Em giro de 180 graus, Ucrânia passa lei que preserva órgãos anticorrupção após protestos
Antes, Parlamento ucraniano havia aprovado legislação que tirava a independência e enfraquecia as instituições, gerando indignação no país e na UE

O Parlamento da Ucrânia aprovou nesta quinta-feira, 31, uma lei que restaura da independência de duas importantes agências anticorrupção, conhecidas como Nabu e Sapo, visando apaziguar a maior crise política do país desde a invasão russa. Essencialmente, os legisladores anularam outra lei, ratificada na semana passada, que provocou o maior movimento de protestos contra o governo ucraniano desde que a Rússia invadiu o país, há mais de três anos.
Foram 331 votos a favor e zero contra o projeto de lei, apresentado pelo presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, na semana passada, após pressão de milhares de manifestantes nas ruas de Kiev e outras cidades, bem como de altos funcionários europeus. Foi um giro de 180 graus em relação ao projeto aprovado na semana passada com o apoio do partido Servo do Povo, de Zelensky.
Quando a notícia da votação foi divulgada, aplausos irromperam entre a multidão reunida em um parque próximo ao Parlamento na capital, o mais recente de uma série de manifestações, com a presença predominante de jovens ucranianos. A sessão parlamentar foi televisionada pela primeira vez desde 2022, suspendendo a proibição de filmagem por motivos de segurança. Parlamentares da oposição fizeram discursos inflamados criticando Zelensky e a administração presidencial antes da votação.
O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Andrii Sybiha, reagiu ao resultado da votação nas redes sociais, afirmando que a lei “demonstra uma abordagem baseada em princípios” e que “a Ucrânia está comprometida com reformas e com o combate à corrupção em nosso caminho para a União Europeia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan)”.
“Conseguimos consertar isso”, disse ele.
A comissária para o alargamento da União Europeia, Marta Kos, celebrou reversão das medidas de semana passada, afirmando que “a lei de hoje restaura salvaguardas essenciais”. No entanto, alertou que “os desafios permanecem”.
“A Rada (Parlamento) corrigiu a votação prejudicial da semana passada, que minou a independência do Nabu e da Sapo. A lei de hoje restaura salvaguardas essenciais, mas os desafios permanecem. A União Europeia apoia as demandas dos cidadãos por reformas. A defesa dos valores fundamentais e o combate à corrupção devem continuar sendo a prioridade”, disse ela.
Ataque às agências
Na última terça-feira 22, a Rada aprovou um projeto de lei controverso que efetivamente retirava a independência do Escritório Nacional Anticorrupção, conhecido como Nabu, e da Promotoria Especializada Anticorrupção, chamada de Sapo. A medida concede novos poderes ao procurador-geral da Ucrânia e facilita o controle do governo sobre os casos investigados. Críticos afirmam que a legislação vai permitir interferência política, dificultar o combate à corrupção e prejudicar a ambição ucraniana de um dia ingressar na União Europeia.
Zelensky sancionou o projeto de lei em seguida, rejeitando os apelos para que ele usasse seu veto presidencial. Em seu tradicional discurso noturno em vídeo, divulgado na madrugada desta quarta, o líder ucraniano disse ter conversado com o chefe do Nabu, Semen Kryvonos, e outros procuradores de alto escalão, e garantiu que os órgãos anticorrupção continuariam a funcionar – “mas sem qualquer influência russa. Tudo precisa ser limpo”, enfatizou.
Kos havia afirmado que “o desmantelamento das principais salvaguardas que protegem a independência do Nabu é um sério retrocesso” e afirmou que o Nabu e a Sapo são “essenciais” para o caminho de adesão da Ucrânia ao bloco.