Líder supremo quebra silêncio após trégua com Israel: ‘Irã deu tapa na cara dos EUA’
Acredita-se que Ali Khamenei passou boa parte do conflito escondido em um bunker sob Teerã; agora, comemora 'vitória'

O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, passou boa parte dos doze dias de conflito com Israel afastado do público – escondido em um bunker, acredita-se, enquanto o presidente americano, Donald Trump, e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, falavam abertamente sobre a possibilidade de assassiná-lo. Nesta quinta-feira, 26, dois dias depois da guerra Irã-Israel terminar em um volátil cessar-fogo, ele veio a público pela primeira vez com uma mensagem em vídeo para parabenizar “a grande nação do Irã” por sua “vitória sobre o falso regime sionista”.
“Apesar de todo esse barulho e de todas essas alegações, o regime sionista quase entrou em colapso e foi esmagado pelos golpes da República Islâmica”, disse ele.
De acordo com Khamenei, os Estados Unidos entraram na guerra diretamente, com bombardeios a três instalações nucleares iranianas no último sábado 21, para salvar Israel da “destruição completa”. “Entrou na guerra na tentativa de salvar o regime, mas não conseguiu nada”, afirmou.
“A República Islâmica desferiu um duro tapa na cara dos Estados Unidos. Atacou e infligiu danos à Base Aérea de Al-Udeid, uma das principais bases americanas na região”, acrescentou, referindo-se ao bombardeio na segunda-feira que viu catorze mísseis lançados contra o local – todos interceptados. Não houve nenhum morto ou ferido, nem danos, e Trump até agradeceu o governo iraniano por ter feito um alerta sobre o ataque para permitir a retirada das forças locais.
A fala do aiatolá vem num momento em que todos os lados tentam clamar vitória. “Nosso ataque encerrou a guerra. Não quero usar o exemplo de Hiroshima, mas foi essencialmente a mesma coisa”, comparou Trump, falando já em “paz eterna” no Oriente Médio. Já Netanyahu, que ganhou apoio maciço da população na estocada contra o Irã, gabou-se: “Mandamos o programa nuclear iraniano pelo ralo.” O Irã, por sua vez, já tinha avisado que tem capacidade para restaurar “qualquer dano sofrido” em suas instalações e celebrou o fato de o regime, há mais de três décadas comandado com mãos de ferro por Khamenei, ter ficado de pé.
Esconderijo e racha no regime
Em meio a falas como a de Netanyahu, que sugeriu que assassinar o líder supremo do Irã “acabaria com o conflito” entre os países, um plano que Trump teria vetado “por enquanto”, Khamenei — a mais alta autoridade política, militar e religiosa do país — parou de aparecer em público e não emitiu nenhuma mensagem oficial por dias.
Fontes próximas ao aparato de segurança iraniano afirmam que ele está em um bunker subterrâneo em Teerã, isolado por protocolo. Segundo essas informações, as comunicações eletrônicas foram suspensas por medo de uma possível tentativa de assassinato, mesmo após a entrada em vigor do cessar-fogo com Israel. Não está claro quanto o líder continua interferindo nas decisões centrais do país.
A falta de clareza gerou movimentações dentro do próprio aparato iraniano. Quatro altos funcionários, citados pelo jornal americano The New York Times, confirmaram que negociações internas foram iniciadas entre figuras políticas e militares na tentativa de reorganizar o comando operacional. Na ausência do líder, segundo o NYT, formaram-se dois blocos com visões opostas: um favorável à intensificação do confronto com o Ocidente e o outro que busca abrir um caminho diplomático após os bombardeios.
A facção que defende uma estratégia de contenção é liderada pelo presidente Masoud Pezeshkian. Desde que assumiu o cargo em 2024, em um processo eleitoral sem garantias democráticas, ele tem defendido o retorno às negociações nucleares com Washington.
Em contraste, a ala linha-dura do regime, liderada pelo ex-negociador nuclear Saeed Jalili, questionou abertamente a assinatura do cessar-fogo e qualquer possibilidade de diálogo com os Estados Unidos. Essa facção, com apoio majoritário no Parlamento e de setores da Guarda Revolucionária, acusa o presidente iraniano de agir sem o apoio do líder supremo.
Enquanto isso, o futuro do programa nuclear permanece indefinido. O ministro das Relações Exteriores iraniano, Abbas Araghchi, e o chefe da Organização de Energia Atômica do Irã, Mohammad Eslami, anunciaram que o regime reconstruirá as instalações bombardeadas e continuará o enriquecimento de urânio, ao passo que o Parlamento aprovou um projeto de lei para interromper a cooperação com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas.