Como a imprensa internacional repercutiu a condenação de Bolsonaro
Jornais falam de 'passo importante contra a impunidade' em julgamento histórico, enquanto destacam polarização política e brechas para apelação

Com o voto da ministra Cármen Lúcia, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta-feira, 11, para condenar Jair Bolsonaro, bem como os outros sete réus, pelos crimes imputados pela Procuradoria-Geral da República no caso da trama golpista. O ministro Cristiano Zanin é o próximo a votar; Luiz Fux divergiu ao defender a absolvição do ex-presidente.
A imprensa mundo afora acompanha com atenção o julgamento que tomou proporções internacionais após ser colocada sob os holofotes pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Ele impôs tarifas de 50% a produtos brasileiros, a maior alíquota do “tarifaço”, empatada com a Índia, e seu governo acionou a Lei Magnitsky para aplicar sanções econômicas a Alexandre de Moraes devido ao que descreveu como uma “caça às bruxas” contra Bolsonaro e “ataques à liberdade de expressão”.
O jornal americano The New York Times afirmou que, embora o veredicto não seja definitivo até que todos os cinco ministros tenham votado e o STF promulgue o resultado, o passo em direção à condenação não só de Bolsonaro, mas também de seus poderosos aliados da caserna, é “visto por muitos como uma vitória da democracia”, aludindo à ditadura que governou o Brasil com a mão de ferro dos militares de 1964 a 1985.
Bolsonaro pode pegar mais de 40 anos de prisão. Sua sentença deve ser emitida na sexta-feira.
O NYT destacou que o julgamento desencadeou uma crise diplomática com Washington, em referência às tarifas e à Magnitsky, e agora o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) “se prepara para a possibilidade de medidas mais punitivas ainda dos Estados Unidos contra outros membros do Supremo Tribunal Federal e instituições financeiras do país”.
O espanhol El País foi contundente ao afirmar que, com a condenação iminente de Bolsonaro, o Brasil “dá um passo importante contra a impunidade” no “julgamento mais significativo politicamente” do país nos últimos anos.
“Pela primeira vez na história (brasileira), um tribunal condenou um ex-presidente e oficiais militares de alta patente por tentativa de golpe de Estado”, afirmou a reportagem, destacando a implicação de vários generais na trama e a resiliência do julgamento apesar da forte pressão de Donald Trump.
A publicação destacou que o voto decisivo foi de Carmen Lúcia, que acompanhou Moraes, o relator do processo, ao considerar comprovado que “um grupo composto por figuras-chave do governo, liderado por Jair Bolsonaro, executou um plano progressista de ataque às instituições democráticas com o objetivo de prejudicar a alternância de poder e minar os demais poderes, especialmente o Judiciário”. O El País chamou Moraes de “ministro poderoso e controverso” ao lembrar que a trama golpista planejou seu assassinato.
O jornal espanhol destacou que o STF reforçou a segurança a ponto de policiais armados cercarem o tribunal durante as deliberações, e afirmou que a corte é uma das “mais transparentes do mundo”. “A transmissão ao vivo aumenta a expectativa e o suspense do espetáculo, como os brasileiros gostam”, disse a reportagem.
No Reino Unido, o The Guardian atenuou o que descreveu como “euforia dos progressistas com a queda de um presidente acusado de destruição desenfreada do meio ambiente, centenas de milhares de mortes pela covid e ataques a minorias”.
“Seu movimento político permanece muito vivo”, escreveu o jornal britânico, afirmando que o voto dissidente de Fux sobre a jurisprudência (ou falta dela) da Primeira Turma do STF sobre o caso possa abrir caminho para uma apelação do veredicto e até mesmo para a anulação do julgamento no futuro. Quando perguntada pelo Guardian sobre o futuro do bolsonarismo, a cientista política Camila Rocha, do Cebrap, declarou: “Eu não declararia a morte política de Jair Bolsonaro”.
De acordo com a reportagem, aliados devem continuar tentando tirá-lo da cadeia, com estratégias como eleger uma maioria esmagadora de senadores de direita nas eleições de 2026, que poderiam solicitar o impeachment de ministros do STF; pedir que Donald Trump aumente a pressão econômica sobre o Brasil; e tentar garantir que um candidato pró-Bolsonaro derrote Lula no ano que vem — para emitir um indulto presidencial ao ex-presidente.
O Clarín, da Argentina, afirmou que “a polarizada sociedade brasileira está dividida entre aqueles que consideram o julgamento um exercício de defesa da democracia e aqueles que citam motivações partidárias”. Bolsonaro, ex-capitão do Exército em prisão domiciliar desde agosto, não participa de audiências judiciais em Brasília, alegando problemas de saúde, e o jornal argentino destacou que ele deve passar por um pequeno procedimento médico em um hospital da capital no domingo, quando já terá ouvido uma sentença.