O silêncio dos republicanos diante dos acenos de Trump a Putin
Presidente dos EUA derrubou princípios básicos da política externa de seu partido, mas correligionários tem moderado críticas ou se submetido totalmente

A regra dentro do Partido Republicano dos Estados Unidos na política externa era uma postura agressiva com a Rússia e apoio inconteste aos aliados históricos na Europa, que enfrentam suas mais imediatas ameaças. Por isso soa estranho o silêncio dos membros legenda diante do giro de 180 graus de Donald Trump. Após voltar à Casa Branca em janeiro, o presidente americano fez uma série de acenos ao homólogo russo, Vladimir Putin, na busca de um fim célere para a guerra na Ucrânia – mas sem ouvir Kiev.
Houve pouca resistência entre os republicanos diante da postura de seu líder. Alguns até expressaram consternação com os movimentos e declarações de Trump, mas isso nem chegou perto de criar um esforço concentrado para desafiá-lo – sendo que o Senado, onde a legenda tem maioria, desempenha um papel essencial na supervisão da política militar e externa no Congresso.
“É preciso dar a ele (Trump) algum espaço”, disse o senador John Thune, republicano de Dakota do Sul e líder da maioria, em uma coletiva no Capitólio na quarta-feira, após um almoço semanal com o vice-presidente, J.D. Vance.
Segundo o jornal americano The New York Times, alguns senadores tinham em mente usar a reunião com Vance para questioná-lo sobre a disposição de Trump em abandonar aliados americanos, se aproximar de Putin e chamar o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, de “ditador”. Mas, na hora H, a pauta não surgiu.
“O que eu apoio é um resultado e desfecho pacíficos na Ucrânia”, afirmou Thune a repórteres após a reunião. “O governo, o presidente e sua equipe estão trabalhando para alcançar isso”. Sobre Trump chamar Zelensky de ditador, ele declarou apenas: “O presidente fala por si mesmo”.
Thune está entre o contingente considerável de senadores republicanos que passaram os últimos três anos apoiando o envio de dezenas de bilhões de dólares em ajuda militar e financeira à Ucrânia. Com Trump na Casa Branca, porém, há pouca resistência enquanto ele se volta contra Kiev.
Até o senador Mitch McConnell, do Kentucky, o ex-líder do partido que tornou-se uma das principais vozes republicanas em apoio à Ucrânia, ficou em silêncio diante do giro de Trump em direção à Rússia.
Um ano atrás, cerca de vinte senadores republicanos foram contra Trump e votaram a favor de um pacote de ajuda militar para a resistência ucraniana. Mas poucos desses congressistas se manifestaram agora, e os que ofereceram críticas, as fizeram de maneira cuidadosamente formuladas para serem voltadas contra Putin — mas não contra Trump.
senador do Mississippi Roger Wicker, presidente do Comitê de Serviços Armados, disse que discordava da ideia de uma reunião pessoal entre Trump e Putin.
“Meu conselho ao presidente, se ele me pedisse, seria não dar a Vladimir Putin o benefício de se sentar com um chefe de Estado eleito democraticamente”, afirmou, chamando o russo de “um infrator internacional e um criminoso de guerra do pior tipo”. Mas, embora lidere o comitê do Senado que supervisiona a segurança nacional, deixou claro que não foi consultado pelo mandatário americano.
A senadora Lisa Murkowski, republicana do Alasca, disse que esperava que o país não “perdesse de vista o fato de que a Rússia e Putin invadiram a Ucrânia descaradamente e sem consideração à vida (de civis) ou às fronteiras”.
“Acho que precisamos ter muito cuidado”, acrescentou.
Na terça-feira 18, Trump chegou a sugerir que a Ucrânia seria culpada pelo início da guerra, criticando os líderes ucranianos por não terem feito um acordo com a Rússia para evitar o conflito. Na quarta-feira, ele intensificou suas críticas, chamando Zelensky de “ditador sem eleições”. Seu mandato expirou em maio passado, mas não houve novo pleito porque o país está em estado de sítio
O senador Thom Tillis, republicano da Carolina do Norte, que recentemente visitou Kiev, onde ele e outros dois senadores reafirmaram seu apoio à Ucrânia, rejeitou o rótulo.
“Não há equivalência moral entre Vladimir Putin e o presidente Zelensky”, disse Tillis, embora também tenha sido cuidadoso para evitar criticar diretamente a abordagem de Trump. Segundo ele, o presidente acabaria ouvindo seus conselheiros e tomando nota do desconforto dos republicanos no Capitólio.
Quando perguntada se apoiava a ideia de Trump realizar uma reunião com o homólogo russo, a senadora Joni Ernst, republicana de Iowa, simplesmente deu de ombros. Ela figurou no ano passado entre o contingente de republicanos que desafiaram Trump ao votarem a favor do envio de ajuda militar para a Ucrânia – na época, afirmou que a medida projetaria a força americana no cenário mundial.
O senador Lindsey Graham, republicano da Carolina do Sul, certa vez chamou Putin de “bandido” e criminoso de guerra, dizendo que ele “precisa ser tratado”. Mas logo que Trump anunciou ter recebido um convite para viajar a Moscou, o senador mudou de tom.
“Não me importa se eles se encontrarem com Putin em Cleveland”, ele disse. “Não me importa se eles conversarem, não me importa se eles saírem de férias. Não importa para mim o que você faça, desde que faça direito.”
Na quarta-feira, Graham escreveu nas redes sociais que Trump “é a melhor esperança da Ucrânia para acabar com esta guerra de forma honrosa e justa”, acrescentando que acredita que o presidente “será bem-sucedido e atingirá esse objetivo do jeito Trump”.