Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Continua após publicidade

Por que Varsóvia alcança protagonismo inédito na Europa

O apoio incondicional à Ucrânia e a economia em alta estão entre os motivos — apesar dos desmandos autoritários do governo

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h51 - Publicado em 23 abr 2023, 08h00

Mal o primeiro soldado russo havia pisado em solo ucraniano, em fevereiro do ano passado, e a Polônia se mobilizava para ajudar o vizinho a enfrentar o invasor. De lá para cá, a rede de apoio só fez aumentar: foram despachados para a Ucrânia os tanques poloneses da era soviética, com os quais a tropa de todos os ex-satélites está familiarizada, um aeroporto civil próximo à fronteira, cercado de uma barreira de mísseis, virou rota de passagem de armamentos para Kiev e, mais recentemente, oito MIG-29 da frota polonesa passaram a integrar a Força Aérea ucraniana — a primeira injeção de caças na estrutura bélica do país. Em extraordinário gesto para uma nação que tem alergia a imigrantes, as portas foram abertas para 1,3 milhão de refugiados. Por tudo isso, Varsóvia ganhou prestígio e se tornou escala de lideranças globais: o presidente americano Joe Biden esteve lá duas vezes e, no começo do mês, o ucraniano Volodymyr Zelensky foi recebido com honras pelo colega Andrzej Duda. “A Ucrânia nunca esquecerá a magnanimidade que a Polônia nos demonstra”, disse Zelensky.

Compartilhando uma fronteira de 500 quilômetros, a Polônia era a candidata mais natural a canalizar o incessante fluxo de armas e recursos dos Estados Unidos e da Europa para a Ucrânia invadida. A boa vontade certamente foi estimulada pela histórica hostilidade dos poloneses para com tudo que vem da Rússia, potência que dominou o país durante boa parte do século XX. Seja qual for sua motivação, o fato é que, por sua firmeza ao lado da Ucrânia, a Polônia tem conseguido sair das beiradas e alcançar papel central nas decisões sobre a guerra e suas consequências.

A posição é reforçada pela estabilidade econômica: o país cresce sem parar desde a implosão da União Soviética. Boa parte desse progresso se deve às generosas transferências do bloco europeu para que países do Leste pudessem superar o atraso — só ela recebeu 213 bilhões de euros. Além disso, a transição do socialismo para a economia de mercado foi bem-sucedida, com uma legislação que facilitou a rápida privatização de estatais e o estabelecimento de um arrojado capital privado. Tirando proveito da mão de obra barata, a indústria floresceu, atraindo montadoras de automóveis, fabricantes de peças e projetos de infraestrutura. No crucial setor digital, Cracóvia e Varsóvia se tornaram canteiros de startups e o setor movimenta 24 bilhões de euros anualmente. A renda per capita se multiplicou por quatro, chegando a 6 400 dólares. O PIB é o quinto maior da União Europeia e, segundo o Banco Mundial, pode ultrapassar o do Reino Unido até 2030. “A Polônia fez a mais bem-sucedida integração com o capitalismo europeu entre os países do Leste”, avalia Marcin Piatkowski, professor da Universidade Kozminski, em Varsóvia.

DUALIDADE - Varsóvia: avanço econômico emperrado pelo retrocesso político
DUALIDADE - Varsóvia: avanço econômico emperrado pelo retrocesso político (Jacek Kadaj/moment/Getty Images)

Mesmo com tantos pontos a favor, porém, o governo polonês segue, junto com a Hungria, na lista de desobedientes da União Europeia, pela propensão a atropelar liberdades civis, controlar a imprensa e manipular a Justiça em prol de um nacionalismo exacerbado. Desde 2015, quando o direitista Partido Lei e Justiça chegou ao poder, a Polônia praticamente proibiu o aborto, promove implacável campanha contra a “ideologia LGBT” e se recusa a receber imigrantes da África e Oriente Médio. O maior ponto de discórdia com a UE, no entanto, é o enquadramento do Poder Judiciário, com a aberta perseguição de juízes que tomem decisões desfavoráveis ao regime. Por julgar que essa situação é incompatível com seus princípios, a Comissão Europeia, órgão executivo do bloco, bloqueou a transferência de 35 bilhões de euros em assistência pós-Covid à Polônia, motivo de enorme desagrado no governo do primeiro-ministro Mateusz Morawiecki.

Continua após a publicidade

Alegando que o país já voltou atrás em algumas medidas (sem maior impacto no aperto geral do Judiciário), seu antecessor, Jaroslaw Kaczynski, presidente do Lei e Justiça que de fato manda no governo, queixou-se em entrevista recente: “Mostramos a máxima boa vontade, mas nossas concessões não levaram a nada” — tudo isso em meio a um movimento para tentar depor a presidente da Comissão, Ursula von der Leyen. Premida entre duas frentes de batalha, uma militar e outra diplomática, a Polônia anunciou agora que não vai mais importar nem deixar passar por seu território cereais exportados pela Ucrânia, porque o excesso de oferta está prejudicando a agricultura nacional. Por trás do anúncio, o recado do agora bem mais poderoso vizinho: somos bonzinhos até certo ponto.

Publicado em VEJA de 26 de abril de 2023, edição nº 2838

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

Apenas 5,99/mês

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

a partir de 35,60/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.