Imagem do dia #5 da Copa: O que é o futebol, se não geometria?
Voleios como o de Richarlison, registrados pelas lentes de grandes fotógrafos, ganham longa vida
LUSAIL – O poeta Carlos Drummond de Andrade, que sabia das coisas da vida, mas não era nenhum especialista em futebol, embora gostasse do que corria em torno da bola, logo intuiu que era tudo questão de geometria. Em 1970, em Meu Coração no México – e não cabe aqui nenhum comparação com as feras do Saldanha que virariam o escrete de Zagallo – ele anotou: “Então crescem os homens. Cada um é toda a luta, sério. E é todo arte. Uma geometria astuciosa aérea, musical, de corpos sábios a se entenderem, membros polifônicos de um corpo só, belo e suado”. Experimente ler esse trecho do poema tendo à frente dos olhos a excepcional foto de Alexandre Battibugli, que acompanha a cobertura de VEJA e PLACAR na Copa do Catar. É pura geometria astuciosa. Coisa de quem entende. Falo aqui de Battibugli, mas também de Richarlison e seu já eterno voleio: os olhos fixos na bola, a perna esquerda e a direita a compor um perfeito “L”. Tudo é equilíbrio a antecipar a rede estufada, em um clássico golaço que fez o estádio Lusail soltar um prolongado óóóó…
Faz lembrar uma outra foto, a do voleio de Rivaldo nas oitavas-de-final contra a Bélgica, na Copa de 2002, em imagem flagrada por Ricardo Corrêa – ele também com VEJA e PLACAR no Mundial do deserto. É um registro clássico, que girou o mundo, o 10 às costas. O ensaísta e compositor José Miguel Wisnick – ele sim um fenomenal teórico do futebol – escreveu em 2002, a respeito do malabarismo inigualável de Rivaldo, o pernambucano tímido, ao sacar os chutes espetaculares, corpo voando: “Peão barroco em pleno movimento”. Foi assim também com Richarlison.
Há ainda muita estrada para o Brasil no Catar, a vitória contra a Sérvia foi boa, fácil até, mas longe de empolgar Richarlison, contudo, ele sim faz crescer as esperanças, com o apoio das câmeras de televisão e das lentes dos fotógrafos. Viva a geometria astuciosa aérea.