Setores e aliados de Trump se rebelam contra suas decisões
Empresários, ex-agentes da CIA e funcionários da área ambiental resistem a medidas da Casa Branca
Iniciativas polêmicas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não têm sido recebidas com um “amém” por setores organizados do país e de seu governo – nem mesmo entre os que apoiaram sua eleição e continuam a respaldar sua gestão.
A Agência de Proteção ao Meio Ambiente (EPA) e ex-diretores e agentes da CIA confrontam-se neste momento com decisões recentes do presidente. Representantes de quase 400 indústrias do país tentam desesperadamente, nesta semana, parar a guerra comercial iniciada por Trump contra a China e, se possível, suspender as barreiras levantadas nos últimos meses.
Há dois meses, não fosse a pressão da base republicana no Congresso, a Casa Branca teria continuado com a sua política de tolerância zero contra a imigração ilegal. Em claro recuo, Trump foi forçado a assinar um decreto presidencial em 20 de junho para acabar com a separação de crianças e adultos pegos na fronteira Sul e a reunificar as famílias separadas.
A escalada da guerra comercial contra a China promovida por Trump sob argumento de resgatar o setor manufatureiro do país está sob questionamento do próprio empresariado. Quase 400 companhias americanas participam entre hoje e quinta-feira de audiências na Representação dos Estados Unidos para o Comércio (USTR) para pedir ao governo que não leve adiante sua iniciativa de aplicar tarifas de importação adicionais de até 25% a produtos chineses cujos desembarques no país totalizam 200 bilhões de dólares ao ano.
As companhias alegam, segundo o jornal The New York Times, que os Estados Unidos não têm mais condições de produzir uma gama imensa de materiais necessários para o setor manufatureiro e que a importação deles é essencial. Nas últimas décadas, as empresas se embrenharam em cadeias globais de produção que, uma vez rompidas, trará prejuízos na ponta – ou seja, nas fábricas americanas. Grande parte dessas cadeias envolvem a produção de insumos na China.
Os empresários reunidos no USTR para dar seus depoimentos argumentam que a ausência de insumos vindos da China poderá prejudicar suas linhas de montagem e até mesmo causar demissões. Se a importação for mantida, mesmo com as tarifas adicionais, o repasse desse aumento de custos para os preços finais dos produtos será inevitável.
Jennifer Harned, presidente da Bell Sports, que emprega 500 pessoas, teme que as vendas de seus capacetes para ciclistas e skatistas caiam, e os consumidores prefiram marcas mais baratas e menos comprometidas com os requisitos elementares de segurança. Um acidente, nesse caso, poderia tornar-se mais grave.
“A China continua a ser vital e não seu vínculo com a nossa cadeia de fornecedores não pode ser substituído facilmente”, afirmou Tom Cove, da Associação da Indústria de Esportes. “Exportar manufaturas não é viável em tempo real ou em escala”.
Na semana passada, Trump revogou a credencial de segurança de John Brennan, diretor da CIA no governo Obama. A medida foi imensamente criticada por muitos setores do governo americano. Um grupo de 170 ex-diretores de agências de inteligência, oficiais e funcionários assinaram uma nota se opondo à decisão.
Entre as autoridades “rebeldes” estão ex-chefes da CIA nomeados por presidentes republicanos e democratas, como Robert Gates, George Tenet, Porter Goss, Leon Panetta e David Petraeus.
No comunicado, os oficiais descrevem a medida de Trump como “inadequada e profundamente lamentável”. Eles insistem que “nunca antes havíamos visto a aprovação ou a eliminação de autorizações de segurança utilizadas como ferramenta política, como foi feito neste caso”.
O republicano admitiu em entrevista ao The Wall Street Journal que a sua decisão de revogar a credencial de Brennan deveu-se à postura crítica dele e aos seus comentários sobre as ligações de sua equipe de campanha eleitoral com a Rússia – tema que continua em investigação federal.
Mudança climática
Com o objetivo de desfazer todos os avanços em termos de proteção ambiental adotados por seu antecessor, Barack Obama, Trump anunciou nesta terça-feira uma nova proposta desenvolvida pela Agência de Proteção Ambiental (EPA) para as regras nacionais sobre emissões de poluentes para a indústria termoelétrica. Em seu relatório, porém, a própria EPA reconhece que o relaxamento das medidas de proteção levaria a um aumento considerável das emissões de dióxido de carbono e outros poluentes, em prejuízo à saúde humana.
Com as novas regras, até 2030, os Estados Unidos podem registrar entre 470 e 1.400 mortes prematuras causadas pelo aumento de partículas nocivas no ar. As mortes podem estar relacionadas a doenças cardíacas e pulmonares. A proposta divulgada pela EPA está agora aberta para comentários do público. A decisão final deve ser publicada ainda este ano.
O plano anterior da EPA fora implementado pelo governo Obama e previa limitações para as empresas que usam a queima de carvão como fonte de energia. Tinha como objetivo reduzir em 32% as emissões de usinas de energia até 2030, com base em dados de 2005.
A Suprema Corte suspendeu o plano em 2016, depois que Estados produtores de energia processaram a EPA, dizendo que a agência havia ultrapassado seu escopo legal. O novo projeto de Trump, contudo, permitiria aos Estados elaborar suas próprias regulações menos rígidas para indústrias e pedir permissão para não cumprirem as regulações sobre emissões de usinas de energia.
A iniciativa da Casa Branca, nesse caso, está em linha com suas ações anteriores de favorecer o setor de energia não-renovável. Em junho de 2017, Trump anunciou a retirada do governo dos Estados Unidos do Acordo de Paris. Ele argumentou que o pacto tratava o seu país de maneira muito injusta ao impor “grandes sanções” pela utilização de valiosos recursos disponíveis no território americano, como gás, carvão e petróleo.
A decisão foi muito criticada, já que o acordo tinha como objetivo limitar as emissões de dióxido de carbono e, dessa forma, tentar restringir a escalada da temperatura média do planeta nas próximas décadas. Em Paris, os Estados Unidos haviam se comprometido a reduzir suas emissões em 26% a 28% dos níveis de 2005 até 2025. Para Trump, porém, aquecimento global é “uma farsa”.