“Precisamos ser uma nação esportiva”
Marco La Porta, presidente do COB, faz um balanço dos primeiros 100 dias de sua gestão – e anuncia um novo programa com apoio de empresas privadas

Entre 2018 e março de 2024, o ex-triatleta Marco La Porta foi vice-presidente do Comitê Olímpico do Brasil, o COB, durante a gestão de Paulo Wanderley. Nos Jogos de 2012 , em Londres, e 2016, no Rio de Janeiro, ele chefiou a equipe brasileira de triatlo nos torneios. O zelo com a organização e administração esportiva o fizeram crescer dentro da burocracia do comitê nacional. Contudo, divergências de gestão provocaram o rompimento com a administração de Wanderley. Não demorou para que decidisse lançar sua candidatura para um novo ciclo, de mãos dadas com Yane Marques, pentatleta medalhista de bronze em 2012. Em outubro do ano passado, a dupla oposicionista recebeu 30 votos, antes 25 da chapa situacionista. Ao completar 100 dias de mandato, La Porta falou a VEJA.
Qual é o balanço possível dos primeiros 100 dias da gestão do senhor e da Yane Marques à frente do COB? Demoramos um pouco para entender os reais problemas, porque de fato não houve uma transição real da gestão anterior para a nossa. Mas, depois de conversarmos com cada área, a partir de março a nova estrutura proposta caminhou como imaginávamos. Viajamos muito, com toda a equipe – para São Paulo, Brasília, para estados do Nordeste. A ideia, depois de entendermos as dificuldades, era a de montarmos uma distribuição adequada do orçamento previsto por estatuto.
E como ele será distribuído? O COB, para 2025, tem um montante aprovado por assembleia de 594 milhões de reais, dos quais 81% destinados a ações esportivas, de apoio a atletas e competições. O que fizemos – e incrementaremos ainda mais, nos próximos meses e anos – é aumentar o bolo financeiro com a iniciativa privada. É passo fundamental, decisivo para podermos ajudar quem realmente precisa.
E como saber que federações pedem verbas, sob o risco de terem graves problemas ao longo do percurso? Discernir quem precisa de socorro mais imediato talvez seja um dos pontos positivos e louváveis do que já desenhamos, até agora. Criamos um programa efetivo de suporte, em trabalho conjunto das diretorias e do conselho de administração.
Onde havia dificuldades? Algumas modalidades tinham contas negativadas, e por isso não conseguiam receber recursos, como é o caso do basquete, da Confederação de Esportes Aquáticos e do handebol. Agora conseguimos caminho mais tranquilo, e as atividades andam bem. Cuidamos também de aproximar o dinheiro privado de outras modalidades que não têm verba de empresas, e nessa lista posso citar o badminton, o tiro com arco, o triatlo e o pentatlo moderno. Para evitar injustiças, a ideia é que os repasses tenham o mesmo valor. Seguiremos nesse caminho, de zelo muito próximo, buscando sempre novos meios de atrair investimento.
O que, por exemplo? Lançamos, a partir de hoje, 25 de abril, um novo plano, o Programa Olímpico de Patrocínio, de modo a atrair investidores. Ele é engenhoso: toda empresa que se aproximar do COB, ao aderir à iniciativa, passa a ser patrocinadora de todo o sistema olímpico brasileiro – ou seja, terá a possibilidade de ver sua marca aparecer em diversas competições, em diversos estados, no Brasil, mas também no exterior. Evidentemente, nem todas as marcas funcionam com todas as modalidades, por haver algumas sobreposições de patrocínio. O voleibol, por exemplo, apoiado pelo Banco do Brasil, não pode ter a logomarca da Caixa Econômica Federal. Mas teremos todo o cuidado para construir os pacotes.
Haverá interesse das empresas de adesão ao Programa Olímpico de Patricinio? Imagino que sim. O esporte é excelente plataforma, saudável e positiva. O Brasil é uma potência esportiva, ainda que precise crescer muito, e certamente crescerá. Algumas das grandes estrelas do esporte brasileiro são olímpicos. Veja o fenomenal sucesso de Rebeca Andrade e, recentemente, do Hugo Calderano.
Ainda assim, nomes como os deles, soam como exceção, apesar do desempenho muito bom do Brasil na Olimpíada de Tóquio e ligeiramente pior em Paris. O que fazer para mudar o patamar? Precisamos ser uma “nação esportiva”, conceito em torno do qual pretendo atrelar os passos do COB. É fundamental, para isso, deixar apenas o eixo Rio-São Paulo e levar competições a outras regiões. Nelas descobriremos futuros medalhistas. O alto rendimento é fundamental, sem dúvida – e é ele quem acaba nos levando ao ouro, prata e bronze. Mas, tal qual na educação de crianças, deve-se ir à base, na infância. É crucial identificar atletas ainda na formação e não apenas quando estão no pico. Claro, olhamos atentamente aos atletas do chamado Top 5, de sucesso em Paris, e que podem repetir o desempenho em Los Angeles. Eles precisam de atenção, por serem ótimos, mas também para evitar lesões, para chegarem ao novo auge no momento certo. Mas é compulsório detectar esperanças. Se quisermos olhar para Brisbane, em 2032 e para depois, a hora é agora. Os Jogos Pan-Americanos Juvenis, no mês de agosto, em Assunção, são uma vitrine de primeiríssima qualidade – ali enxergaremos os heróis de amanhã.
Que imagem o senhor pretende passar do COB? Os resultados em olimpíadas e outros torneios são fundamentais, e sei que seremos cobrados por eles. Mas a jornada que propomos, com empenho, boas ideias e muito trabalho, é como uma viagem de avião. Importa, no início, conhecer a decolagem e saber onde vamos aterrissar, para então chegarmos à velocidade de cruzeiro.
E onde seria a aterrissagem? Dentro de quatro anos, quando encerrarmos o mandato. Sei já estarmos fazendo diferente. Nos aproximamos das 38 modalidades. Algumas já têm mais oxigênio, outras ainda exigem melhor reestruturação, mas a direção é boa. O trabalho do COB é minucioso, tanto no controle financeiro e administrativo, quanto no zelo com os atletas. Haverá obstáculos, claro que sim. Aqui e ali podemos errar, mas trabalhamos agora olhando para o futuro.