Líderes africanos pressionam Putin para acabar com guerra na Ucrânia
Em cúpula em São Petersburgo, representantes do continente mostraram preocupação com disparo dos preços de alimentos após Rússia romper acordo de exportação
Líderes africanos instaram o presidente da Rússia, Vladimir Putin, nesta sexta-feira, 28, a adotar sua proposta de paz para acabar com a guerra na Ucrânia. Em cúpula, o grupo também afirmou a importância da renovação do acordo que permite a exportação de grãos ucranianos, do qual Moscou se retirou na semana passada.
Embora não critiquem diretamente o Kremlin, as intervenções dos representantes da África no segundo dia de uma reunião com Putin foram mais contundentes do que as expressadas até agora. A cúpula serviu como lembretes ao líder russo da preocupação africana com as consequências do conflito na Ucrânia, especialmente em relação ao aumento dos preços dos alimentos.
“Esta guerra deve terminar. E só pode terminar com base na justiça e na razão”, disse Moussa Faki Mahamat, presidente da Comissão da União Africana em São Petersburgo. “As interrupções no fornecimento de energia e grãos devem terminar imediatamente. O acordo de grãos deve ser estendido para o benefício de todos os povos do mundo, em particular os africanos.”
Respondendo a Mahamat, Putin disse que a Rússia estava “agradecida aos nossos amigos africanos por sua atenção a este problema”, mas era Kiev que se recusava a negociar. Logo depois que o Kremlin declarou, unilateralmente, a anexação de quatro territórios ucranianos em setembro passado, o país invadido emitiu um decreto que restringe conversas com Moscou.
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Em junho, a União Africana apresentou uma série de possíveis medidas para dar fim ao conflito, incluindo a saída dos soldados russos da Ucrânia, a remoção de armas nucleares táticas russas de Belarus, a suspensão de um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI) contra Putin e o alívio das sanções à economia russa.
Moscou recebeu o plano de forma educada, mas fria, e afirmou que respeitava a proposta e a estudava “cuidadosamente”.
O presidente da República do Congo, Denis Sassou Nguesso, disse que a iniciativa africana “merece maior atenção, não deve ser subestimada”. Já o mandatário do Senegal, Macky Sall, pediu “uma desescalada para ajudar a criar calma”, enquanto o líder sul-africano, Cyril Ramaphosa, afirmou esperar que “engajamento e negociação construtivos” possam pôr fim ao conflito.
Na cúpula, o presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, pressionou Putin a retomar o acordo de grãos do Mar Negro que, até Moscou se recusar a renová-lo na semana passada, permitia à Ucrânia exportar alimentos de seus portos, apesar do conflito. Sisi, cujo país é um grande comprador de grãos pela rota do Mar Negro, disse na cúpula que era “essencial chegar a uma resolução” para a retomada do pacto.
Putin argumentou, por sua vez, que o aumento dos preços mundiais dos alimentos foi consequência de erros políticos do Ocidente muito anteriores à guerra na Ucrânia. Segundo ele, Moscou abandonou o acordo do Mar Negro porque o arranjo não estaria levando grãos para os países mais pobres, além de que o Ocidente não teria cumprido sua parte em reduzir as sanções à economia russa.
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Desde o fim do pacto, a Rússia passou a bombardear portos e depósitos de grãos ucranianos, provocando acusações da Ucrânia e do Ocidente de usar o represamento de alimentos como arma de guerra. Como consequência, os preços globais dos grãos subiram novamente.
Na quinta-feira 27, o Kremlin prometeu doar grãos russos para seis dos países participantes da cúpula, tentando injetar um novo impulso nos laços da Rússia com a África e obter apoio do continente para combater o que ele chama de “hegemonia dos Estados Unidos” e “neocolonialismo ocidental”.
Muitos dos líderes africanos elogiaram o histórico apoio de Moscou às batalhas de independência africanas do século XX e as lutas mais recentemente. Os líderes do Mali e da República Centro-Africana, cujos governos dependem dos serviços do grupo mercenário Wagner, da Rússia, expressaram sua gratidão ao líder do Kremlin.
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O presidente da República Centro-Africana, Faustin Archange Touadera, disse que as relações de seu país com a Rússia ajudaram a salvar sua democracia e evitar uma guerra civil, agradecendo “por nos ajudar a nos opor à hegemonia estrangeira”. Assimi Goita, do Mali, disse a Putin: “Você mostrou pragmatismo e realismo nos esforços para chegar a um acordo com a Ucrânia.”
Sobre a resolução da guerra na Ucrânia, a Rússia diz que está aberta a negociações, mas que elas devem levar em consideração as “novas realidades” no terreno. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, rejeitou a ideia de um cessar-fogo, que agora deixaria a Rússia no controle de quase um quinto de seu país.