Líderes da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias foram denunciados à Receita Federal dos Estados Unidos por terem desviado cerca de 100 bilhões de dólares de doações destinadas à caridade para sustentar negócios lucrativos, valendo-se da isenção tributária reservada a organizações religiosas. A denúncia foi publicada pelo jornal The Washington Post, que teve acesso ao documento enviado ao Fisco americano.
Mais conhecida como Mórmon, a igreja foi denunciada por um seguidor de 41 anos, David Nielsen, que trabalhou como gerente da divisão de investimentos da instituição, a companhia Ensign Peak Advisors, até setembro passado. A empresa era registrada como organização religiosa sem fins-lucrativos e estava, por isso, isenta de imposto sobre a renda em suas operações. Segundo o depoimento de Nielsen, a firma não atuava exclusivamente com propósitos caritativos.
Embora o Post não tenha conseguido entrevistar David Nielsen, obteve de seu irmão, Lars, todos os documentos sobre o caso. Lars ajudara David a montar o processo, que deve resultar em uma ampla investigação da sede da igreja Mórmon, em Salt Lake City, no estado de Utah.
“Depois de ver dezenas de bilhões em contribuições e em pontuações de ganhos de investimento chegarem e de não ver nada (para a caridade), com exceção de duas distribuições ilegais para firmas com fins lucrativos, ele (David) ficou muito abatido, e eu também”, escreveu Lars Nielsen para o Post.
Conforme a queixa apresentada pelos irmãos Nielsen, a igreja arrecada cerca de 7 bilhões de dólares por ano de seus 15.000 seguidores, a título de dízimo. Desse montante, 6 bilhões são usados nos custos operacionais e 1 bilhão de dólares é transferido para a Ensign. O documento informa que o portfólio da firma aumentou de 12 bilhões, em 1997, para 100 bilhões, em 2019, e que a companhia não desembolsou nenhum centavo em obras de caridade.
Esse volume de recursos coloca a Ensign entre as companhias e entidades de caridade mais ricas dos Estados Unidos, mencionou Nielsen ao Post. Seus ativos superam os da Fundação Bill & Melinda Gates e os da Universidade Harvard.
A queixa à Receita Federal americana menciona uma declaração do presidente da Ensign, Roger Clarke, de que os fundos gerenciados pela firma seriam usados na segunda vinda de Jesus Cristo. Mas 1,4 bilhão de dólares desses fundos foram destinados em negócios como a reforma do shopping City Creek Center.