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Mensalão: Lewandowski absolve Dirceu e ministros reagem

Ministro, que havia admitido que deputados foram corrompidos, atribuiu a Delúbio Soares a responsabilidade política pelos crimes e foi questionado

Por Laryssa Borges e Gabriel Castro
4 out 2012, 17h21

Depois de livrar o ex-presidente do PT, José Genoino, da acusação de ter atuado para corromper parlamentares no esquema do mensalão, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), atacou o Ministério Público Federal nesta quinta-feira para afirmar que não existe prova de que o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, apontado como “o chefe da quadrilha do mensalão”, tenha coordenado ou participado da trama criminosa.

Lewandowski retomou o que os advogados classificam como um viés garantista da corte, que, para confirmar a preservação de salvaguardas constitucionais, busca uma interpretação mais restritiva da legislação penal. Logo no início de seu pronunciamento, ele listou premissas que confirmam sua tese. Disse prezar pela ampla defesa e pelo contraditório, pela presunção constitucional de inocência de todo acusado e pela dignidade fundamental da pessoa humana. Insistiu que não há prova documental ou pericial contra o petista e não entrou no mérito de existir provas indiciárias contra o réu. O relator baseou grande parte de seu voto em depoimentos de aliados dos petistas e de figuras que, se reconhecessem a existência do mensalão, poderiam ser responsabilizadas judicialmente.

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Em seu voto, o magistrado descartou indícios apresentados pela acusação e supervalorizou o papel do então tesoureiro petista, Delúbio Soares, a quem atribuiu toda a responsabilidade pelo maior escândalo político da gestão Lula. Do trio petista formado por Dirceu, Delúbio e José Genoino, o ministro disse haver evidências que permitem condenar apenas o ex-tesoureiro. Pela argumentação do revisor, Genoino seria um personagem figurativo dentro do PT, que não se intrometia nas finanças da legenda e que assinou os empréstimos fraudulentos que irrigaram o esquema apenas para dar um “aval moral”. No caso do ex-chefe da Casa Civil, apesar de petista histórico e, na época do escândalo, com planos reais de suceder o presidente Lula no Palácio do Planalto, Lewandowski disse que houve um afastamento completo do dirigente das atividades da legenda.

Para o ministro revisor, no escândalo político, Delúbio agiu com total liberdade em relação ao caixa do PT, não tendo que prestar contas ao presidente da legenda na época, José Genoino, e tampouco ao todo-poderoso José Dirceu, número dois da República. Na versão do magistrado, coube a Delúbio e ao publicitário Marcos Valério a decisão política de corromper deputados e a tarefa de providenciar os recursos ilícitos que consolidariam a empreitada.

O ministro disse que as acusações de corrupção ativa contra José Dirceu – a Procuradoria-Geral da República atribui ao ex-chefe da Casa Civil nove vezes a prática do crime – são vagas e têm mais cunho político do que evidências jurídicas.

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“Mesmo após vasta instrução probatória, o Ministério Público limitou-se a potencializar o fato de José Dirceu exercer determinadas funções públicas para imputar-lhe a prática de vários crimes, sem se dar o trabalho de os descrever minimamente. Restringiu-se a fazer meras suposições, desenhando um figurino genérico, no qual poderia encaixar-se qualquer pessoa que ocupasse alto cargo na administração federal”, criticou o ministro revisor.

Contestações – Lewandowski ouviu críticas dos outros ministros a respeito dos pontos fracos de seu voto. “Vossa excelência condena alguns deputados por corrupção passiva, entendendo que houve repasses de recursos para algum ato, provavelmente de apoio político. Também em seu voto condena Delúbio Soares como corruptor ativo. Não está havendo uma contradição?”, disse Gilmar Mendes, apontando a falta de coerência entre a postura anterior de Lewandowski e o voto dele no caso de Dirceu.

Marco Aurélio Mello, por sua vez, achou estranho o fato de Lewandowski condenar Delúbio, então tesoureiro do PT, mas absolver José Dirceu e José Genoino, mandatários do partido na época: “Vossa excelência imagina que um tesoureiro de partido político teria essa autonomia?”, indagou.

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Celso de Mello, o decano da corte, também se pronunciou para questionar Lewandowski quando o revisor acreditou ter encontrado uma contradição na tese de que houve compra de apoio político no Congresso: “Compra-se a Câmara mas não se compra o Senado?”, perguntou Lewandowski. Celso de Mello lembrou o óbvio: “Talvez porque não houvesse prova de que houve compra no Senado”, disse, lembrando que o que está nos autos pode ser apenas parte de um esquema maior.

Mais cedo, o presidente da corte, Carlos Ayres Britto, rebateu o colega revisor e lembrou que Roberto Jefferson não desmentiu à Justiça o que afirmou à imprensa e ao Congresso quando denunciou o mensalão. Até agora, Lewandowski não foi defendido por ministro algum.

Testemunhos – Adotando um viés contrário ao do ministro relator, Joaquim Barbosa, que chegou a citar “reuniões clandestinas” de Dirceu no Palácio do Planalto, em uma espécie de “governo paralelo”, Ricardo Lewandowski baseou seu voto essencialmente em testemunhos de aliados dos réus e de petistas em geral. Os interrogatórios pinçados pelo magistrado relatam, segundo ele, que Dirceu não exercia nenhuma função nem desempenhava qualquer papel administrativo dentro do PT. Embora tenha sido presidente nacional da legenda até o início 2002, véspera do início do mensalão, José Dirceu, na versão de Lewandowski, deixou o partido de lado para se dedicar exclusivamente ao recém-eleito governo Lula.

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Em seu voto, o revisor também preferiu relevar diversos indícios levantados pelo Ministério Público. A despeito de o publicitário Marcos Valério ter viajado a Portugal para negociar com empresários a liberação de parte do mensalão e se apresentado a autoridades locais como “Marcos Valério do PT”, Lewandowski disse que a “excessivamente valorizada viagem de Valério a Portugal não tinha nenhuma relação com José Dirceu”.

A argumentação utilizada pelo juiz do STF reflete de forma literal memorial entregue na tarde desta quinta-feira pela defesa de José Dirceu. No documento, o criminalista José Luís de Oliveira Lima afirma que, no caso da viagem a Portugal, “todas as testemunhas inquiridas sob juramento afastam qualquer possibilidade de envolvimento de José Dirceu” na negociação de recursos de empresários portugueses. Com fina ironia após ter sido interrompido pelo presidente do STF, Lewandowski desqualificou a denúncia apresentada pelo presidente do PTB, Roberto Jefferson, delator do esquema do mensalão, e disse que a prova da inocência de Dirceu no episódio conhecido como “Conexão Portugal” são os depoimentos dos empresários portugueses Miguel Horta e Costa e Ricardo Espírito Santo e do ex-ministro de Obras e Telecomunicações de Portugal, Antônio Mexia.

“Estou contrapondo a palavra de um réu condenado pelo plenário do Supremo e estou contrapondo a três depoimentos. Esse réu condenado (Roberto Jefferson) é um inimigo figadal e procurou incriminar José Dirceu e trazê-lo para o bojo dos fatos”, disse o ministro.

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Ricardo Lewandowski ainda fez referência às relações da ex-mulher de Dirceu, Ângela Saragoça, com réus ligados ao mensalão. Mas disse que as coincidências não são capazes de levar o ex-ministro da Casa Civil à condenação por corrupção ativa. Saragoça recebeu um emprego no banco BMG, um empréstimo no Banco Rural e vendeu um imóvel ao advogado Rogério Tolentino. BMG, Rural e Tolentino são peças-chave na investigação do mensalão e citados pelo Ministério Público como responsáveis pelos empréstimos simulados que dariam ares de veracidade aos milhões de reais que circularam no mensalão.

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