Joshua Scacco: Contínua disseminação de desinformação é desafio nas urnas
Diretor do Centro de Democracia Sustentável da Universidade do Sul da Flórida diz que o Brasil tem mais recursos para desqualificar candidatos que os EUA
As eleições de novembro, nos Estados Unidos, a primeira desde os ataques ao Capitólio, em 2021, serão um teste para a democracia americana? Há alguns desafios. Um deles, muito relevante, é a participação dos eleitores. A maior parte das pessoas não quer que os dois candidatos mais prováveis (Joe Biden e Donald Trump) concorram. O resultado é uma maior abstenção. O segundo é a contínua disseminação de desinformação, especialmente em ambientes virtuais. Há, agora, a potencial influência da inteligência artificial em manipular os fatos. Enfim, existem obstáculos que precisam ser enfrentados para uma democracia que se apresenta como deliberativa, pluralista e participativa.
A ameaça parece ser um movimento mundial. Qual é a origem dessa fragilidade nos sistemas democráticos? Uma das raízes para entender de onde vêm essas atitudes antidemocráticas é a crença de que as pessoas comuns não têm mais — ou nunca tiveram, talvez — espaço e voz para tomar decisões. Quando elas não se sentem representadas na política, torna-se mais fácil abraçar líderes que se apressam em dizer: “Eu vou cortar toda essa burocracia e vou tomar decisões unilateralmente!”.
De que forma avalia que o Brasil e os Estados Unidos estão lidando com esses desafios? O Brasil, na verdade, tomou medidas para garantir a realização das eleições futuras. Por exemplo, iniciou investigações a respeito das ações do ex-presidente (Jair Bolsonaro). Nos EUA, não temos os mesmos mecanismos diretos para desqualificar um candidato. Temos recursos indiretos, que estão sendo tentados agora pelo nosso Supremo e pelos estados americanos, mas eles provavelmente falharão porque são imperfeitos e não têm uma repercussão nacional. O Brasil tem e tomou essas medidas.
O que é necessário, neste momento da história, para que a democracia prospere? Não podemos considerar que a democracia está garantida e temos de ter cuidado com suas fragilidades. Isso requer trabalho constante, porque se baseia em nossos representantes, mas também nas nossas vozes como indivíduos e como sociedade. Uma das razões pelas quais criei o centro de pesquisa foi para estudar e entender a democracia como algo do cotidiano, em constante movimento. O que vai acontecer com ela está nas mãos de todos nós, está nas mãos do povo. É noção essencial para entender o que o futuro nos reserva.
Publicado em VEJA de 23 de fevereiro de 2024, edição nº 2881