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Brasil entra em lista de países com governo autocrático

Relatório Mundial de Direitos Humanos 2019 aponta Jair Bolsonaro como exemplo de líder populista eleito, mas sem compromisso com a democracia

Por Denise Chrispim Marin Atualizado em 17 jan 2019, 08h41 - Publicado em 17 jan 2019, 07h30

O Brasil passou a figurar na lista do Observatório de Direitos Humanos (HRW) de países governados por líderes autocráticos com a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República, em outubro passado. A nova qualificação do país está mencionada no Relatório Mundial de Direitos Humanos 2019, que o HRW divulga nesta quinta-feira, 17.

Citado ao lado de nomes como Nicolás Maduro, da Venezuela, e Recep Erdogan, da Turquia, o presidente Bolsonaro é descrito no documento como “um homem que, com grande risco à segurança pública, encoraja abertamente o uso da força letal por policiais e membros da Forças Armadas em um país já devastado por uma alta taxa de homicídios causadas por forças policiais e mais de 60.000 homicídios por ano”.

Concluído em dezembro passado, o relatório de 2019 da HRW não contempla a mais recente promessa ao eleitorado cumprida por Bolsonaro  a facilitação do acesso de civis a armas de fogo. Por meio de decreto, editado no Diário Oficial da União de terça-feira, o presidente simplificou o processo para obter posse de armas no país.

Mas, em seu capítulo sobre o Brasil, o texto destaca o recorde de 64.000 homicídios registrados em 2017, em um país onde a violência doméstica é “generalizada”, o controle frágil das prisões facilita o recrutamento por facções criminosas e execuções extrajudiciais cometidas pela polícia alimentam a criminalidade elevada. A execução da vereadora carioca Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, por assassinos profissionais em março de 2018, é mencionada com destaque.

Ao abordar a liberdade de expressão no país, o documento assinala o fato de mais de 140 jornalistas terem sofrido intimidações, ameaças e até agressões físicas durante a cobertura das eleições de 2018. A declaração de Bolsonaro, depois de eleito, de que cortaria a verba publicitária para veículos de imprensa que se comportassem de forma “indigna” também foi mencionado como iniciativa que fere o direito à livre imprensa.

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Como ponto positivo, o HRW menciona a decisão unânime do Supremo Tribunal Federal de derrubar as restrições à liberdade de expressão, particularmente em relação a manifestações em universidades durante o período eleitoral.

“A decisão ocorreu em um cenário em que Bolsonaro e seus aliados buscavam aprovar um projeto de lei que proibiria os professores de ‘promover’ suas próprias opiniões nas salas de aula ou de usar os termos ‘gênero’ ou ‘orientação sexual'”, assinalou o documento.

Período sombrio

O relatório de 2019 dá atenção especial ao “período sombrio para os direitos humanos”, causado em principalmente pela ascensão ao poder, pela via democrática, de “líderes populistas que espalham o ódio e a intolerância” e que tendem a minar as instituições e o Estado de Direito.

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O Brasil se associa, nesse quesito, à Turquia de Recep Erdogan, ao Egito de Abdel Fattah Sisi, à Filipinas de Rodrigo Duterte, à Hungria de Viktor Orban, à Polônia de Jaroslaw Kaczynski, à Rússia de Vladimir Putin, à Índia de Narendra Modi, aos Estados Unidos de Donald Trump e também à Venezuela de Nicolás Maduro.

“Diferentemente dos tradicionais ditadores, os supostos autocratas nos dias de hoje tipicamente emergem de ambientes democráticos”, afirma o diretor-executivo do HRW, Kenneth Roth, que mais adiante alerta para a vulnerabilidade até mesmo de democracias consolidadas.

“A maioria persegue uma estratégia de duas etapas para minar a democracia: primeiro, demoniza minorias vulneráveis, utilizando-as como bodes expiatórios para conquistar o apoio popular; e, então, enfraquece os pesos e contrapesos do poder público, necessários para preservar os direitos humanos e o Estado de Direito, como o Judiciário independente, uma imprensa livre e vigorosos grupos da sociedade civil”, completa.

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Roth sublinha que esses líderes raramente resolvem os problemas que apontam em suas campanhas eleitorais, mas criam um legado de abusos e evitam a prestação de contas de seus ações, o que os torna propensos à corrupção, repressão e má administração.

A devastação econômica da Venezuela, país rico em petróleo, é um dos exemplos citados no documento. A onda de execuções extrajudiciais nas Filipinas, sob o argumento da “guerra contra as drogas”, é outro. E há ainda a prisão em massa de mais de 1 milhão de muçulmanos de origem turca na China, principalmente de uigures, a perseguição aos muçulmanos rohingyas por Miammar e o bombardeio ao Iêmen pela coalizão comandada pela Arábia Saudita.

Nos Estados Unidos, a política de “tolerância zero” com a imigração adotada pelo governo de Donald Trump é citada como outro exemplo de medida punitiva a minorias vulneráveis.

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O documento assinala igualmente o crescimento da resistência aos regimes autocráticos, com protestos de organizações civis gerando medidas concretas. Na Malásia, os eleitores destituíram o primeiro-ministro, Najib Razak, acusado de corrupção, assim como também fez a população das Maldivas com seu presidente autocrático, Yameen Gayoom. Na Armênia, o primeiro-ministro Serzh Sargsyan renunciou diante da pressão popular contra seu governo corrupto.

Nas eleições de meio de mandato, em novembro passado, os eleitores americanos escolheram uma Câmara dos Deputados com maioria da oposição democrata, o que tornará mais difícil a aprovação de projetos de Trump em seu dois últimos anos de mandato.

O relatório menciona também a iniciativa da China de financiar de obras de infraestrutura em países governados por líderes autocráticos, dentro de seu projeto de One Belt One Road, como fomentadora de má administração e corrupção.

“Essas infusões de dinheiro sem controle tornaram mais fácil para autoridades corruptas encherem suas contas bancárias, sobrecarregando seu povo com enormes dívidas a serviço de projetos de infraestrutura que, em vários casos, beneficiam mais a China do que o povo da nação endividada”, afirma Roth no documento. “Falar de uma ‘armadilha da dívida’ chinesa tornou-se comum.”

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