Deputados da Rússia aprovam lei que proíbe transição de gênero
Decisão restringe acesso de pessoas trans a serviços de saúde e impossibilita que cartórios mudem gênero em documentos oficiais
Deputados da Duma, a câmara baixa do Parlamento da Rússia, aprovaram nesta sexta-feira, 14, uma nova legislação que proíbe cirurgias de redesignação sexual no país, ampliando o cerco contra os direitos da população LGBQIAPN+. A decisão restringe o acesso de pessoas trans à saúde e impossibilita que cartórios mudem o gênero em documentos oficiais com base em atestados médicos.
A norma prevê, ainda, que cidadãos que já foram submetidos ao procedimento de mudança de sexo sejam impedidos de se tornarem pais adotivos ou tutores. Casamentos também podem ser anulados se registros civis forem atualizados. Para que seja oficialmente promulgada, a lei passará pela análise do Conselho da Federação, equivalente ao Senado, e seguirá para a assinatura do presidente russo, Vladimir Putin.
A medida, no entanto, não deve enfrentar qualquer obstáculo até a sua assinatura. Em dezembro do ano passado, Putin deu sinal verde para uma legislação que coíbe a “propaganda LGBT”, sob multas de até 400 mil rublos (cerca de 21 mil reais) em caso de descumprimento, com base em uma proposta de 2013. A penalidade é agravada para pessoas jurídicas, chegando em até 5 milhões de rublos (R$ 265 mil), ao passo que estrangeiros podem ficar presos por 15 dias e eventualmente deportados.
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O pacote de emendas assinado por Putin impõe, inclusive, graves consequências a quem promover “relações e/ou preferências sexuais não tradicionais”, incluindo a transição de gênero. Ainda em 2017, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos condenou a proposta a partir da conclusão que seria discriminatória e promoveria a homofobia. Com a promulgação, a norma feriu diretamente as determinações da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, em vigor desde 1953.
Nos últimos meses, o presidente russo tem endurecido sua luta contra a comunidade LGBT+ do país. A deliberação da Duma nesta sexta-feira aumentou a preocupação da primeira política transgênero da Rússia, Yulia Alyoshina. Ela, que largou o cargo assim que a câmara baixa aprovou a lei contrária à “propaganda LGBT”, alertou para os perigos da nova legislação.
“Assim que o projeto de lei se tornar lei, as repercussões serão duras, pois os transgêneros terão negado o direito à assistência médica, garantido constitucionalmente”, disse ao canal de notícias americano CNN. “Este projeto de lei não é apenas discriminatório, é um verdadeiro genocídio de pessoas trans”.
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Na véspera da votação entre os deputados, o Serviço Federal de Segurança da Rússia (FSB) prendeu um ativista transgênero sob acusações de traição. O cidadão russo teria apoiado as Forças Armadas da Ucrânia ao fornecer assistência financeira através do grupo independente de monitoramento de direitos humanos OVD-Info, que foi considerado ilegal por autoridades russas em 2021.
Em entrevista à CNN, a advogada e oficial de programa para a Europa Oriental e Ásia Central no grupo Transgender Europe, Vanya Solovey, afirmou que a “política anti-trans é de fato uma política de terror” e que foi intensificada com a invasão russa ao território ucraniano, em fevereiro do ano passado, como uma demonstração de controle.
“O discurso e a política anti-gênero da Rússia se intensificaram desde o início da guerra em grande escala. Durante meses, Putin e outras autoridades têm visado cada vez mais as pessoas trans em suas declarações”, explicou.