Departamento de Saúde dos EUA define que há apenas dois sexos: ‘masculino’ e ‘feminino’
Diretriz tem como pano de fundo desejo de Trump de afastar mulheres transgênero de esportes femininos e desencorajar afirmação de gênero

O secretário da Saúde dos Estados Unidos, Robert F. Kennedy Jr., anunciou nesta quinta-feira 20 que o governo adotará “um conjunto de medidas baseadas em sexo” para oferecer termos precisos, como “masculino”, “feminino”, “mulher” e “homem” ao público e a agências federais. A declaração determina que homem é “uma pessoa do sexo caracterizado por um sistema reprodutivo com a função biológica de produzir esperma” e mulher é “uma pessoa do sexo caracterizado por um sistema reprodutivo com a função biológica de produzir óvulos”.
“Essa administração está trazendo de volta o senso comum e restaurando a verdade biológica ao governo federal”, disse Kennedy em comunicado. “A política da administração anterior de tentar projetar a ideologia de gênero em todos os aspectos da vida pública acabou.”
A diretriz tem como pano de fundo o desejo do presidente dos EUA, Donald Trump, de afastar mulheres transgênero de esportes femininos, desencorajar tratamentos de reafirmação de gênero e reconhecer apenas o sexo masculino e feminino, na contramão do que considera como política “woke” (termo derivado do verbo to wake, acordar em inglês, relacionado ao progressismo). Após a posse, em 20 de janeiro, o republicano decretou que o governo deveria oferecer “orientações claras” sobre como o público deve interpretar o que é sexo.
Além disso, o novo portal do Escritório Federal de Saúde da Mulher, vinculado ao Departamento de Saúde dos EUA, lançou um extenso portfólio sobre saúde reprodutiva e comportamental. Em uma das páginas, intitulada “Protegendo Mulheres e Crianças”, a ex-nadadora conservadora Riley Gaines defende, em um vídeo, que teve desvantagens competitivas ao disputar contra uma mulher transgênero. O site também alega que aceitar a existência de apenas dois sexos é vital para a ciência.
“Reconhecer a natureza imutável e biológica do sexo é essencial para garantir a proteção da saúde, segurança, espaços privados, esportes e oportunidades das mulheres. Restaurar a verdade biológica para o governo federal é essencial para a investigação científica, segurança pública, moral e confiança no próprio governo”, acrescenta o texto.
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O que dizem os especialistas
A Academia Americana de Pediatria, por sua vez, reconhece que muitas pessoas não se identificam com as noções de “masculino” e “feminino”. Há, ainda, pessoas intersexuais, que têm anatomia sexual ou cromossomos que não se encaixam nas categorias tradicionais. Outras não se identificam com nenhum dos gêneros ou com um que não corresponde ao seu sexo biológico, como é o caso de jovens e crianças transgênero.
Há cerca de 1,6 milhão de jovens e adultos nos Estados Unidos que se identificam como transgênero, segundo o Williams Institute da UCLA School of Law. As mudanças do governo Trump, portanto, colocam em risco essa parcela da população, além de diferir, e muito, das políticas anteriores. O ex-presidente Joe Biden, por exemplo, fez da proteção de pessoas trans uma peça-chave da sua administração.
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Secretário controverso
Ativista antivacina e defensor de práticas pouco ortodoxas da medicina, RFK é um nome polêmico para liderar o Departamento de Saúde americano. Apesar das opiniões controversas, ele recebeu o aval do Legislativo dos EUA, com apoio de todos os senadores republicanos, exceto Mitch McConnell, do Kentucky, na semana passada.
Na contramão, os democratas repudiaram a nomeação devido ao seu histórico polêmico e a sua falta de conhecimento técnico. Trata-se de uma mudança de postura, uma vez que o Partido Democrata é historicamente alinhado à família do ex-presidente John F. Kennedy, assassinado em 1963.
Em declarações anteriores, Kennedy afirmou que começaria “imediatamente” a estudar a segurança e eficácia das vacinas, mas prometeu não “tirar as vacinas de ninguém”. Ele também se comprometeu a recomendar formalmente que estados e municípios removessem o flúor da água pública e anunciou recomendações de Trump para o Departamento de Saúde.
“O presidente Trump me deu três instruções”, disse ele à emissora americana NPR News. “Ele quer a corrupção e os conflitos fora das agências reguladoras. Ele quer retornar as agências ao padrão ouro, empiricamente baseado, com base em evidências, ciência e medicina pelas quais elas já foram famosas. E ele quer acabar com a epidemia de doenças crônicas com impactos mensuráveis, em uma diminuição de doenças crônicas dentro de dois anos.”