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O voo heroico da judoca brasileira

Antes do ouro da paulista Beatriz Souza, no Champs-de-Mars, vitória igual só mesmo a de Santos Dumont, há mais de 100 anos

Por Fábio Altman Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 2 ago 2024, 23h23 - Publicado em 2 ago 2024, 12h27

A história da medalha de ouro de Beatriz Souza no judô, na categoria acima dos 78 quilos, a primeira do Brasil nos Jogos Olímpicos de Paris, precisa ser contada pelo ponto de vista da luta semifinal. A adversária era a francesa Romane Dicko, querida pelos franceses, uma judoca que fez de seu corpo um manifesto e que buscou o esporte para fugir do estúpido preconceito de que era vítima na infância e adolescência. A Arena do Champs-de-Mars fervia como em um estádio de futebol, invadida por bandeiras tricolores e allez les bleus.  O frenesi antecipava o combate que viria depois, de Teddy Riner, lenda viva.

Dicko, líder do ranking mundial, aparentemente imbatível, sucumbiu à luta inteligente de Beatriz, que desembarcara em Paris como surpresa, menos para ela própria, é claro, e para os dirigentes da Confederação Brasileira de Judô, que já intuíam o bom resultado – desde que não cruzasse com Dicko. Mas cruzou, e daí?  Um ippon já na fase do golden score a fez vitoriosa. O presidente da França, Emmanuel Macron, no ginásio, parecia incrédulo. Assim nascem as heroínas olímpicas. Depois do aceno clássico do juiz, a brasileira olhou um tantinho para cima. Não seria exagero imaginá-la levando os olhos para uma outra fenomenal conquista brasileira naquela porção de céu parisiense. Em 1903, ali mesmo, no Champs-de-Mars, atrás da Torre Eiffel, Santos Dumont subiu um dirigível, proeza celebrada por espanto pelos franceses, na inauguração de um novo mundo. Depois de Santos Dumont, no Champs-de-Mars, só mesmo Beatriz Souza, paulista de Itariri criada na cidade litorânea de Peruíbe, em São Paulo, e que desde criança esteve em tatames. O pai, Poscedônio José de Souza, de apelido “Pelé”, teve longa carreira de quimono, embora nunca chegasse a uma Olimpíada. A filha, hoje com 26 anos, treinada por Maria Suelen Altheman no Clube Pinheiros e por Sarah Menezes, ouro em 2012, na seleção,  chegou lá.  Não como uma deusa do mar, ao feitio do pai, mas como uma rainha do Sena. Depois de passar na estreia por Izayana Marenco, da Nicarágua, a coreana Kim Hayun e Romane Dicko, fez a final contra a israelense Raz Hershko, com quem tinha feito quatro lutas, com quatro vitórias.

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Imagem histórica da Torre Eiffel (Arquivo/Arquivo)

O sorriso pueril e o choro emocionado da campeã olímpica (“é pra vó”, como disse aos pais, pelo celular) são o grande momento do Brasil em Paris, de mãos dadas com a medalha de prata de Rebeca Andrade. O judô é a modalidade olímpica brasileira mais premiada, com 5 ouros, incluindo o de Beatriz, 4 pratas e 18 bronzes. Ela fez valer a tradição. Amanhã, os jornais parisienses estamparão em manchete a derrota de Dicko, como um dia, no início do século XX, celebraram um dos voos inaugurais de Santos Dumont. Bia voou, como sempre.

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