências judiciais. No 8 de Janeiro, assistimos à vandalização do patrimônio cultural no quebra-quebra em Brasília. Vivemos em um país de 210 milhões de habitantes, com dimensão continental, uma rica diversidade, e há ainda tanta gente que questiona algo tão básico: se precisamos mesmo de um Ministério da Cultura. É inacreditável.

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    Em sua passagem pela pasta da Cultura, no governo de Jair Bolsonaro, Regina Duarte causou polêmica, minimizando até o sombrio capítulo do regime militar no Brasil. Como avalia sua gestão? Quando alguém na cadeira que ela ocupou diz inverdades, é bastante prejudicial. Tenho respeito pela Regina, mas não posso concordar com isso. O resgate da história da ditadura, aliás, ainda não foi completamente feito. Precisamos de um museu sobre o tema. Vejo como um exercício de grandeza de um país criar seus centros de memória. Quem sabe, em Brasília.

    Acha que o tema ainda é um tabu? Hoje, o assunto está, enfim, sendo mais falado, até no cinema. Já temos alguns centros de referência sobre esse capítulo, o que é um avanço. Em algum momento, vamos consolidar isso. Precisamos contar essa história para poder superá-la.

    O que de mais relevante a senhora já fez nesses três anos de ministério? É uma arquitetura. Me voltei para reequilibrar uma área que estava totalmente desmobilizada. Para que a importância da cultura seja percebida, de modo a não ser desmontada, é preciso antes de tudo criar as amarras institucionais. Esse é o esforço atual.

    De concreto mesmo, o que saiu do papel? Acho que vale citar a reativação do Sistema Nacional de Cultura, que conecta secretarias municipais e estaduais ao ministério, criando uma rede que dá mais força à área. Também estamos entregando um plano nacional, que há uma década não havia no país, com metas a alcançar. Lançamos ainda um novo marco regulatório de fomento, com o objetivo de dar mais transparência e descentralizar recursos, além de facilitar a prestação de contas dos projetos culturais.

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    “Tenho respeito pela Regina Duarte, mas quando alguém senta na cadeira de ministra e diz inverdades, como quando minimizou o capítulo da ditadura militar, é prejudicial. Não posso concordar”

    O Programa Nacional de Cultura destinou mais de 58 milhões de reais aos chamados pontos de cultura, e choveram críticas de que organizações ligadas a militantes do PT seriam as mais beneficiadas. Houve de fato favorecimento político nesses casos? Não temos análises feitas por partido político. Elas são técnicas. O que existe, na verdade, é que uma boa parcela do setor cultural tem tendências mais à esquerda. Posso garantir que não fazemos escolhas por partido. Também há instituições de direita contempladas, como a Intercultura. Essa polarização ideológica gera muita informação sem amparo nenhum na realidade.

    O presidente Lula acaba de sancionar uma lei que proíbe o uso de linguagem neutra na esfera pública. Qual a sua opinião sobre o tema? Eu, pessoalmente, não uso, mas não por preconceito. Acho importante dar liberdade a quem queira usar. Essa é uma pauta das gerações que estão chegando nestes novos tempos. Gosto da ideia de jovens interagindo em lugares de poder, trazendo um frescor de ideias e uma outra forma de ver o mundo.

    Recentemente, Claudia Leitte trocou em suas músicas a palavra Iemanjá por Yeshua (tido como o nome original de Jesus em certas religiões), o que foi entendido por alguns como desrespeito a matrizes africanas e suscitou acusações de intolerância que foram parar no Ministério Público. Como avalia o episódio? Precisamos de educação racial no Brasil. Esse episódio é mais um de desrespeito às matrizes africanas. A intolerância religiosa precisa ser tratada com a dimensão que ela tem. As simbologias de religiões como candomblé e umbanda são frequentemente alvo de ataques danosos. Em um país democrático, deve-se respeitar o direito de crença e expressão.

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    O Brasil ganhou neste ano seu primeiro Oscar e pode repetir o feito em 2026. A que atribui essa atual boa fase? Queremos estar em mais cinemas mundo afora. É a primeira vez que temos a chance de botar para valer a cara no exterior, uma ótima oportunidade para o país mostrar sua diversidade cultural e de pensamento. Filmes como O Agente Secreto e O Último Azul exibem estéticas e realidades únicas. Nosso papel é apoiar cada vez mais o audiovisual, o que estamos fazendo. Isso inclui incentivar coproduções internacionais e a presença no exterior. Uma das frentes é investir na participação de bons filmes em festivais prestigiados. Estamos também assinando acordos de colaboração que abarcam até intercâmbios entre diretores em séries em parcerias com China, França e Singapura. É uma aposta alta.

    A senhora gostaria de continuar no ministério em um eventual novo governo Lula? É importante dar continuidade ao trabalho, sim. A cada mudança de governo tem um monta e desmonta que traz prejuízo à sociedade. Formar o ministério, arquitetar políticas públicas, tudo isso exige energia e dinheiro. Quando entra outra gestão, fica uma fratura, é um passo atrás. Já conversei com Lula sobre isso. Quero cumprir a missão que ele me deu.

    A política a fisgou a ponto de cogitar sair candidata no ano que vem? Não, meu filho. Estou aqui para apoiar o presidente. Um momento de cada vez.

    Publicado em VEJA de 12 de dezembro de 2025, edição nº 2974

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