ONG denuncia em Genebra quebra de direitos humanos em projeto na Amazônia
Justiça Global alega que projeto Grão-Pará, no Maranhão, pode gerar consequências danosas para população local
A organização não governamental Justiça Global denunciou em Genebra nesta terça-feira, 19, supostas violações aos direitos humanos relacionadas à transição energética, durante a 54ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. A acusação alega que a inauguração do projeto Grão-Pará, na Floresta Amazônica do Maranhão, voltado para a produção de amônia e hidrogênio verde, fontes de energia sustentável, pode gerar consequências danosas para população local, em uma tentativa de atender e beneficiar demandas internacionais.
“Na transição energética, o comércio internacional de hidrogênio verde poderá desempenhar um papel-chave, mas não pode ser encarado como uma fórmula mágica para alcançar a neutralidade climática na Europa. Quais os riscos de impactos negativos para as pessoas e a natureza no Sul Global, se o hidrogênio verde for produzido em grande escala para exportação?”, questionou a coordenadora da ONG, Monique Cruz, durante discurso na sessão.
A iniciativa governamental, discutida há seis anos, instalará um Hub de Energia Verde, do Terminal Portuário de Alcântara e da Estrada de Ferro do Maranhão. O Hub, como sugere o nome, procura produzir hidrogênio verde a partir da divisão da água por meio do processo físico-químico de eletrólise, no qual uma fonte de energia elétrica força reações químicas para a produção de substâncias. O portal do projeto indica que a exportação dos componentes limpos poderá contribuir para “o processo de descarbonização em curso” em países europeus.
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“Nos preocupa como as soluções de descarbonização serão apresentadas. Quem vai pagar a conta da neutralidade climática do Norte Global? A transição energética deve ser justa e a ameaça da crise climática não deve servir como pretexto para que empresas e governos agravem ainda mais a situação de direitos humanos”, disse a ativista.
Em novembro do ano passado, os países participantes da 27ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP27), realizada no Egito, lançaram um pacote de 25 novas medidas focadas na redução da emissão de carbono na atmosfera global, incluindo o incentivo à pesquisa e o reforço às propostas do Acordo de Paris. Entre os signatários estão as nações do G7 (Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá), Comissão Europeia, Índia, Egito e Marrocos. A produção brasileira seria, então, uma forma de atender a essa demanda.
A Justiça Global alerta, no entanto, para perigos da produção desenfreada de hidrogênio verde à população local, especialmente povos tradicionais. De acordo com dados do Censo do IBGE, 84,6% dos moradores, cerca de 15.616 pessoas, se autodeclaram quilombolas. No momento, municípios de Alcântara e Açailândia, as duas pontas da ferrovia do projeto Grão-Pará, já estariam sendo impactados pela base espacial militar de lançamento de foguetes, que teria perturbado o estilo de vida tradicional; pela cadeia produtiva da mineração, responsável por poluir o solo e os rios locais; e pela Estrada de Ferro da mineradora Vale S.A.
“O Projeto Grão-Pará irá gerar danos ao ambiente e violações de direitos humanos a populações indígenas, quilombolas e quebradeiras de coco, populações tradicionais que gozam de proteção legal específica”, acrescentou. “O projeto é discutido há seis anos e ainda não há informações disponíveis sobre o licenciamento ambiental e não foi realizada Consulta Prévia, Livre e Informada, conforme preceitua a Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho.”